Abstinência

Concebo-a como um tipo de privação de algo, seja benéfica ou o contrário, uma "ausência" voluntária ou compulsória, acarretando situação ambivalente devido ao fato de propiciar tanto bem-estar como torturantes crises de carência. Abster-se tem uma amplitude de paradigmas, cujas interferências em um determinado indivíduo são um tanto diversificadas, justamente pela singularidade de personalidade, mas é uma experiência inerente à condição humana.

Provisória ou definitiva, a abstinência nunca é neutra e produz seus efeitos, deseje-se ou não.

Posto isso, privar-se talvez seja uma das tarefas mais árduas às quais são expostas as pessoas, ao longo de suas existências. É comum o temor, a relutância e a fuga das abstinências, pois elas carregam em si o implícito significado da "ruptura", o que abala a interioridade condicionada de quem está sob seus efeitos, por tal razão, é tão doloroso o encerramento de um ciclo que não se pretende ver findado, nem mesmo sua interrupção transitória. Quando há forte carga emocional vinculada ao que gera abstinência, então se potencializa seu poder de influência e os efeitos podem ser devastadores se não houver estrutura interna para tanto.

Com o advento da era digital, abster-se das mídias virtuais tem se

configurado como uma tormenta contemporânea, fenômeno histórico recente e significativo.

Num sentido estrito da saúde do corpo e da alma, há a privação de ingestão de alimentos (jejum), bebidas/psicotrópicos (sobriedade) ou mesmo do sexo (castidade). Tudo com propósitos peculiares, mas similares no estancamento da fluidez de hábitos e inclinações.

Nos envolvimentos afetivos, o drama da abstinência abrange desde a esfera física, à emocional e social. Quando se estabelece um contexto de relacionamento que implica interrupção de ciclos, as privações vêm à tona, normalmente parte delas são permanentes, trazendo sensações de perda perpétua e irreparável, semelhantes às das oriundas dos falecimentos de entes queridos. Isso tudo repercute poderosamente no âmago humano, frágil por natureza quando exposto a esse cenário, afinal, nem sempre se sabe a natureza da abstinência e sua duração. É elementar, portanto, a relutância em reconhecer e/ou utilizar-se desse "ponto final", não gramaticalmente falando... mas, no presente artigo, o sinal gráfico é o que deve cessar a escrita(.)

CARLOS AUGUSTO DE MATOS BERNARDO

Augusto Matos
Enviado por Augusto Matos em 08/02/2012
Reeditado em 12/02/2012
Código do texto: T3486994
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.