CASO EUSÉLIO: 20 ANOS DE IMPUNIDADE
Dói e irrita, neste País, o que se tornou banal chamar-se de impunidade. Não se tem notícia de nação nenhuma, na face da Terra, onde impere tanto essa megera que faz escárnio dos amigos e parentes das vítimas da violência.
Justamente nesta data, 26 de setembro, em Fortaleza, a mão assassina de um celerado ceifou a vida do advogado, professor, cineasta, fundador e coordenador do Teatro Casa Amarela, um importante anexo cultural e cinematográfico da Universidade Federal do Ceará (UFC). Quer dizer: um homem utilíssimo à sociedade, o que não se pode dizer do perverso sargento reformado da Marinha que o matou.
O celerado que o assassinou, em 26/09/1991 – pasmam as senhoras e senhores! – nunca, eu disse NUNCA, cumpriu um único dia de detenção. Contudo, no Brasil, esse absurdo dos absurdos é a prática usual do Direito e da Justiça. Irrita, estupra a consciência nacional, mas não é novidade alguma.
Por uma leve e banal discussão, em torno de um estacionamento que o cineasta fizera ao lado da banca de revista do assassino, o sargento Luís Rufino esperou – com premeditação – a volta de Eusélio Oliveira e do filho deste, que haviam ido por breves minutos a uma prestadora de serviços de vídeos e filmagens. Dois balaços, a sangue frio, no peito do professor indefeso e ainda um, de quebra, no rapaz, que então tinha 21 anos, quase também o assassinando. Até hoje o sobrevivente, Eusélio Gadelha Oliveira (filho), sofre de problemas circulatórios em consequência da agressão covarde.
Tudo provado, com o preto no branco: testemunhas, etc., por um “crime de homicídio qualificado e lesão corporal”. Mas vocês sabem em que resultou a tragédia ocasionada pela mão do celerado sargento reformado da Marinha? Isto mesmo, todos acertaram: NÃO DEU EM NADA. Um dia sequer de xilindró para o frio assassino.
O réu (ou herói?) foi a júri popular, que o sentenciou a 12 anos de prisão (viram aí a migalha de pena?); porém, com acrobacias de ordem judicial, brechinhas nas letras da Lei, chicanas, lengalengas e apelações, advogados escovados, e o mais dos expedientes de “sabedoria”, o celerado Luís Rufino ficou são e salvo na praça confortável da impunidade.
Segundo a Associação de Amigos e Vítimas da Violência (APAVV), o tal julgamento que se deu no Tribunal do Júri processou o sargento em 15 anos de prisão. As cifras de 12 anos são de outro filho do falecido Eusélio, que esteve hoje em uma estação de rádio. Trata-se do também cineasta e continuador da obra do pai, no Teatro Casa Amarela, o Sr. Wolney Oliveira, formado pela Escola de Cinema de San Antonio de Los Baños, em Cuba.
No Brasil é assim: você mata, todo mundo viu o acontecido e sabe que o gajo matou, mas aí vem aquele rosário de chicanas e chicaneiros para protelar um processo, até que a culpa caia na cloaca do esquecimento e/ou da superação dos prazos permitidos pelas mamatas da legislação. Empurram-se as querelas com a barriga e a coisa caduca. Pronto: estamos conversados.
Com os “recursos” arguídos pela defesa do assassino, houve a tão esperada diminuição da pena. Enfim, vêm mais petições de abrandamento do crime, ótimas brechas no código caduco e o caso vai parar no STF, lá onde se engaveta até pensamento de monge tibetano. Placar da tramoia judicial: impunidade.
Vinte anos sem solucionar-se o caso do professor Eusélio Oliveira. Morto covardemente, vitimado por balas assassinas e, ainda assim, no Além, achincalhado pela impunidade brasileira. Até quando? Logo mais o caso prescreve e tudo como dantes, no quartel de Abrantes.
O cineasta Wolney também declarou, hoje, pelo rádio, que ouviu o zunzum de que o processo, lá no STF, em Brasília, dorme placidamente por conta do expediente desonesto e desumano de certo deputado federal do PMDB, que tem poderes divinais e excepcionais, e influencia tudo para que haja o engavetamento do processo.
Boa dúvida: a Justiça brasileira ainda faz justiça? Perguntem ao clamor nacional, que não cessa de, nas ruas, pedir, implorar, imprecar, chorar, esgoelar-se e lastimar-se por “justiça, justiça, justiça!”
Fort., 26/09/2011.