Quando não há espelhos em casa
Entre o que pensamos e o que fazemos de fato há uma distância por vezes dantesca.Se estamos longe de 'poder' o nosso discurso é futurista, de base de classe, solidário, fundamentado no bem comum. Mas é quando estamos à frente do poder que mostramos mesmo para o que viemos nesse mundo cão.
O fantasma da desigualdade social assombra e assombrará sempre a sociedade infinitamente capitalista na qual vivemos. Respeito à lei, respeito ao ser humano estão longe de ser um ideal dos 'homens do poder'. É necessário abrir aqui um parênteses importante: há quem diga, ao ler esse texto, que esse é mais um discurso de funcionário recalcado, mas há quem diga que essa é mais uma demonstração de indignação e força perante o poder público e há quem profetize, também, que esse é o mais puro manifesto de coragem e determinação.
O fato é que a voz do que sofre jamais deve calar e é isso o que será feito agora.
Imagine um país cuja lei jamais se manifesta em favor do pequeno, um país no qual as leis e os direitos são criados por pessoas eleitas pelo povo para trabalharem a seu favor e essas mesmas pessoas distorcem tais leis e as fazem beneficiar apenas quem tem dinheiro. Como diria o nosso bispo, "é uma maneira elegante de nos roubar". Então a pergunta é: se não podemos confiar nas pessoas nas quais confiamos os nossos direitos e a direção política e social da comunidade, a quem devemos recorrer? Se vamos aos políticos, pessoas constituídas no meio do povo, nos humilham, zombando de nossas fraquezas e limitações, quando deveriam lutar para melhorar nossa sociedade. Se apelamos para a justiça, essa é tão cega que se apega ao faro e só consegue achar os caminhos dos milionários. Ela só pune alguém se for uma retaliação política conveniente para alguém ou grupo de poder econômico privilegiado.
Inúmeras são as disparidades. Impostos absurdos são cobrados do povo todos os dias e a divisão de lucros sempre nas mãos de meia dúzia. Novamente a história do 'pão e circo'. A novidade, quer dizer, a notícia, pois novidade não é não, é que o governador do Estado de Sergipe foi a uma rádio dizer que 'por ele os professores farão greve até 2014', 'que ele agiu dentro da lei, nós é que queremos tumultuar e exigir o que não nos é de direito'. Vergonhoso e revoltante ouvir tais palavras de alguém que um dia esteve do lado de cá, foi sindicalista, ativista e hoje se dirige a uma classe que busca somente o cumprimento de uma lei federal que lhe está sendo negada.
Isso é compromisso, idoneidade, integridade, retidão e justiça? Esse é o retrato de alguém que se deixou corromper, de alguém que um dia voltará à plebe e que pedirá, talvez com um tapinha no ombro, uma promessinha fajuta, uma lábia indecorosa e mentirosa o seu voto de confiança. Sim. Essa mesma pessoa que hoje usa a mídia para manchar o nome de toda uma classe, chamando a todos de preguiçosos e incompetentes, dizendo que os alunos não aprendem por causa dos professores que não ensinam. E ainda há quem comungue dessa ideia, pois numa passeata há um tempo atrás, um senhor passava de carro por nós e chamou a nós todos de vagabundos.
Eis a questão. Pagamos altos impostos e eles não retornam para nós em forma do que precisamos. Ainda somos humilhados nas portas dos hospitais, isso quando nos atendem, não temos direito a uma aposentadoria digna, somos obrigados a trabalhar sem material, em condições muitas vezes não higiênicas, pois não há quem limpe a escola, se quisermos fazer um trabalho diferente temos de pedir aos pais de alunos que nos ajudem a bancar, pois a escola nunca pode, se criamos projetos não temos apoio necessário. Enfim, muitos "se" permeiam e dificultam o nosso trabalho. Além disso, ainda temos o problema da ausência da família na escola, que em muito tem aumentado os problemas de comportamento dos alunos. E ainda temos de ouvir um representante do povo dizer que somos irresponsáveis. Não sei se é o cúmulo do absurdo ou o cúmulo da falta de compostura da parte desse homem. Mas que responsabilidade ele acha que tem quando diz que por ele faremos greve até 2014? Muito me admira que alguém que prese tanto os números seja capaz de se omitir à lei em favor de seus próprios interesses como assim ele tem feito. Sei também que, se por acaso visse o meu texto daria gargalhadas estridentes, chamando-me de revoltadinha. Talvez eu o seja, mas se o sou é porque não tenho sangue de barata, tenho contas a pagar e é do meu suor que sobrevivo, não de promessas e conchavos político-partidários.
Sou professora sim e não me envergonho disso. Só me envergonho de um dia ter feito campanha para Marcelo Déda ganhar o governo do estado e representar os meus direitos. Disso me envergonho e padeço de remorsos profundos, pois foi com a minha ajuda que elegi um judas, um carrasco, um homem que não sabe respeitar nada e nem ninguém. E o pior é que as promessas de mudanças são piores do que os que ai estão. A justiça se nega a ver onde está a verdade e contribui para que a injustiça seja feita, encontrando brechas numa lei que está provado ser falha. Todos se calam para que toda uma classe seja escravizada, muitos aplaudem tal decisão, pois tem medo de que estes gravetos lhes furem os olhos. Para eles é conveniente uma sociedade pessoas inertes, pois continuarão vendendo suas dignidades por R$5, por um saco de cimento, uma prótese dentária, uma consulta em Aracaju. Mas cuidado, políticos imorais, este mesmo povo pode um dia te derrubar desse pedestal que acreditas tanto ser indestrutível. Cuidado para um dia você mesmo não precisar de um bolsa família, um bolsa escola da v ida, pois só ai saberias valorizar cada centavo que descaradamente desvias do seu destino certo para as suas contas particulares.
Na tua visão, governador, um professor não merece um salário digno, mas é obrigado a trabalhar como escravo e vigiado como criminoso, nunca valorizado. O pessoal que colocaste na SEED compartilham contigo dessa ideia, mas esse mesmo pessoal sempre falhou em suas atividades, pois só sabia e só sabe gritar, jamais orientar para que nenhum lapso ocorra. Tudo que vem da secretaria é de armengue, jogam nas escolas e nem sabem onde deixam, depois nos cobram como se fossem as pessoas mais organizadas do mundo. Passam a vida copiando projetos de outros estados - embora tenham trazido experiências positivas - que nem sabem como colocar em prática, depois deixam pra lá com alegações das mais inúteis possíveis. Como se estas pessoas não soubessem o que é uma sala de aula. Acho até que não sabem mesmo não, pois muitas estão há anos na SEED e não sabem mais que o mundo e a sociedade mudaram completamente.
Valeu, Marcelo Déda, você realmente é um homem de visão.
Betania Maria