CINEMA OLYMPIA - 100 ANOS PROJETANDO ARTE
Sérgio Martins Pandolfo*Fato deveras auspicioso para os belenenses e, em especial para os cinéfilos, o centenário que transcorrerá, neste 24 de abril, do cinema Olympia, o mais antigo cinema de rua em funcionamento no território nacional. O Olympia foi erguido junto ao prédio do Grande Hotel, hoje de doída memória para nós, pois demolido na década de 1970, a fim de complementar os negócios dos empresários Carlos Teixeira e Antônio Martins, donos do Grande Hotel e do Palace Theatre (apegado ao GH). Tencionavam eles fazer do novo empreendimento um ponto chique para atrair os frequentadores do Theatro da Paz e, obviamente, os hóspedes de seu hotel. Viviam-se os últimos anos da glamourosa Belle Époque, propiciada pelo fastígio da borracha, de abastança financeira e finesse da sociedade belenense, Belém havida como a Petit Paris.
O Olympia foi o primeiro cinema desta capital a ser construído dentro de padrões de modernidade e requinte. Até então os cinemas existentes pela periferia da cidade eram constituídos por salas quase sempre improvisadas e máquinas projetoras de qualidade inferior. E dava gosto de ver o requinte das instalações, a começar pela sala de espera, com seus espelhos de cristal bisotê e mobiliário refinados, quase sempre com um conjunto musical ou com um pianista a executar músicas clássicas ou semiclássicas (Ernesto Nazaré, p.ex.), as damas finamente trajadas e os cavalheiros de ternos (terno mesmo, com o colete) quase sempre de puro linho branco, chapéus franceses, luvas e bengalas com engastes de ouro ou prata.
Por estar localizado junto ao prédio do hotel, a saída das matinês era uma festa, tanto para os que saíam das sessões como para os que estavam já amesendados nas bancas da terrasse o que, quase sempre, redundava em engrossamento da freguesia daquele pitoresco local, tão famoso à época que mereceu a atenção especial de Mário de Andrade em carta a seu amigo Manuel Bandeira: “... O direito de sentar naquela terrasse em frente das mangueiras tapando o Teatro da Paz, sentar sem mais nada, chupitando um sorvete de cupuaçu, de açaí, você que conhece o mundo, conhece coisa melhor do que isso, Manu?”. As matinês e vesperais – ou soirées - de domingo eram as oportunidades maiores para moças e rapazes iniciarem um namorico ou aproveitarem “o escurinho do cinema” para gozarem a delícia dum chamego mais descontraído que, quando passava da conta, logo era interrompido pelos vagalumes ou “lanterninhas” sempre atentos e prestos.
O Olympia foi inaugurado, é de relevo dizer, pouco tempo após a invenção do cinematógrafo pelos irmãos Lumière, em 28 de Dezembro de 1895, ainda na época do cinema mudo, eis que as primeiras fitas “faladas” só vieram a público no final da década de 1920, vindo a sala, portanto, desde os primórdios da chamada 7ª Arte. No Olympia se exibiu o primeiro filme sonoro chegado à Belém: “Alvorada do Amor”, em novembro de 1930. Exibiram-se também, pioneiramente, filmes em 3-D.
No final dos anos 1930 a empresa Teixeira & Martins não suportando os encargos financeiros vendeu o cinema, e outros que controlava, ao banqueiro Adalberto Marques, que criou a “Cia. Cinematográfica Paraense Ltda.” Uma firma de vida curta, eis que em 1946 Marques vendeu todos os seus cinemas ao exibidor cearense Luís Severiano Ribeiro, já dono de salas em diversos Estados.
Alegando prejuízo a sala foi fechada em 16 de fevereiro de 2006 pelo seu atual proprietário, Luís Severiano Ribeiro Neto. Transformado desde 2006 em Espaço Municipal Cinema Olympia "Luiz Severiano Ribeiro", agrega hoje programações, projetos, que estimulam no público a capacidade de conhecer e aprender a técnica e a prática cinematográfica. Projeto apresentado à Câmara Municipal de Belém, já aprovado e sancionado pelo gestor da cidade, pretende desapropriar o prédio e remodelá-lo, a fim de torná-lo mais apto a continuar cumprindo sua nobre missão em coparticipação com a UFPA e preservar um dos edifícios de grande valor patrimonial da capital parauara.
Nota: acima foto da edificação original do Olympia, hoje muito modificada.
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*Médico e escritor. ABRAMES/SOBRAMES
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