A coragem no bem

A vida e ensinos de Jesus representam roteiro para a felicidade. Honremos seu exemplo com a prática do bem em todos os dias de nossa vida

Jesus é a expressão máxima de perfeição que a humanidade pôde conhecer, apresentado pelos espíritos codificadores como modelo e guia para o comportamento do homem (O Livro dos Espíritos, questão 625). Seus exemplos e ensinos ecoam por todos os tempos, sua influência na história humana é tão imensa que até a contagem dos anos é classificada em antes e depois Dele. Se analisarmos bem, as dificuldades, problemas e desafios que aí estão (e não só nos aspectos morais do relacionamento, mas inclusive nos problemas ecológicos, extremos sociais e circunstâncias individuais), refletem bem a inobservância ou indiferença com seus ensinos.

Pelo menos em todo o Ocidente, seu Natal transformou-se num pretexto comercial, embora é inegável que a época natalina toca mais diretamente o coração humano, tornando as criaturas mais sensíveis aos sofrimentos alheios, e, pelo menos, nesta época surgem as costumeiras campanhas de auxílios aos menos favorecidos. Ideal que esta fosse uma atividade permanente durante todo o ano.

Mas Jesus é uma personalidade admirável. Busca-nos com a solicitude de alguém que ama seus irmãos, direcionando nossas vidas para o bem e a felicidade. Sua presença na Terra atenua e alivia as agruras promovidas pelo egoísmo e pelo orgulho. A suavidade de seus ensinos, sua doce influência em favor dos homens e confortador convite para a renovação individual traduz verdadeiro programa de felicidade e paz. O convite é permanente, aplica-se a todas as situações e a indiferença dos homens tem trazido os dolorosos quadros da atualidade.

Como, pois, não falar Dele? Como não citá-Lo continuamente, buscá-Lo com a confiança de alguém que traz marcas a serem reparadas ou ansioso para vencer as más tendências e desejoso de melhorar-se individualmente, como é o quadro da maioria dos homens já conscientes do valioso patrimônio da própria existência?

E também, como não levá-Lo àqueles que não O conhecem? A quantos O ignoram ou Dele se esquecem?

Essas reflexões levaram-nos à frase que usamos para título do artigo. Ela está numa correspondência dirigida à Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, pelo Dr. De Grand-Boulogne, médico e antigo vice-cônsul da França. Allan Kardec publicou-a na íntegra na REVISTA ESPÍRITA de agosto de 1860 - ano III, vol.8 - (Editora Edicel), comentando que referida carta dispensa comentários e cada um apreciará o alto alcance dos princípios nela formulados de maneira ao mesmo tempo tão profunda, tão simples e tão clara. São os do verdadeiro Espiritismo.

É que o signatário, desejando integrar-se à Sociedade, declara conhecer e adotar os princípios apresentados pela Codificação e apresenta quadro comparativo sobre a concordância espírita e cristã.

Na comparação de sua fé religiosa com os princípios do Espiritismo, o autor da carta apresenta itens que consideramos importante trazer ao leitor, face à didática daquela elaboração textual e sua absoluta coerência com a proposta do Evangelho.

Transcrevemos alguns mais diretamente ligados ao objetivo do artigo:

"(...) 2- Objetivo e fim de todos os seres criados: concorrer para a harmonia universal.(...)

7- As leis que regem o mundo moral estão formuladas no decálogo, mas se resumem neste admirável preceito de Jesus: Amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a vós mesmos.

8- Toda derrogação da lei constitui uma perturbação na harmonia universal; ora, Deus não permite que tal perturbação persista e a ordem deve ser invencivelmente restabelecida.

9- Existe uma lei destinada à reparação da desordem no mundo moral, e esta lei está toda inteira nesta palavra: expiação.(...)

14- Que é virtude? A coragem no bem. (destaque para o título do artigo)

15- O que há de mais belo no mundo não é, como disse um filósofo, o espetáculo de uma grande alma lutando com a adversidade; é o esforço perpétuo de uma alma progredindo no bem e elevando-se de virtude em virtude até o seu Criador.

16- Qual é a mais bela de todas as virtudes? A caridade.

17- Que é a caridade? É o atributo especial da alma que, em suas ardentes aspirações para o bem, se esquece de si mesma e se consome em esforços pela felicidade do próximo".

Observem os leitores: objetivo dos seres criados (item 2 acima): concorrer para a harmonia universal. E para isso, com a coragem no bem (item 14), através da caridade, ou seja esforços pela felicidade do próximo (item 17).

Neste ponto, podemos voltar ao início do artigo e recordar os ensinos de Jesus. Verificaremos claramente sua proposta. É notória a lucidez do roteiro apresentado, em favor da felicidade humana. Esta, a felicidade, está ausente, por responsabilidade do próprio homem. Este concorrer para a harmonia universal é um dever. Se cumprido, com a coragem no bem, através do esquecimento de si mesmo em favor do bem geral, teremos a felicidade. É a proposta do Evangelho, que precisamos incorporar no dia-a-dia.

Mas, voltemos à carta do esclarecido médico.

Em bem fundamentadas considerações, cita que o saber está abaixo da caridade, afirmando que o saber é uma qualidade; a caridade , uma virtude.A definição da palavra qualidade indica condição natural, maneira de ser, natureza. Já a da palavra virtude indica hábito de praticar o bem, ou uma boa qualidade moral. Note o leitor: uma boa qualidade moral, já que a qualidade é neutra, pode ser boa ou ruim.

E este hábito ou esta boa qualidade moral, ou sua formação, advém dos sábios desígnios de Deus, através de circunstâncias, onde sem o sofrimento não há caridade, sem o perigo não há coragem, sem a desgraça não há devotamento, sem a cólera não há paciência, como considera nosso citado autor.

A questão toda, ainda acompanhando a sequência do texto em referência, é que as doutrinas filosóficas ou religiosas acabam por se traduzirem nos atos da vida. E como os atos da atualidade revelam incoerência com a proposta cristã, fica evidente que os ensinos de tal proposta, transmitidos ao longo dos séculos, por imposição ou pelo medo, desfigurando sua beleza original, ocasionando as consequências vividas no presente, pois que (usando palavras do próprio autor) uma sociedade realmente cristã seria perfeitamente feliz. (...) na verdade, parece mesmo impossível que um espírita sincero por um só dia negligencie trabalhar o seu melhoramento e, assim, não concorra para restabelecer a harmonia perturbada pelo desbordamento das paixões egoísticas e cúpidas.

Mas, como ainda nos deixamos dominar pelas paixões, aí está o quadro atual, reclamando uma mudança de postura e a assimilação do convite do meigo Jesus, de quem os espíritas tanto falamos, mas esquecemos de colocar em prática em nossas vidas... Mesmo entre nós, quando somos dominados pelo ciúme (quando alguém se projeta, quando um grupo realiza algo e outro fica cheio dos perigosos melindres), pelo fanatismo ou pelas disputas internas.

Mas, deixemo-nos impregnar no novo ano, convidando o Mestre a morar conosco no coração, permitindo-Lhe suavizar nossos tormentos, mas também oferecendo nossa disposição em melhorar a nós mesmos e ao mundo que nos cerca, para que a felicidade venha cobrir os cenários da Terra.

Nosso antigo vice-cônsul da França conclui sua carta afirmando: Pode, pois, afirmar-se que, propagando as verdades que temos a felicidade de conhecer, trabalhamos pela humanidade e nossa obra será abençoada por Deus. Para que um povo seja feliz, é necessário que o número dos que querem o bem, que praticam a lei de caridade, supere o dos que querem o mal e só praticam o egoísmo.

Eis a proposta de Jesus!

Orson
Enviado por Orson em 08/02/2007
Código do texto: T373777