Nas explicitações de Darcy Ribeiro, os mamelucos (paulistas) ou brasilíndios foram os herdeiros diretos de todo o conhecimento indígena e, por isso, totalmente adaptados à tropicalidade da floresta brasileira; ganhavam a vida perseguindo os brasilianos (indígenas) moradores da floresta ou das reduções jesuíticas, sendo soldados defensores das vilas, capturando negros fugitivos da escravidão portuguesa; posteriormente, tornaram-se especializados artesãos nos engenhos de cana, fizeram-se vaqueiros nas áreas pastoris, trabalharam de carreiros e de tropeiros, foram remeiros nos transportes por terra e fluviais, tornaram-se agregados e meeiros, foram feirantes na condição de livres trabalhadores.
Curioso foi o modo típico mameluco de se comportar em suas “entradas” nas matas à caça por homens brasilianos (indígenas) para escravizá-los:
-andavam descalços ou usavam sandálias feitas com palhas trançadas ou folhas;
-andavam em filas, aproveitando ou fazendo trilhas e sendas;
-carregavam nos ombros as suas cargas;
-compunham sua vestimenta o esculpil e o gibão acolchoado de algodão;
-adotaram os métodos indígenas de cura e de cuidado, utilizando-se do conhecimento nativo que possuíam sobre plantas, ervas e raízes;
-cultivavam superstições e crendices, particularmente confiando em orações que amarravam em cordões e em amuletos. Nesse contexto de superstições e crendices, existe no Brasil uma etnocultura indígeno-mameluco ou indígeno-brasilíndia anterior à chamada etnocultura afrobrasileira; aliás, a cultura indígeno-brasilíndia foi o protótipo, a argamassa constituidora da cultura afrobrasileira.
Ao fazerem ao caldeamento da etnocultura indígena, incluindo-se naquele caldeamento a própria deturpação da mesma, existem alguns traços típicos do caráter sertanista mameluco, brasilíndios também chamados “bandeirantes”: brutalidade, desumanidade, vingativos, oportunistas, rusticidade, flexibilidade de caráter segundo as circunstâncias, rejeitados pelo pai (português) e desidentificados com a mãe (indígena), assaltantes e assassinos profissionais, hipócritas. Deles desenvolveu-se no século XVII a figura ou a "profissão" de capitão mato, dos jagunços – ainda existentes no século XXI e cuja elaboração sofisticada estão nas milícias e nos seguranças particulares.
Capitão do mato, às vezes, era um escravo liberto que ganhava o "posto" de capturador de negros fugidos; por isso, aqueles negros achavam-se em ascensão social distinta dos seus irmãos negros. Por exemplo, o cognominado patriarca do exército brasileiro, Henrique Dias foi um capitão do mato por cuja brutalidade dezenas de quilombos foram destruídos.
Se a etnocultura brasiliana honrava-se de sua identidade étnica, brasilíndios e negros forjaram seu caráter na ausência, na falta ou na extinção de identidade étnica: aqui origina-se uma das condições dimensionais da etnocultura do brasileiro de ser um cultor do não cuidado de seu próprio povo, de seu país.
Vivencialmente, esta é a significação étnica da antropofagia: um povo que se autodevora, destruidor do próprio território em que nasce e vive. Essa antropofagia étnica está vigente no século XXI e é a base da suposta democracia racial dos povos brasileiros.