O casarão da rua da Penha esquina com rua Moreira César

Muito tem se falado a respeito do casarão. Este artigo espera esclarecer algumas dúvidas do presente caso.

`Sorocaba presencia em épocas sucessivas a sistemática destruição de prédios históricos, restando poucos testemunhos das fases de crescimento, prosperidade e influência de estilos dessas diferentes épocas´.(GENARO, 2002)[

"Sorocaba, rota bandeirante e importante centro comercial de muares no período colonial, não conseguiu ao longo da modernização urbana a que foi submetida no século XX lutar pela preservação de seus bens culturais e históricos. Nosso triste caso elucida o descaso grotesco da população brasileira para com sua memória. Atualmente, no início de um novo século, a cidade já não conta com mais de 10 exemplares de sua grandiosa arquitetura colonial e assiste continuamente à dizimação de seu patrimônio histórico edificado, sucumbindo às forças aparentemente irreversíveis do capital imobiliário". (BUGANZA, 2006)

A história do abandono do casarão começa em 1996. Exatamente em abril desse ano, quando o CMDP (Conselho Municipal de Defesa do Patrimônio), através da resolução nº 32 tomba o presente imóvel no grau de proteção 2. O que é grau de proteção 2 ou GP 2 . A nossa legislação municipal define como sendo: `com esta qualificação, o imóvel tombado terá sua parte externa (fachada) preservada, podendo somente ser restaurado por técnicos qualificados e que mantenham suas características originais. Já internamente fica livre para as reformas e intervenções desejadas´. Em outras palavras o tombamento do imóvel é somente da sua fachada, sendo o seu interior liberado para reformas e modificações. Em dezembro do mesmo ano, através da resolução nº 69 o CMDP ratifica o tombamento.

Convém lembrar que o CMDP preserva os patrimônios: histórico, artístico, estético, turístico e paisagístico.

O conceito de bem cultural nos diz que não podemos considerar um edifício isoladamente mas sim devemos considerar o edifício associado ao seu meio físico e social, ocasionando uma aproximação do passado ao presente à luz de uma convivência moderna. O patrimônio cultural são bens para os quais se reconhecem valores que identificam e perpetuam a memória e referenciais do modo de vida e identidade social (tantos elementos materiais como imateriais); e preservar é ato de manter os testemunhos das manifestações culturais e ambientais que possibilitem a uma sociedade reconhecer a sua identidade, valorizando e estabelecendo referenciais para construção do seu futuro. Além dessas definições acima `devemos respeitar o repertório emocional intrínseco, pessoal e único de cada habitante, de cada cidade que traz dentro de si.A construção quando destruída leva na avalanche, a reboque, as lembranças e sentimentos a ela relacionados. Na verdade é um pedaço da história de cada um, parte de nossas vidas que também se apagam e desaparecem. É um pouco ou uma parte de nós mesmos´. (BARROS, 2001).

Françoise Choay, diz: `quando falamos em patrimônio e sua proteção ressaltamos os valores científicos, estéticos, memoriais, sociais e urbanos.´

`A taipa de pilão (paulista) começou a ser substituída por alvenaria de tijolos(trazida pelos imigrantes) à partir de 1875, quando na edificação da 1ª estação da Estrada de Ferro Sorocabana, foi usada pela primeira vez em nossa cidade´. (GENARO, 2002). Creio que em 1930 Sorocaba era a segunda maior cidade industrial do Brasil.O dinamismo das indústrias têxteis, a farta energia elétrica gerada por Itupararanga, suas obras civis, faziam Sorocaba se destacar. Ainda mais um fato vem a acrescentar esse dinamismo, em 1930 as oficinas de Mairinque são transferidas para Sorocaba, incentivando ainda mais o comércio local. É nesse período que surgem as construções particulares luxuosas, de linhas sóbrias e elegantes, fruto de uma burguesia ascendente. Lembro que a arquitetura eclética predominava nos anos 30. Suas características arquitetônicas são: ornatos salientes, colunas, capitéis, barrados, molduras e brasões.

O casarão representa um período de desenvolvimento urbano e utilização de novas técnicas construtivas emergentes. Sua localização com `frente para a rua Moreira César, em terreno que pertencia a chácara de Manoel Ferreira Leão, conhecido por 'seo' Maneco Leão, onde sugiram as primeiras mansões de Sorocaba, na década de 30. Terezinha de Jesus Rosa Rafanelli, filha de Alcino Rosa, o ex-prefeito que construiu o prédio do Mercado Municipal, lembra que a sua casa, na esquina com a rua Duque de Caixas, e o casarão abandonado da esquina com a Penha, eram as mais bonitas do quarteirão. 'As pessoas diziam que eram as mansões mais bonitas da cidade´. (LEITE, 2006). Foi construído pelo médico Antonio de Barros e depois vendido ao escrivão Bento Mascarenhas, que construiu cômodos nos fundos (segundo o CMDP, não obedecendo o mesmo estilo da edificação).

As principais características do imóvel são:

- Construção a meia altura da elevação do terreno;

- Embasamento em granito;

- Alvenaria em tijolos;

- Varanda envolvendo a parte térrea principal;

- Pilares da varanda em blocos maciços de granito;

- Tijolos aparentes nas fachadas;

- Esquadria de ferro trabalhada na entrada principal;

- Amplas janelas, possibilitando a integração com o exterior, além de ótimo conforto térmico;

- Uso de estuque na varanda e beirais;

- Sua volumetria;

- Ajardinamento;

- Era a única quadra que apresentava certa unidade formal entre as residências.

`Marco da Engenharia Civil e da Arquitetura, revela o gosto pelas formas e esquema de implantação, é um dos últimos exemplares do período em referência em Sorocaba´. (GENARO, 2002). Além da competência e aplicação dos construtores da época quanto ao uso de novas técnicas construtivas, no início do século XX. Considero como um marco significativo de uma fase do nosso desenvolvimento. Por estes motivos acima expostos o casarão tem valor histórico, artístico e estético.

Bibliografia:

ARANHA, Sergio Benedito Abibe. Processo de Recuperação de Edifícios Históricos Localizados na cidade de Sorocaba, SP. Campinas, Faculdade de Engenharia Civil, Universidade Estadual de Campinas, 2003. 93 páginas. Dissertação.de mestrado.

BUGANZA, Cintia Peres. Série: Possibilidades de ação para a questão do Patrimônio Histórico Edificado.Publicado no site : www.memoriaviva.org.br, janeiro de 2007.

CHOAY Françoise. A alegoria do patrimônio, Lisboa: Edições 70 Ltda., 1999, 245 páginas.

GENARO, Antonio. Laudo pericial discordante. Processo1551/97. Quinta Vara Civil da Comarca de Sorocaba, 2002.

IPHAN. http://portal.iphan.gov.br

LEITE, Walter Rinaldi. Casarão é remanescente do tempo das mansões da Moreira César, reportagem publicada no jornal Cruzeiro do Sul em 26 de fevereiro de 2006.

PRESTES Lucinda Ferreira. Sorocaba, o tempo e o espaço, séculos XVIII-XX. São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, 2001. 293 páginas. Tese de doutorado.

Sergio Aranha

Programa Memória Viva: O documentário "Caminhos da Arte" estará durante o os meses de janeiro(final) e fevereiro Às segundas, quartas e sábados. Na TVCOM de Sorocaba, canal 7 da NET.

Douglas Lara
Enviado por Douglas Lara em 24/01/2007
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