Psicopedagogia Institucional, Educação Corporativa e Organizações Aprendentes: o desenvolvimento humano como desafio.
Psicopedagogia Institucional, Educação Corporativa e Organizações Aprendentes: o desenvolvimento humano como desafio.
Prof. MS. João Beauclair
Publicado originalmente na Revista Direcional Escolas, setembro, 2006
Em artigo aqui anteriormente publicado 1, afirmei que é preciso criar condições favoráveis à autonomia das pessoas: competências e habilidades só podem ser desenvolvidas em condições de aprendizagem facilitadoras. Ao longo de minha trajetória como educador, consultor e psicopedagogo institucional, desenvolvendo projetos e trabalhos em instituições que se preocupam com o seu cotidiano e que buscam, a partir de movimentos de formação continuada, - rever trajetórias, reescrever percursos e mudar o rumo de suas vivências objetivando uma maior qualificação de todos os que dela fazem parte-, percebo que este é o caminhar necessário para a melhoria das relações interpessoais no espaço do mundo do trabalho: investir na capacitação e na gestão de pessoas 2 .
Cada vez fica mais claro que, na atualidade, a instituição que visa melhorar suas qualidades e seus serviços, necessariamente deve se inscrever num processo de continuidade no que concerne à formação permanente e ao desenvolvimento humano de seus integrantes. A Psicopedagogia Institucional possui elementos que podem contribuir quando o que se deseja é a mudança de olhares, a reflexão sobre o que se está vivenciando, enfim, pode ser de grande valia ao progresso e a evolução dos que pretendem se mover neste sentido.
Dias atrás, numa aula que estava ministrando sobre Fundamentos da Psicopedagogia, tive a idéia de perguntar para um pequeno grupo de alunas sobre quais eram os seus objetivos, ao estarem fazendo sua formação no campo psicopedagógico. Meu intuito era o de perceber, enquanto ensinante, quais eram as intencionalidades ali presentes, no campo do desejo de cada aprendente.
As respostas foram as mais variadas possíveis, é claro, mas uma delas me chamou especial atenção: - Professor, meu desejo é o de poder olhar para a escola onde estou atuando faz tempo, me posicionando de uma forma mais equilibrada, clara e, também, colaborativa.
Tal resposta, sem menosprezar as outras que também tinham variáveis interessantes, me fez refletir sobre a complexidade humana do “estarjuntocom”. O maior desafio humano que reside em nossas cotidianidades é este: agraciar, nos espaços onde estamos inseridos, o espírito da colaboração, da união, da parceria, da cooperação, da solidariedade, modos únicos e possíveis de dar novas roupagens ao convívio com os outros e com a imensa diversidade humana.
Afirmo isso por ter a noção humana deste imenso desafio que é a melhoria da qualidade de vida de todos nós. Ambientes onde a gestão ainda está focada no âmbito do autoritarismo e não da autoridade, (como nos ensina James Hunter em seu fascinante livro, O monge e o executivo) 3 , impedem tal evolução, pois o modelo predominante reside na competitividade e não na cooperação. Urge buscar, no espaçotempo institucional, a criação de novos paradigmas que construam novos significados à aventura humana da sobrevivência e da convivialidade.
Temos, no campo psicopedagógico institucional, elementos que são constitutivos deste paradigma, principalmente se nossos olhares estiverem voltados à busca por valores humanos universais, como o de ser solidário e de estar em movimentos preocupados com o todo, e não apenas com nossas individualidades. Avançamos enquanto humanos a partir do momento que cultivamos o espírito da gratidão e da validação do que os outros fazem e que, no exercício de nossa complexa sobrevivência, nos auxiliam a irmos adiante.
A família, a escola, o trabalho são partes importantes de nossas vidas e para cada uma dessas partes necessitamos dar especial atenção, cultivando o movimento de manifestar nosso apreço para com os que estão conosco nesta trajetória, que é a própria vida. Na evolução de nossos conhecimentos, sabemos hoje que vivemos na sociedade da informação, ou melhor, explicitando, na sociedade do excesso de informação circulante.
Ao acessar a internet, por exemplo, e entrarmos num site de busca e digitarmos qualquer palavra ou conceito que tenhamos curiosidade de procurar, podemos observar quantas informações existem, dispersas no cyberspace. Entretanto, tal excesso de informação necessariamente não leva ao conhecimento e a sabedoria, pois estes dois processos necessitam de uma estruturação que é diferente do simples uso da informação. Informação nem sempre é sinônimo de conhecimento, de sabedoria, principalmente porque isso depende do uso que dela fazemos.
É preciso que a informação faça e tenha sentido, crie campos semânticos válidos, para que sua apropriação gere o desejo de conhecer, de saber mais, de adquirirmos competências mais solidárias 4 . É no campo do desejo humano que todo o uso das informações a que temos acesso ganham significado. Frente ao novo, que relações estabelecemos para ganharmos competências e
habilidades? 5
Neste movimento, podemos desenvolver condições de aprendizagem que sejam facilitadoras de processos de crescimento que emergem das próprias relações que estabelecemos nos espaços institucionais onde interagimos. Para tal, a Educação Corporativa deve ser vista como um investimento a médio e longo prazo, que necessita ser incentivado e com a presença de profissionais que possam fornecer subsídios teóricos e metodológicos, além de estratégias de gestão que sejam apropriadas, adequadas a cada realidade.
Um erro que ocorre com freqüência é a tomada de decisão de se fazer transposições de experiências bem sucedidas, que ocorreram num determinado espaço, sem a devida adequação institucional, pois isso gera o insucesso de tais empreitadas. Cada instituição é única e seu perfil se constitui nesta unicidade, visto que sua configuração também é única, peculiar, singular enfim.
Ao psicopedagogo engajado neste fazer, cabe a tarefa de fazer um bom diagnóstico psicopedagógico institucional e investigar com maestria os pontos onde podem estar ocorrendo “problemas” ou, ainda, ao observar o que acontece no cotidiano, perceber os possíveis ruídos comunicacionais existentes nas relações entre as pessoas que ali atuam, no mover diário dos que agem neste tempo e integram este espaço.
Vivenciamos, nesta tarefa, imensos desafios, pois as diferentes facetas de nossas vidas na contemporaneidade, exigem a criação de novas possibilidades de estarmos atuando no sentido aqui expresso: colaborar à construção de novos modos de ser e estar nos diferentes espaços institucionais onde interagimos é renovar forças e energias e acreditar, de modo permanente, nas potencialidades presentes nas pessoas.
Neste movimento, a Psicopedagogia Institucional é aberta ao novo e acredita na imensa capacidade presentificada nos processos de mudança. A busca por novos paradigmas vinculados às relações interpessoais emerge no exercício constante de vislumbrarmos outras possibilidades, onde a inovação e a criação de outras estratégias de ação possam ampliar nossas consciências, por vezes adormecidas e indiferentes ao complexo viver que todos nós, e cada um a seu modo, enfrentamos em nossas diárias e rotineiras vivências.
As iniciativas de formação continuada em prol do desenvolvimento humano nos espaços e tempos das instituições fazem com que surjam novas cores e matizes na paleta do cotidiano e são agentes de melhorias das ações desenvolvidas por todos que nelas atuam.
Vale apostar nisso! Os resultados com certeza serão compensadores, pois afinal, quem não quer melhorar a vida e ganhar mais qualidade nos relacionamentos?
REFERÊNCIAS:
1 BEAUCLAIR, João. Psicopedagogia Institucional e Gestão Educacional: desafios atuais. São Paulo: Revista Direcional Escolas. Ano 1, Edição 11: Dezembro, 2005.
2 BEAUCLAIR, João. O que aprende quem ensina? Navegando em redes, revendo trajetórias, construindo outros roteiros. Trabalho apresentado no Congresso Internacional Cotidiano Diálogos sobre Diálogos, promovido pelo GRUPALFA-UFF, na Faculdade de Educação da UFF - Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2005.
3 HUNTER, James C. O monge e o executivo: uma história sobre a essência da liderança Rio de Janeiro: Sextante, 2004.
4 Para esta questão, leitura essencial: ASSMANN, Hugo e SUNG, Jung Mo. Competência e sensibilidade solidária. Petrópolis: Vozes, 2001.
5 BEAUCLAIR, João. Psicopedagogia: trabalhando competências, criando habilidades. Coleção Olhar Psicopedagógico. Rio de Janeiro: WAK, 2004.(esgotado, no prelo segunda edição)
PARA SABER MAIS:
NEVES, Siloé Pereira. Aprendizagem, vínculo e comunicação. In: MAZZINI, Elcie F. Salzano (org). O ato de aprender. I Ciclo de Estudos de Psicopedagogia Mackenzie. São Paulo: Mennon/Mackenzie, 1999.
SENGE, Peter. A Quinta Disciplina: arte e prática da organização que aprende. São Paulo: Best Seller, 1998.
DICA DE SITES:
1-
Vale a pena conferir o site da Associação Brasileira de Psicopedagogia, pois nele estão importantes informações sobre o campo de atuação do psicopedagogo: www.abpp.com.br
2-
Já referência latino-americana no que diz respeito a Psicopedagogia, Educação e Saúde, o site coordenado pela psicopedagogo Maria Alice Pinto, www.psicopedagogiaonline.com.br possui um acervo magnífico de artigos, entrevistas e resenhas. Essencial, principalmente, para os que estão iniciando leituras no campo psicopedagógico.