A MÃO.
"A MÃO ou LA MANO em espanhol. Obra de um Artista Anônimo, localizada em um pequeno e lindo Balneário Uruguaio onde moram minha Filha e meu Genro. Essa Obra fica bem pertinho da costa do mar, entre árvores e possui um certo mistério e magia. E onde existe mistério e magia, eu sinto o chamado! rsrsrs..."
Conheci La Mano a cerca de três anos. Fui visitar minha filha recém casada, e meu genro levou-me a passear pelas redondezas e mostrou-me o pequeno monumento. Não sabia quem era o Autor da Obra, sua história... nada, até porque ele também morava à pouco tempo ali. Foi amor a primeira vista. Não consegui mais esquecer aquela Mão, perdida em um lugar afastado em um pequeno bosque, bem pertinho do mar, brotando da terra, como que pedindo Socorro. Essa é a sensação que se tem de longe. A perfeição das linhas, o esforço empregado em cada traço preciso está gravado ali. Tão simples e tão complexa ao mesmo tempo. Cada vez que visitava minha filha, pensava no monumento, mas a pequena cidade é um pouco complicada para quem não conhece. São muitas ruazinhas tortuosas, bosques fechados, e nunca pedi para me levarem no local. Aliás nem sabia para que lado ficava. Isso até Janeiro desse ano, quando Genro e Filha viajaram e fiquei cuidando da casa com meus dois netos biológicos, minha neta do coração e meu sobrinho. Éramos eu e quatro crianças de 5 à 10 anos sem conhecer ninguém, falando um Portunhol terrível e minha intérprete era Anahi, filha de meu genro, que é Uruguaia e tem 5 anos...
Então, lá estávamos nós, praia, protetor solar(rsrs) escalando morros pra conseguir sinal para uma operadora Brasileira, um PC que não funcionava, mas nos divertindo muito. Até que em uma ida ao Mercado uma placa me chamou a atenção: Uma plaquinha indicativa com duas palavrinhas: LA MANO.
Enlouqueci a dona do Mercado, com meu espanhol "Fluente" rsrsrs para que me falasse sobre a obra e me explicasse mais detalhadamente o caminho. Sobre o autor e a obra nada soube me dizer, mas me explicou como seguir a trilha! Seguimos nós cinco, ziguezagueando, indagando as pessoas se estávamos no caminho certo até que achamos. Escondida, quase invisível em um localzinho solitário estava ela. Cercada de árvores e arbustos, porém a poucos passos do mar A MÃO nos esperava. Tiramos muitas fotos, porém informações nenhuma. Ninguém sabia do artista nem do significado da Obra.Deduzi que seria homenagem aos afogados no Mar, como existe em Punta Del Este, porem aquela é Gigante e ponto turístico, ao passo que essa...completamente anônima. Voltamos após muitas fotos, porém uma semana depois minha irmã veio para buscar meu sobrinho e quando soube da história, resolveu ir também conhecer o pequeno monumento. Fomos ao entardecer e tiramos mais fotos, e foi dessa vez que obtive um pouquinho de informação. Entre tantos que perguntei uma pessoa me indicou, um senhor que teria sido amigo do escultor à muitos anos e poderia falar algo. Eu e minha irmã achamos o tal senhor e expliquei tudo para ele, no que fui prontamente atendida. Ele nos contou a seguinte história: Em 1978 o Uruguai também vivia o seu período de Ditadura. Um jovem artista esculpiu um monumento representando uma mão ESQUERDA. Foi preso e sua obra foi destruída...
O Jovem conseguiu provar que sua obra não tinha fins políticos e após alguns anos foi solto, voltou e novamente construiu a mesma Mão Esquerda, tal qual a primeira. A data está ali, 1986 se não me engano. Na verdade, segundo o Sr. me explicou essa foi a segunda mão. Ele não desistiu e deixou sua marca. Linda, fascinante, desconcertante e quase anônima. Eu queria saber dele, onde estava, o que fazia, ao que o Simpático Idoso me respondeu: Suicidou-se uma noite em sua casa ali ao lado minha (indicando-nos com o braço uma casa simples ende está escrito La Boehmia, se não me engano.) Conto-me que isso aconteceu há mais de quinze anos, e que ele deixou obras lindíssimas, algumas inacabadas . Foi só o que soube, não tive coragem de ir até a casa onde o Artista morou, até porque é habitada. (Não sei se por parentes) Fica em frente ao Monumento, cerca de uma quadra mais ou menos. Também não tive coragem de crivar de perguntas o simpático informante, por medo de me tornar inconveniente. Afinal eu devia estar passando a imagem de uma Brasileira Fuxiqueira, pois o povo Uruguaio é simpático, caloroso, porém discreto, e eu poderia ser mal interpretada.
Enfim é isso...Creio que no mundo existem milhares de artistas anônimos, de todas categorias (músicos, pintores, poetas, escritores etc...) que poucos ou ninguém sabe ou soube da existência, mas que deixaram seu legado e que fizeram a diferença. Rezo por ele, espero que esteja bem. Que Deus o tenha à seu lado. Suicidou-se, mas prefiro imaginar que já tenha sido resgatado. No local paira um sentimento de emoção, uma coisa que eu nunca soube explicar. Artistas são pessoas normais, porém existe algo que os difere. Também não sei explicar. Parecem ver o mundo de maneira diferente. Por vezes um mundo colorido, por vezes cinzento. Artista é bicho esquisito! É ímpar.
Sei que enquanto o Sr Uruguaio contava o que sabia, eu lutava pra não chorar e entendia tudo. A energia, a melancolia e atração que existe naquele lugar. Meu respeito e eterno carinho aquela obra! Tenho muitas fotos do monumento... Todas tiradas antes de saber. Creio que não mais fotografarei o local, não sei...talvez sim, talvez não...
Minha irmã agradeceu ao Sr. Idoso, me pegou pelo braço e disse vamos. Anoitecia... olhei para trás vi LA MANO pela última vez parecendo me acenar...Nunca mais voltei lá até hoje! Mas voltarei! Voltarei com certeza! Eu me conheço! rsrs...