QUANTO GANHA UM JUIZ?
Os juízes brasileiros precisam de salários? – Tudo nos leva a crer que segundo o Planalto, não! Eu não tenho certeza do que pensa os Ministros da Fazenda e Planejamento, muito menos o que pensa a Presidenta Dilma Rousseff a respeito do Judiciário, principalmente de seus magistrados; mas pelo visto eles pensam “iguaiszinhos” ao povão, excluindo-se o rótulo de Deus, porque em tese pode decidir quase tudo, o povão pensa que todo juiz é rico, famoso e intocável; uma espécie de estrela de Hollywood que ganha salários megalômanos e que podem comprar tudo...
A carreira no judiciário é uma das mais buscadas no Brasil e já foi a mais glamorosa entre as nossas profissões. Desde o Império até meados da década de 90, um juiz era “o cara”. Na época em que ainda existiam os juízes classistas, uma nódoa ridícula para nosso sistema judiciário e um retrocesso cômico para nossa história, havia sindicalistas que davam a vida por um cargo destes, porque ganhavam bem, podiam andar armados e ostentavam um poder ainda mais efêmero do que hoje o é, mas ainda assim, eram “juízes” e isso lhes bastava! Ser um juiz estadual era charmoso; do trabalho, respeitoso; mas ser um juiz federal era como estar no topo de tudo e acima de todos!
Decisões simples e às escuras faziam dos salários dos juízes de fato serem verdadeiros contos de fadas; eu próprio conheci inúmeros que chegaram a ganhar mais de 100 pisos por mês, então era comum vermos juízes serem também latifundiários, proprietários de carrões importados, morando em mansões e guardando muito dinheiro para os outros luxos, como por exemplo, jóias, viagens internacionais (que eram absurdamente caras no passado) e outros mimos que o dinheiro pode comprar.
Mas a farra do boi foi acabando, acabando e quase acabou de vez! Não fosse a audácia de alguns poucos membros corajosos da justiça, os paladinos da ética, a farra não só teria acabado, mas também a carreira judicial da magistratura já poderia ter entrado em rota de extinção; no barato entregue nas mãos de quadrilheiros, ladrões e usurpadores da carreira pública.
A fixação do teto constitucional da remuneração dos servidores públicos já causou muita controvérsia jurídica e motivou atos ilegítimos que tiveram seus efeitos suspensos pelo Supremo Tribunal Federal, até que viesse lei formalmente constitucional, conforme previsão do artigo 48, XV, da Constituição de 1988.
O novo teto do funcionalismo federal hoje é de R$ 26.723,13; assim sendo e já valendo agora esta ordenança jurídica formal, um Ministro do STF pode ganhar até este teto; um Ministro do STJ e análogos como o TST podem ganhar até R$ 25.386,97 e um Juiz Federal pode ganhar até R$ 24.117,62; os juízes substitutos podem ganhar até R$ 21.766,15. Lembre-se que os salários são maravilhosos e muito acima da maioria dos funcionários públicos comuns, mas os descontos que são aplicados sobre destes valores também são enormes.
Os juízes federais estão reivindicando um reajuste de 14,79% a título de reposição as perdas com a inflação; muita gente pode também imaginar que eles queiram ganhar 27.684,61, mas na verdade eles querem deixar de ganhar o valor líquido de R$ 12 mil, porque é basicamente isso que muitos juízes federais ganham e eu posso afirmar com todas as letras e números. Alguns que foram aposentados de forma proporcional, não importando o motivo da jubilação, não chegam a receber R$ 6 mil por mês!
Ninguém tem que ter “peninha” dos juízes e não é este o motivo deste artigo. Esquecendo tudo aquilo que eu fui e sou hoje, sincera e honestamente eu acredito que aqui, dentre os grandes e emergentes, se paga os menores salários de uma carreira de magistratura do mundo, principalmente se pensarmos no que esta gente tem que trabalhar e decidir.
Dizem que quem tem 1 milhão de Reais é milionário; um juiz federal em meados de carreira, se não for desonesto e poupar tudo que ganha ficará “milionário” após ter trabalhado pelo período superior a 83 meses ou quase 7 anos seguidos. Um diretor de empresa varejista de grande porte ganha pelo menos 3 vezes mais do que um juiz. Neste caso se conclui que os honestos ainda acreditam na carreira apenas por ideologia e crendice que o Brasil justo é um país muito melhor. 80% dos estudantes de direito de quem tenho contato cotidiano me dizem que pretendem ingressar na carreira da magistratura, acreditem, por causa da estabilidade. Se os 20% restante forem de homens probos e honestos, teremos uma chance mínima de não enxergarmos em breve a maior bagunça jurídica desta nação!
O juiz federal Gabriel Wedy afirmou num relato dramático que conhece muitos juízes que chegam a ganhar perto de ZERO no final do mês devido a tantos descontos. Gabriel é o Presidente da AJUFE (Associação dos Juízes Federais). Ele também acusa o Legislativo de tratar o Judiciário de forma discriminatória e também ameaça uma greve geral do judiciário federal caso o Legislativo não submeta a reivindicação de 14,79% de reajuste a injunção do orçamento federal de 2012.
No Brasil os poderes são independentes, mas o caixa é um só e este é administrado pelo Executivo após explanação e ordenação do Legislativo. O Planalto arrecada, administra e repassa para os outros poderes e estes somente esperam por aquilo que deveria ser constitucional. Apenas por modo comparativo, meramente sem pretender me aproveitar do critério da alegoria, enquanto um Juiz recebe o valor líquido de R$ 12 mil para trabalhar de segunda a sexta-feira, um Senador recebe R$ 16,8 mil de salário + R$ 3,8 mil por auxílio moradia + ½ tanque de combustível por dia + carro oficial + R$ 15 mil de verba indenizatória + passagens aéreas e mais as verbas por seções extras; somando tudo, o salário de um Senador ao final do mês é de mais de R$ 50 mil, para trabalhar de terça a quinta e ter três férias por ano. Depois disso alguém pode dizer que um juiz ganha muito?
Ninguém imagina o que se passa num gabinete de um juiz; ninguém imagina as pressões e os caminhos que alguém precisa percorrer entre querer ser, ser e permanecer a frente de uma bancada decidindo pelo custeamento das coisas e das pessoas. Todos só pensam em distintivos lustrados que eu jamais vi um juiz usando; pensam nas carteiras que abrem portas e mandam em tudo e que a maioria sequer as possui; as pessoas pensam que juízes andam em carros blindados cheios de seguranças armados até os dentes e que vivem em mansões que mais parecem palácios. Muitos sim usam e fazem isso tudo, mas com certeza NÃO PODE SER COM OS SALÁRIOS QUE RECEBEM.
Juiz que veio de baixo e que possui caráter e probidade se desejar morar bem e dirigir um carro razoável precisa obrigatoriamente cair num financiamento. O juiz honesto que pretende viajar com a família para o exterior, vai precisar também parcelar as despesas no cartão de crédito e se quiser ver os filhos em boas escolas, com certeza precisará barganhar com os amigos uma bolsa. Repito que muitos podem fazer tudo isso sem as veredas do parcelamento, mas com certeza não será com seus salários.
É sempre bom lembrar também que muitos juízes vêm de famílias abastadas e tradicionais; muitos possuem empresas de família. A carreira é linda e inquestionavelmente prazerosa para alguns muitos, mas também há que se apontarem os casos pouco discutidos, como o de Rocha Matos, que ficou mais tempo preso do que muitos traficantes e latrocidas e que saiu sem emprego, sem renda, sem dignidade e quase sem mais nada; e que era um juiz federal!
No final de tudo e que sirva para as futuras gerações de magistrados, que esta carreira é belíssima, sem a menor dúvida; mas que coloca sempre em provações aqueles que entram por entrar, paga menos do que merecia e ainda podem ocorrer casos aziagos e intimidáveis como o da Juíza fluminense Patrícia Acioli, morta com 21 tiros apenas porque cumpria com sua missão, ao que se sabe, com recato e consagração!
Assim como povo que não conhece sua história está condenado a repeti-la; o povo que não sabe nada ou não conhece sua justiça está condenado por antecipação a viver completamente isolado dela...
Carlos Henrique Mascarenhas Pires é editor do Blog www.irregular.com.br