NÃO TEM CHORO NEM VELA
NÃO TEM CHORO NEM VELA
Assim será quando do meu falecimento, pois o corpo vai pra Santa Casa, Escola de Medicina, e os estudantes vão ter, através dele, as aulas pratica que a teoria ensinou anos nas salas de aulas.
A principio poderá parecer estranho, que avisem que morri, e não digam a hora do velório nem qual cemitério, nem o jazigo, do meu enterro. Ainda mais que temos dois jazigos na Consolação. E por falar em consolação aguardem então as cerimônias de pompas fúnebres que serão anunciadas até o sétimo dia, quer seja pela Maçonaria, Igreja, Sinagoga ou por todas elas, e porque não?
Essa história de velar corpo em pleno século XXI, nesta megalópole, onde cada um mora em torno de 30 km., e tem que suportar um transito maluco, cheio de empecilhos na hora de estacionar, quer seja o preço ou a hora que vai fechar, o tempo da Zona Azul, o achaque dos “flanelinhas”, e porque não dizer dos “marronzinhos” que alimenta a industria das multas!
Ademais, o que vão falar de mim não será nada daquilo que já ouvi dizer. E as piadas não terão graça nenhuma, pois eu já as contei personalizando-as como fato verídico, muitas vezes como se houvessem se passado com a Myriam, coitada!
Fora isso, haverá aquele inconveniente das flores, que não caberá no transporte e vai apodrecer mais cedo do que eu. E, diga-se de passagem, serão frases de efeito, a preço de telegrama, só pra dizerem que gastaram como prova de apreço, isto é, de muito preço.
Agora que vocês ficaram sabendo do falecimento, tem sete dias pra agendarem, sem desculpa de transito, de estacionamento, de rodízio, em fim daquelas desculpas chavões, que a gente faz de conta que acredita pra não perder o amigo.
Eu havia pensado inicialmente, que no meu falecimento que eu fosse cremado, mas depois pensei, com dois túmulos pra que incinerar? Pra levar as cinzas pro cemitério, não preciso de jazigo! Pensei também, não é coerente que depois de ter doado, mensalmente plaquetas, e, só não doei mais porque a legislação limita a idade, por isso, também, não consegui doar a medula. Mas, em vida já declarei que sou doador de órgãos, que agora iria desperdiçar todo o meu corpo que poderá se r útil?
Fazer “um social” só porque o costume hereditário faz, ou melhor fazia, até antes de existirem crematórios, quando então o velório eram aqueles minutos apreçados, porque a traz vem gente, e o fogo do inferno, digo, do forno esta queimando, é quase a mesma coisa que fazer pompas fúnebres, noutra data, com toda a ritualística que a causa merece!
A cerimônia do beija-mão, isto é, do beija defunto, nunca foi do meu feitio, nem fiz quando do enterro dos meus pais (que D´us os tenham no céu), pois quem não faz em vida, não é depois da morte que vai fazer. Ademias, já não estão mais presentes, é só matéria em decomposição que estamos queimando vela em causa profana. Bom seria que todo este apreço fosse demonstrado com visitas, telefonemas, e-mail´s, SMS, em fim que disséssemos: -Ola! Que saudade! Posso dar uma passadinha em sua casa?
Assim eu conto com a Myriam, pois já falamos muito a respeito, já contamos muita piada e passagens cômicas que ela estará evitando de assistir. E a recíproca é verdadeira, cumprirei seu desejo expressado oficialmente de papel passado.
Meus filhos, vocês são responsáveis pela execução deste meu desejo de ultima vontade! Cumpram meu desejo como prova de fidelidade e de gratidão pelo quinhão que vão receber. Esta é a forma de merecerem a herança, começando pelo ônus para alcançar o bônus!
Assim seja!
Chico.´.