Pra não dizer que não falei das flores*

Artigo publicado no Portal Camaçari Agora, em 16/02/2011: http://www.camacariagora.com.br/colunista.php?cod_colunista=17

Volta e meia meu tom, aqui nesta coluna, fica um pouco áspero, confesso. É que a indignação percorre minhas veias e estas explodem através das palavras. Não posso controlar. Apenas permito que estas saiam como se fora uma tormenta que traz a água necessária para lavarmos a alma.

Outro dia estava ouvindo (aliás, todos os dias ouço!) o grande poeta Gonzaguinha, uma das vozes de protesto contra a ditadura militar que manchou a democracia brasileira no período de 1964 a 1985. Até mesmo ele, que transformou toda sua indignação, em poesias fortes e cheias de animosidade, despertou certo dia e compôs uma das obras primas do nosso cancioneiro popular: “O que é? O que é?”. Lembrei-me, então, de algumas pessoas que se “queixam” dos meus textos por sempre, segundo elas, ter um tom de protesto. A estas, digo que as flores estão presentes em mim, desde as orquídeas da chapada do Aporá, as quais eu apreciava nos finais das tardes ensolaradas, ainda quando criança, juntamente com meu saudoso tio Evanjo, até as matas sofridas da minha Camaçari choradeira.

Sim, pessoal, o homem é matéria, é uma vida, é “uma gota no mundo”. Ele trabalha e quer ascender profissionalmente: quer “ter”. Mas eu vos pergunto: e onde estão as flores? Em dias atuais, os jardins mal são regados. Já não importa a leveza do ser simplesmente humano. O amor, então, entra constantemente em conflito com o “ter” desvairado. Flores, amigos, precisamos que os perfumes florais aromatizem as nossas vidas e nos direcione num caminho de pedra, muito mais selvagem que as savanas africanas.

Flores, poesias e protestos. O ser humano tem a capacidade, que o distingue dos outros animais, de ser um turbilhão de sentimentos. Não podemos ser apenas luta, força do braço, temos que ser amor, sentido e “penetrado”! Ser apenas mais um na multidão não é legal e fere o princípio de comunidade. Afinal, sorrir dá muito mais prazer quando sorrimos juntos, já perceberam isso? Todavia, para sorrir em conjunto é necessário trabalharmos para o bem comum, e não apenas para ampliarmos os nossos muros.

O Apóstolo Paulo estava certo, é preciso voltar a ser criança, assim podemos sorrir em meio às flores, brincando na inocência peculiar delas e em jardins impecáveis – Difícil missão do ser, anestesiado pelo ter!

Voltemos aos jardins, não sucumbamos aos caprichos materialistas. Plantemos flores no coração e iremos colher sorrisos de felicidade... “Somos nós que fazemos a vida”, pessoal. Nós pautamos as nossas prioridades e estabelecemos as nossas metas. A vida é ocupar-se de vivê-la, ou de morrer nela mesma, onde muitos, temos que concordar, já vivem uma vida morta.

Plantem perfumes em vosso peito, respirem sentimentos, sorriam brisas. Extrapolem o sentido físico e se permitam estar além do que nos impõe o nosso vil estado da razão. Ouçam a voz da alma que clama luz, poesia e amor, mas não se furtem de importar-se com a criação divina. Não se esqueçam de ser muito mais que mente positiva. Sejam, acima de tudo, vozes ativas em nossa sociedade.

“Seja sempre o sorriso de uma pequena criança em ‘nós’” **.

Salve,

Caio Marcel Simões Souza (crenteregional@gmail.com) é Administrador de Empresas e formado em Capoeira Regional, pelo Grupo de Capoeira Regional Porto da Barra. Também é responsável e mantenedor do Projeto Social Crianças Cabeludas, no bairro do Parque das Mangabas, Camaçari.

* Título do artigo em referência à música “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré.

** Citação da música “Pessoa”, de Luiz Gonzaga Junior.