NADA DE CAMARÃO ENSOPADINHO COM CHUCHU

Se perguntarmos qual é o prato típico do brasileiro iremos novamente mexer com as preferências regionais. Embora os vegetarianos sejam raros, os que excluem carne vermelha de seu cardápio são em maior número. Assim mesmo, o Brasil é um dos maiores consumidores de carne do mundo, com a média atingindo 36 quilos por pessoa ao ano. Ficamos atrás do Uruguai e Argentina que quase empatam, próximos aos 60 quilos para cada morador da Bacia do Prata. Até aqui falamos apenas da carne bovina que predomina, embora as carnes de ovelha, de frango e de porco também briguem por seu espaço na mesa de todos.

A verdadeira luta, nesse campo, é para baixar os custos de criação. A manipulação genética acontece no enorme laboratório de campo, com cruzamentos que procuram obter carne com mais rapidez e melhor qualidade. Hoje, já podemos ver algumas fêmeas tendo a primeira cria com menos de dois anos de idade, numa quase pedofilia bovina. O boi de abate também tem cada vez menos tempo de vida.

No litoral brasileiro e na Amazônia o peixe entra com muita força, competindo e vencendo por vezes os rivais. Se a Argentina, num pico em 1969 chegou a consumir 100 quilos de carne bovina per capita ao ano, Manaus alcançou a incrível cifra de 54 quilos de peixe por consumidor há alguns anos. Embora as estatísticas nesse campo não sejam muito confiáveis, numa junção de fatores, é possível até mesmo ultrapassar esta cifra, segundo algumas pessoas ligadas ao setor. Mesmo esse grande esforço amazônida não conseguiu fazer com que a média nacional ultrapassasse os 6 kg/ano.

Poderíamos com isso pensar que a fartura é generalizada e que não existe mais carência de comida na mesa de nenhum brasileiro. Seria uma afirmação leviana e até mentirosa, porém isso é assunto para outra discussão em momento apropriado.

Há um pouco mais de 70 anos, a cantora luso-brasileira, Carmem Miranda, depois de sua primeira viagem aos Estados Unidos lançava uma música no Brasil, para provar que não havia perdido sua brasilidade, falando que ainda preferia o “camarão ensopadinho com chuchu”. Embora o prato ainda seja encontrável no litoral do Rio Grande do Sul ao Nordeste, jamais seria (nem foi) top of mind de ninguém. O brasileiro tem a unanimidade do arroz e feijão. O arroz com pequenas diferenças no preparo e o feijão com muitas variedades desde o preto – único para a feijoada – o Jalo com molho farto, o carioquinha no tropeiro ou o fradinho (feijão de praia) no baião de dois. A fonte maior de proteína vem do frango (47,5 kg por ano) seguido pela carne bovina.

A não ser muito recentemente, o hábito do consumo do camarão não existia no interior brasileiro e o chuchu, muito abundante, era cozido e comido como salada ou ingrediente para outros pratos durante o ano todo. Talvez os compositores da música, senhores Luis Peixoto e Vicente Paiva, apenas quisessem atender um gosto pessoal da cantora Carmem Miranda ou retratar uma preferência local da época, quem sabe?

O fato é que a culinária brasileira cresce a cada dia, em qualidade e variedade e talvez, daqui a 70 anos, a preferência nacional seja totalmente outra. Quem sabe?

Luiz Lauschner – Escritor e empresário

lauschneram@hotmail.com