O tempo é cruel
Disse Chico Buarque num dias desses. Não me lembro se ele disse tempo ou velhice.
Quando ao escrever, queria expressar algo fora da rotina, não me ocorria a palavra apropriada. Com os nomes de pessoas, era pior. Era difícil trazê-los à tona.
Recomendaram-me procurar um neuro. Fizemos baterias de exames. Nada de anormal, disse. É a idade. E receitou-me diversas vitaminas, ômega 3, geleia real e exercícios para o cérebro.
Palavras cruzadas já vinha fazendo há tempos. Aprender dois ou três idiomas, simultaneamente, inglês e chinês, por exemplo. Ou japonês. Além desses, o melhor remédio preventivo para Alzheimer é estudar também Matemática, enfatizou. O macete é não deixar o cérebro ocioso. E lá fui contratar uma professora particular. Além de ser eficiente, é bem bonita. Começamos do princípio. Nem fazer cálculos com parênteses, chaves, eu sabia. Tinha esquecido tudo. Chegamos na fração. Vamos ver o que vai dar. A Sônia, assim se chama a professora, para me incentivar, afirma que chegarei a dominar até o Cálculo – terror dos estudantes de engenharia – dentro de pouco tempo. Mas tudo isso é fichinha perto da língua chinesa. Decorar aquela pronúncia estranha e os dez mil ideogramas que são necessários para uma simples leitura de jornais é tarefa hercúlea. Só tenho uma tênue esperança. Que o mundo acabe mesmo em 21 de dezembro, como dizem os profetas ,ou vou trocar o chinês pelo japonês. Esta língua parece ser menos masoquista, creio.