LEVE GATO POR LEBRE OU ATÉ QUANDO O PODER PÚBLICO IGNORARÁ OS ENGODOS PERPETRADOS PELAS ARAPUCAS DENOMINADAS CONSTRUTORAS?
A Constituição Federal previu, em 1988, a criação de mecanismos de defesa do consumidor:
Art. 5º, XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor.
A despeito da ênfase dada à proteção do consumidor pelo legislador constituinte, o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) foi aprovado, apenas, em 11 de setembro de 1990, entrando em vigor cento e oitenta dias contados de sua publicação.
De lá para cá passaram-se vinte e dois anos. Não é pouco: são vinte e dois anos! De nota há a se destacar que as relações com instituições financeiras passaram a ser encaradas como consumeristas. É, hoje, ponto pacífico, depois de longa luta.
Entretanto, pouco ou nada se fez acerca dos contratos feitos por particulares com empreiteiras, no tocante às relações de consumo. Estas, em poderoso lobby, têm levado a melhor, até agora, porque patrocinam e se imiscuem nos negócios políticos.
É uma vergonha que se compre um imóvel na planta, tendo-se à disposição, apenas, uma maquete - uma imagem tridimensional - do projeto, via de regra, inacabado, e um apartamento decorado.
A maquete não explicita
o espaço real que cada torre ocupará. Elas não são identificadas por nomes. É apresentada uma única torre em um terreno onde serão construídas oito. Não há nome, indicação dos pontos cardeais ou mais informações necessárias ao comprador. Comparando, seria o mesmo que comprar batom sem ter a cartela de cores em mãos.
No apartamento decorado tudo cabe. Bons arquitetos são capazes de planejar um espaço para elefantes onde caberiam, apenas, cabras.
Existe toda uma estratégia montada para engodar o futuro comprador. O que procurar, encontrará. É um circo. Bem montado, muito bonito, mas não passa disso: um circo. O palhaço? Não é preciso muito cérebro para que se conclua que é o consumidor, claro! Ao fim e ao cabo, é ele o ludibriado.
Os vendedores passam-lhe pela goela qualquer coisa, no intuito de levá-lo a um erro substancial: Pretende o apartamento dos fundos? Temos um, ótimo! Ah! Procura uma unidade com vista para a piscina! Esta é perfeita! Vista para o nascente? O vinte e sete, garanto! Acabamento? Trabalhamos apenas com material de primeira qualidade! Você deseja privacidade? Com o vinte e três você não precisará dividir seu mundo com o vizinho, tenha a certeza! Esta beleza lhe custará, apenas, R$ xxxx! Nós garantimos a entrega dos apartamentos no prazo contratado! Sempre haverá o apartamento idealizado à venda.
Tudo é mentira. Ilusão. Vende-se a quimera do imóvel próprio. De todas as afirmações que definirão a compra, a única a constar do contrato é o prazo. Não há alusão a valores. O corretor vende um apartamento e a construtora entrega outro (conheço diversas situações reais de quem passou pela amarga experiência).
Do maravilhoso apartamento com vista para a piscina se pode avistar, apenas, a área do estacionamento; a pretendida vista para os fundos, tranquila, não existe: é ela para o playground; o proprietário do apartamento com total privacidade, com o horizonte por testemunha e que jamais compartilharia sua intimidade, terá que se compor ao sair à varanda, pois existe um prédio poucos metros à frente, com sacada fronteiriça. No churrasco do domingo será inevitável o "E aí, vizinho, aceita uma linguiça?"
Como provar o engodo, ao final? Quem compra apartamentos levando testemunhas? Elas lembrar-se-iam dos detalhes, anos depois?
Se a venda por catálogos ou pela internet está protegida pelo Código de Defesa do Consumidor, não tanto está a venda por maquete, que entregará o bem muitos meses (ou anos) depois do avençado, sem qualquer garantia de que o dito será cumprido.
Em um processo judicial, qualquer indício deveria ser considerado em favor do consumidor, que, afinal, está - ou deveria estar - protegido pelo diploma consumerista e a favor do qual se deve inverter o ônus da prova. Quanto mais se fale havendo provas materiais de ter sido ele logrado. Não é o que sempre ocorre, enfim. Tudo pode ser resumido em uma única palavra: decepção.
É hora de se estabelecerem normas mais rígidas para serem seguidas por tais arapucas, que se enriquecem às custas do ludíbrio daqueles que pretendem comprar um imóvel próprio. - se não o primeiro de suas vidas, descartam-se do imóvel em que moravam, no intento de viver naquele idealizado. Mas este não existe. Ao invés da realização de um sonho, entrega-se um pesadelo. Um pesadelo que persiste: Jamais existirá a vista para a piscina! Nunca terá privacidade! Em tempo algum terá o sossego pretendido! Em nenhum momento suas paredes serão banhadas pelos raios do nascente!
Não se compra apartamentos como se compra sapatos! Se estes apertam os pés, são deitados fora. Com aqueles, isso não é possível. É necessário o convívio com e dentro deles. Depois de tanto sacrifício, de tanto sonhar, é um martírio saber-se enganado e ser obrigado a pagar (por dezenas de anos) por algo que não se quis.
Quem quer marmelada! Há muita, no Brasil! Até quando?
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Maria da Glória Perez Delgado Sanches
Membro Correspondente da ACLAC – Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.