PENA DE MORTE

O que significa Pena de Morte?

A grosso modo significa dar a alguém o direito de matar em seu nome. Bem dito assim é simples, mas quem é esse alguém quando essa pergunta é feita? Vejamos que não se trata de alguém qualquer, trata-se de um alguém a cujo delegamos, autorizamos que se mate em nosso nome. E esse alguém atende pelo nome genérico de Estado.

Pois bem, sendo o Estado um ente, um alguém genérico, sem rosto e identidade própria, definimos o Estado como aquele ente, maior que nós, que sintetiza nossas vontades. Mas como isso acontece?

Em linhas gerais o surgimento do Estado, enquanto um ser, um ente, ao qual delegamos nossas vontades, surge com o Contrato Social de Rosseau. Por esse contrato social, nós, cedemos parcela de nossa Liberdade, inclusive de matar para nos protegermos, ao Estado. A ele delegamos o direito, em nosso nome, de fazer as leis e a justiça. Cedemos parte de nossa liberdade tendo como garantia que o Estado, em nosso nome, fará aquilo que se fosse feito por cada um nos levaria à barbárie. Imagine-se cada de um nós agindo segundo nossa vontade e de acordo com o que entendemos ser justo ou injusto. Conseguiríamos viver em sociedade? Ou, ainda, como poderíamos falar em roubo, propriedade privada, direitos e deveres, entre outros? Então, é com base nesse Contrato Social que conseguimos viver como civilizados e não como bárbaros.

Mas você poderá perguntar: o que isso tem a ver com a Pena de Morte?

Primeiramente, já está mais que provado que a instituição e aplicação da pena de morte não torna a sociedade mais segura, e muito menos, mais pacifica. Se isso fosse tão certo, dos 50 estados que formam os Estados Unidos, em 36 tem pena de morte e esses 36 não são, de longe, os mais harmoniosos.

Segundo, sendo aplicada, quem garante que não se está matando um inocente, pois, sabemos erros judiciais podem ser revistos, mas quando se trata de pena de morte... A esse respeito, Cesare Becharia, um jurista italiano, do século XVIII, em seu livro "Dos Delitos e das Penas", já se opunha à tortura, ao julgamento secreto, à pena de morte. É clássica sua máxima " Soberania e o Poder são porções de liberdade que os indivíduos concedem a sociedade, que está representada pelo contrato social – na forma de Estado. É inadmissível a opressão dos indivíduos, pois se trata de algo paradoxal e incoerente os seres humanos abrirem mão de sua liberdade para por em risco sua própria existência." Noutras palavras: o pensador nos alerta para o risco de ao cedermos parte nossa liberdade para que o Estado, em nosso nome, faça justiça, corremos o risco de nos tornarmos vítimas desse mesmo Estado. E continua dizendo que " a pena de morte (nada mais é) (grifo nosso) como uma mascará da tirania, que obriga o sacrifício em nome do despotismo insaciável, apenas os tiranos soberbos que se interessam por seu próprio prazer aceitam a pena de morte".

Mas, o assunto Pena de Morte alcança relevo quando vimos notícias de violência. Não é raro esse tema ressurgir quando ocorre alguma morte brutal de uma criança, ou quando se captura o criminoso. Não podemos esquecer, ainda, que esses criminosos são sempre pobres, moradores da periferia, sem formação e portadores de algum vício. Ora, dirão os mais aguerridos defensores da pena de morte, não vai dizer que são coitados? Não!, claro que não. São desvalidos, abandonados pelo Estado que não lhes garante educação, trabalho, saúde, moradia. São desprovidos do mínimo necessário à sobrevivência.

E, ainda, não é paradoxal, contraditório, ser a tentativa de suicídio (matar-se a si mesmo) crime, ou seja, o indivíduo não pode atentar contra a própria, mas pode delegar esse direito ( o de matar) a um Estado? Quer dizer: matar-se é tão abominável (é bárbaro), mas, autorizar que o Estado o faça é Civilizado, é racional. Mas, a formação do Estado não se baseia num Contrato entre indivíduo e sociedade? Isto é, o indivíduo, para viver em sociedade, não cede parte de sua liberdade à sociedade, caracterizada pelo Estado, racionalmente numa clara demonstração de não querer viver sob à barbárie, não foi esse o legado do Iluminismo ( a primazia da razão sobre o tempo das trevas)? Delegar ao Estado que se mate em nosso nome, que faça justiça com as próprias mãos (as nossas mãos ocultas, na medida, que o Estado é o conjunto dos indivíduos numa sociedade) não é um retorno à barbárie?

Por fim, aos que defendem a pena de morte, digo que o que faz uma sociedade segura não é a pena de morte, ou cortar o mal pela raiz, como dizem, mas aplicar as leis, leis que não extirpem a vida, mas que façam com que o criminoso sinta medo do castigo, não físico, mas moral. E nesse rol de castigos a privação da liberdade, bem maior que um indivíduo pode ter, é o mais eficaz, pois, priva-lo desse tesouro, apartá-lo do convívio social, é o castigo mais duro que pode fazê-lo se redimir, tira-lhe a vida, como tantos acreditam, não promove justiça, mas uma torpeza assim como o crime que ele cometeu.