Seria Votorantim o berço do futebol brasileiro?
Seria Votorantim o berço do futebol brasileiro?
João dos Santos Júnior
O advogado e jornalista João dos Santos Júnior, sessenta e dois anos, 25 dos quais dedicados a pesquisa do futebol, na cidade de Votorantim, estado de São Paulo, distante 98 km da capital, afirma que o futebol brasileiro começou naquela cidade em meados de 1.891. Em seu livro intitulado “Votorantim - História e Iconografia de uma cidade” - 169 páginas, lançado pela editora OTTONI, em 2004, em sua primeira edição, relata com riqueza de detalhes às fls 75 até as fls 93, de como o futebol trazido por ingleses teve o seu começo na então vila de Votorantim, pertencente na época a cidade de Sorocaba.
O pesquisador teve de pesquisar durante muito tempo junto às bibliotecas, não só brasileiras, como também junto as associações italianas, inclusive com ingleses principalmente com o importante pesquisador John R. Mills que em seu livro “Charles Willian Miller, 1894 *1994”, escreveu sobre a saga do pequenino inglês apelidado de “Niper”, que teria em 1894 introduzido o futebol no Brasil.
O pesquisador que se ateve no mérito de dar a sua cidade o importante título de primeiro praticante do futebol, também não deixa por menos quando relata no livro que em Votorantim, nasceram os dois primeiros times de futebol, exclusivamente para prática do esporte bretão: O votorantim Atlhetic Club e o Sport Club Savoia, este em homenagem ao Rei Umberto I, na casa de Savoia.
As evidências do autor do livro ainda não foram contestadas, mesmo porque o livro foi lançado recentemente é apenas de interesse da cidade da região, não alcançando ainda o nível nacional, que se pretendia dar. Mas se depender do autor, novo livro deverá ser lançado ainda este ano, mais amplo e com mais histórias evidentes, principalmente com documentos para comprovar o que o autor pretende, que é a prova definitiva, no seu entender, que Votorantim realmente é pioneiro na história do futebol brasileiro. Para corroborar com as suas afirmações, João dos Santos Júnior está apresentando para a divulgação na internet, um resumo de seu trabalho, para que todos aqueles que gostam de futebol possam tirar conclusões que venham alicerçar o histórico do futebol nacional com esta verdadeira bomba que é o título de nossa entrevista, seria Votorantim o berço do futebol brasileiro?
Veja o texto do livro e se intere no completo relato do fabuloso futebol que foi praticado em Votorantim por inglêses e por italianos que residiam e trabalhavam em uma das pioneiras indústrias do ramo têxtil naquela cidade do sudoeste do Brasil.
FUTEBOL: VOTORANTIM FOI PIONEIRO
Ingleses em 1891 introduziram o futebol em Votorantim. Italianos fundarão o Savoia em 1900 em homenagem ao Rei Humberto I.
A Introdução do futebol no Brasil é atribuída a Charles William Miller 1874 * 1953 - que teria voltado da Inglaterra com um livro de regras do Association Football, duas camisas, - do Banister e do St. Mary’s, - duas bolas de futebol, um par de chuteiras e uma bomba para encher as bolas. Miller vinha de Soutampton, um dos principais portos da Inglaterra, no Condado de Hampshire, depois de terminar seus estudos no Banister Court Scholl, escola tradicional e que tinha em seu curriculum a prática dos esportes. Em 1884, data em que marca a volta de Charles Miller a São Paulo, cidade que tinha aproximadamente 250.000 habitantes - sendo uma parte delas de italianos - neste clima que o pequeno Miller, apelidado de “Niper”, pela sua baixa estatura, nascido paulistano, iniciou a sua missão de integrar o futebol, como o mais novo esporte nas lides esportivas.
Há que se fazer um preâmbulo para poder entender, neste contexto, como se fez o caminho da bola no país. A bem da verdade, vários historiadores se opõem à tese da introdução do futebol por intermédio de Charles Miller. Alguns, como o historiador José Moraes dos Santos Neto - professor da PUC de Campinas e autor do livro “Visão do Jogo: - Primórdios do Futebol no Brasil” - relata que o esporte já era praticado no Brasil alguns anos antes. Cita como exemplo os Arquivos do Colégio São Luís de Itu, do D. Pedro II e do Petrópolis, como exemplo que indica que o futebol fazia parte do planejamento anual das instituições pelo menos cinco anos antes do retorno de Miller ao Brasil.
Esta tese do ilustre professor não pode ser descartada e tampouco relegada a um segundo plano, pois temos pesquisado exaustivamente por mais de 20 anos e conseguimos levantar dados que comprovam que o “Esporte Bretão” foi praticado em várias frentes, não só nos colégios, como também nas fábricas pioneiras em São Paulo, nos portos de diversas cidades brasileiras e ao longo das ferrovias paulistas, isto antes do retorno de Miller ao Brasil. Também, o que precisa ser distinguido são as formas da prática do jogo de bola como “football association”. O futebol praticado pelos seguidores de Miller era o “dribling games”, ou seja, o jogo de dribles, muito difundido entre os paulistanos da capital. O futebol era praticado pelos marinheiros que aqui aportaram; estes faziam do novo esporte uma competição de lazer, sem se importar com as regras e contagem de tentos marcados, e eram praticados como “passing games”. Já nos colégios, a prática do futebol era preparatória para o condicionamento físico e de competição, sem regras definidas. No caso das ferrovias, o futebol foi introduzido pelos ingleses ao longo das estradas de ferro do interior paulista como recreação. Mas foi nas fábricas de tecidos que a prática do futebol foi mais desenvolvida pela necessidade de recreação dos operários, que na época viviam em vilas operárias mantidas pelas indústrias, e conseqüentemente, sob ordens da gerência e com normas ditadas pelos donos das fábricas, sendo uma das regras básicas, o regulamento de lazer dos operários, que neste contexto, disputavam competições entre si, ou seja, em equipes, com regras aplicadas do futebol trazidas por herança dos ingleses.
John Mills, em seu livro que trata da Memória do S.P.A.C. e Charle William Miller 1894 * 1994, relata que Miller imaginou que pelo menos alguns britânicos residentes em São Paulo deveriam conhecer o futebol. Sabe-se que conheciam e tinham ouvido falar, mas estavam demais apegados ao críquete para se lançarem a outro esporte. Não só o críquete mas também o rugby eram os esportes preferidos dos ingleses.
Antonio Figueiredo, colunista que nos legou “A história do Futebol em São Paulo”, bem como o jornalista Leopoldo Sant’ana, em seu livro “Supremacia e Decadência do Futebol Paulista”, e também Paulo Várzea, renomado desportista, são unânimes em afirmar queCharles Miller foi o introdutor do futebol no Brasil. Afirmam que de vez em quando, algumas décadas atrás, alguns desavisados opinavam que já havia futebol antes de 1894. Figueiredo vai mais longe e explica que esse fato da fundação do futebol já foi pesquisado, debatido e comprovado, que antes de Miller “poderia ter havido bolas, mas não existia futebol”.
Estas afirmações são contrárias a nossa tese. As fábricas de tecidos no início da última década do século XVIII, foram fundadas por ingleses, principalmente a fábrica de tecidos do Banco União, fundada na antiga vila de Votorantim, pertencente à cidade de Sorocaba. Esta empresa começou a edificar a fábrica, - diga-se de passagem toda ela em estilo inglês, - sob as ordens dos ingleses de Manchester que iniciaram as obras em 1891, três anos antes da vinda de Charles Miller, introduzindo o esporte bretão na vila, e conseqüentemente desenvolveram o futebol com regras regidas pelo football association.
O modelo industrial inglês também presidiu o início da industrialização no Brasil, quando, por volta de 1860, em razão da crise algodoeira norte-americana, a cidade de Manchester forneceu orientação primordial para o cultivo do produto das localidades de Itu, Sorocaba e Votorantim. Não obstante o ciclo efêmero que declinou já em 1870, o setor têxtil conheceu a expansão no contexto cafeeiro, por isso, a demanda de juta para sacaria determinou a criação de várias indústrias para esse promissor mercado. O maquinário inglês, sobre tudo as famosas máquinas da Platt’s, foi a base da produção no interior de São Paulo. Surgiu o parque industrial paulista, marcado pelo modelo britâncio, seja quanto à arquitetura dos estabelecimentos - as tradicionais fábricas manchesterianas de tijolos vermelhos - e quanto à coordenação do trabalho, onde a construção de Vilas Operárias e das casas de diretores eram a rigor no mais puro estilo inglês.
A presença de muitos ingleses em Votorantim, inclusive de John e Willian Snapp, que em todas pesquisas aparecem como fundadores e praticantes do futebol, inclusive como árbitros, no final da década de 1800, e como do sorocabano Alício de Carvalho, que também era da Associação Atlética Mackenzie, que foi um dos fundadores da Liga Paulista de Futebol, merecem ser destacados para confirmar que o futebol já estava presente entre nós antes do início do século XX.
Os ingleses que vieram a Votorantim foram introdutores da bola no Brasil, isto em 1891. O primeiro “team” inglês foi o Votorantim Athletic Club, nascido em 1891 e fundado em 01 de janeiro de 1900. Portanto, há que se fazer uma revisão na história do futebol para que fique comprovada a paternidade de Charles Miller como introdutor da bola em São Paulo, e que se comprove e se aceite que o futebol praticado em equipe, com as regras inglesas, nasceu em Votorantim: “Berço do Futebol Brasileiro”.
VOTORANTIM ATLHETIC CLUB
Os ingleses chegaram à Votorantim no ano de 1891, para construir uma fábrica de tecidos pertencente ao Banco União de São Paulo S/A. Foram contratados técnicos ingleses especialistas na área têxtil; esses técnicos vieram para trabalhar na montagem da indústria com tempo determinado. Sabe-se que os ingleses aqui estavam com mulheres e filhos, tinham data marcada para o retorno a sua terra de origem. Inicialmente as acomodações foram em Sorocaba, enquanto não ficava pronto o local de moradia na vila de Votorantim. Era num casarão, no bairro da Barra Funda, que ficou conhecido pela população como “Casarão dos Ingleses”.
O futebol já estava difundido em toda a Inglaterra. Era o esporte do momento. Os ingleses usaram o futebol, em Votorantim, para a recreação; na época não existia condições para que os europeus pudessem participar das modalidades esportivas, como aquelas que eram praticadas em seus países, como o “rugby”, “tênis”, “badminton”, “cricket”, e outras modalidades, principalmente o “rugby”, esporte que mais se praticava na capital de São Paulo pelos ingleses, que já estavam entre nós desde a abdicação de Dom Pedro I, em abril de 1843. Dom Pedro II, ainda criança, ascendeu ao Trono Imperial. Pode-se dizer que naquela ano iniciava-se o “Século Britânico”, com a nossa revolução industrial.
Em São Paulo os primeiros esportistas de que se tem conhecimento foram os funcionários da São Paulo Railway, que chegando da Inglaterra, traziam os esportes que lá praticavam, sendo naquela época o jogo de “Cricket” o mais popular.
Como o serviço regular de navios entre o Brasil e a Grã Bretanha, a partir de 1851, se tornara mais constante com a Royal Mail Steam Packet CO Ltda., mais conhecida pelos brasileiros como “Mala Real Inglesa”, seus inúmeros navios traziam gente nova das distantes cidades de Southampton e Liverpool que foram os primeiros aqui a se estabelecerem.
Os ingleses tinham um grupo grande e entusiasta de esportistas que pretendiam fazer eventos sociais para se aglutinarem em sociedade, e viram a necessidade de fundar um clube para a prática dos esportes, principalmente para o críquete. Assim, no dia em que a princesa Isabel decretava a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, um grupo de britânicos se reunia num bar da rua de São Bento para fundar o SÃO PAULO ATHLETIC CLUB, mais conhecido como SPAC, tendo como fundador e seu primeiro presidente Willian Snapp, que em 1º de janeiro de 1900, também fundou o VOTORANTIM ATHLETIC CLUB, no antigo distrito de Votorantim.
Em Votorantim, antes dos ingleses de São Paulo, vieram os de Manchester a partir de 1891, portanto três anos depois da fundação do primeiro clube de São Paulo, e que ainda não praticavam somente futebol; trouxeram bolas e chuteiras, que mais pareciam uma botina. A bola era de “tento”, ou seja era de couro de boi, com uma abertura para a colocação de uma “bexiga”, que posteriormente era fechada com um laço de couro; tinha uma aspecto marrom por causa do couro cru, ficava depois de cheia um tanto deformada, quase oval. Isto não impedia que os ingleses fizessem do futebol o seu esporte predileto na cidade de Votorantim.
Após o início como recreação, os ingleses passaram também a usar o futebol como condicionamento físico. Em seguida usaram uma área em frente à fábrica, mais precisamente onde hoje é a rua Bernardino de Campos, para fazer um campo de futebol; a área era um brejo que os ingleses aterraram.
Inicialmente formou-se um time de futebol dos poucos e sisudos ingleses que aqui estavam, e os alegres e fortes italianos, na sua maioria vindos do norte da Itália. Surgiu o convite para que os italianos passassem a praticar com os ingleses um novo esporte que era baseado nas regras do “football association”, mas não era o “rugby”, e também não tinham as regras do “calcio” italiano, o esporte era conhecido como “football”, ou “soccer”, jogado desde 1863 na Inglaterra.
Os ingleses tinham preferência para jogar com os italianos por um motivo muito simples, os “oriundis” eram europeus como eles, e embora existissem no local pessoas que os prestigiassem, também já estavam praticando este esporte. Ficaram à margem da prática do futebol. Negros e cablocos e alguns poucos imigrantes de outras raças, eram discriminados pelos europeus por não praticarem o esporte bretão. Assim, realizavam suas peladas em pequenos espaços gramados e somente a partir do início do século XX é que conseguiram entrar em associações e clubes já constituídos, principalmente na capital. Em Votorantim, além das dificuldades já mencionadas, existia a proibição da gerência da fábrica de tecidos que terminantemente não permitia quaisquer atividades, fosse esportiva ou cultural, sem a autorização dos proprietários da fábrica. Somente o Votorantim Athletic Club estava autorizado a praticar o esporte bretão como o time oficial da fábrica.
Ingleses de São Paulo também jogavam contra os seus conterrâneos de Votorantim, Willian Snapp e John Snapp, além de praticarem o futebol, também tinham cargos diretivos em clubes de São Paulo. Em Votorantim, jogava-se em recintos fechados, sabe-se que a área da fábrica era fechada por uma porteira, daí o apelido dado à vila de Votorantim de “Fazendinha”.
A partir de 1898, mais italianos chegaram para morar em Votorantim, muitos deles aderiram ao futebol. Sabe-se que mais de quatro times de italianos foram montados. Os ingleses continuavam com a supremacia do futebol em Votorantim.
A medida que a colônia italiana crescia, mais o futebol se desenvolvia em Votorantim. Os ingleses começaram a enxertar o primeiro time da fábrica com alguns italianos que se destacavam nos times inferiores.
No final de 1899, os ingleses sentiram a necessidade de melhor se organizar para disputar competições com as equipes recém fundadas em São Paulo. Com o aval da fábrica de tecidos, os ingleses, em homenagem ao distrito, fundaram o Votorantim Athletic Club no dia 1º de janeiro de 1900. Os italianos que tinham um time de futebol e não eram reconhecidos pela gerência da fábrica, eram esperados “sparing”, para os ingleses. No mesmo dia, local diferente, dentro do campo de jogo, fundaram o Sport Club Savoia, em homenagem ao rei Umberto I, usando os uniformes nas cores azul e branco da Casa de Savoia. Os ingleses se reuniram solenemente no casarão da Barra Funda para fundar aquele que seria o primeiro time do interior de São Paulo e o primeiro time do Brasil a praticar o football association. Os pioneiros no esporte em São Paulo não praticavam o futebol. O jornal “O Estado de São Paulo”, um periódico com boa circulação em São Paulo, colocou uma nota que, à guisa de conhecimento da história do São Paulo Athletic Club, publicou a seguinte nota: “No dia 12 de outubro próximo deve realizar este club uma de suas esplêndidas festas, que constará com corridas a pé, de velocípedes e diversos jogos athléticos, sendo conferidos prêmios aos vencedores de cada corrida. A inscrição acha-se aberta na casa Levy, e será encerrada no dia 30”. Outra nota no mesmo jornal, desta vez no dia 15 de agosto de 1894, diz o seguinte: “São Paulo Athletic Club”- “A Directoria deste club realiza hoje, ao meio dia, um jogo de “cricket” nos terrenos da Chácara Dulley, no qual disputaram 11 santistas contra o mesmo número de paulistas.
Enquanto estas atividades de críquete fervilhavam em São Paulo, no outro lado do Atlântico, mais precisamente no dia 12 do mês de outubro de 1894, um garoto chamado Charles William Miller retornava a São Paulo, após ter cursado seus estudos no Banister Court School em Southampton.
O Mackenzie College, escola fundada em 1896 pelos Presbiterianos dos Estados Unidos da América do Norte, teve a primazia de ser a primeira agremiação fundada por elementos brasileiros, para prática do “rugby” e o “basket-ball” e tentou introduzir estes esportes na escola. Existe uma passagem curiosa sobre os primeiros treinos de cestobol no Mackenzie, contada pelo historiador John R. Mills em seu livro Charles William Miller- 1894 * 1994. Os alunos recusavam-se terminantemente a praticar esta modalidade de esporte, preferindo usar os pés e não as mãos. O professor Augusto Shaw cansou de gritar, no pátio do colégio: “Com o pé, não. Com o pé não vale. Com a mão. Só com a mão”, portanto, o Mackenzie, não foi fundado para a prática do futebol. Augusto Shaw não pensava em lançar o futebol. Foi aí que entrou na história Alício de Carvalho, de tradicional família Sorocabana, que estudava no Mackenzie, e acabou introduzindo o futebol em Sorocaba. Em meados de dezembro de 1902, num campo recém construído na chácara Carvalho (Vila Carvalho), Alício fez realizar um jogo inaugural, fundando o Club Athletic Sorocabano, em 25 de dezembro de 1902, com destaque no jornal “15 de Novembro”, que em sua edição de 28/12 noticiou o fato com grande destaque.
Em 1897, Hans Nobiling chegou a São Paulo vindo da Alemanha onde tinha jogado futebol, e onde foi capitão do Sport Club Germânia de Hamburgo. No livro John Mills, o próprio Hans Nobiling conta como foi seu início em terra paulistana: “logo ao chegar senti falta, no clima da Paulicéia, então muito mais picante que hoje, do balão de couro. Na colônia alemã, onde naturalmente fiz minhas primeiras relações, verifiquei que meus conterrâneos mantinham-se fiéis à sua velha mania da ginástica clássica, sabedor que nos lados do Bom Retiro, havia interessados em desenvolver um esporte denominado “football”, fiz contato com Charles Miller e com outras pessoas. Conversando com o senhor Crewe, verifiquei que ali eles mantinham o jogo em circulo fechado no SPR e no Mackenzie, pela predominância da educação anglo-americana, a coisa era igual, aos que os colegiais jogavam aos sábados, como na Inglaterra”.
Nobilling, em princípio fundou um time com o seu nome tentando aglutinar adeptos do futebol, recrutando inclusive brasileiros para a prática do novo esporte. Assim nasceu o Sport Club Internacional, no dia 19 de agosto de 1899, e ainda por iniciativa do próprio Nobilling, dezenove dias após, mais precisamente em 7 de setembro de 1899, fundou o Sport Club Germânia, com o intuito de agregar adeptos dos demais esportes que eram bem aceitos ao invés do futebol, ficando assim convencionado que tinha que haver outras atividades esportivas. O futebol não era o esporte predileto nos dois novos clubes, somente desenvolveram o futebol propriamente dito, quando Antônio Casimiro da Costa, idealizou a primeira Liga de Futebol no Brasil, no estado de São Paulo, em fins de 1900.
O Futebol nasceu na Inglaterra, com regras estruturadas, em 26 de outubro de 1863, numa reunião realizada na Freemason Tavern, Great Queen Street, em Londres. Assim nasceu o “associaction football”. O “Football” e o “Rugby” são primos irmãos. Os dois nasceram na Inglaterra em meados do século 19. No futebol inglês eram onze contra onze; no “rugby” eram quinze por lado. No “football” a bola era chutada com os pés ou cabeceada; no “rugby” carregada com as mãos e, ocasionalmente, chutada, porém, sempre para frente. Os dois esportes nasceram com a mesma denominação de “football”.
No Brasil, a exemplo de São Paulo, os clubes fundados antes de 1901 não praticavam exclusivamente o futebol. Eles foram formados para praticar o “rugby” e os esportes aquáticos (regatas). Assim em São Paulo os quatros primeiros clubes nascidos antes do século 20, ou seja até 1900, quando surgiu a liga Paulista em 14 de dezembro de 1901, para disputa de seu primeiro campeonato paulista de 1902, antes praticavam uma variedade de esportes, não só coletivos, como individuais, na sua maioria incrementados nas fábricas, nos colégios e nas ferrovias pelos ingleses.
No Rio de Janeiro, o Botafogo de Futebol e Regatas foi fundado em 1892, para praticar esportes aquáticos; sua fundação oficial data de 12 de agosto de 1904, quando então passaram a praticar o futebol. O Clube de Regatas do Flamengo foi fundado em 1896, para a mesma prática do esporte que dava ao seu nome. O Clube de Regatas Vasco da Gama fundado em 1898, somente aderiu ao futebol em 1916. O primeiro clube fundado exclusivamente para a prática do futebol no Rio, foi o Fluminense Football Club, em 21 de julho de 1902.
Na Bahia, o Sport Club Vitória, foi fundado em 1899 para jogar críquete, único esporte de campo que a população de Salvador conhecia, praticado pelos ingleses da cidade. No dia 13 de maio de 1899, oficialmente, o clube passou a praticar este esporte na capital baiana. Em 1905, o Vitória foi fundado, sendo um dos fundadores da Federação Baiana de Futebol.
Nos demais estados o futebol só veio a deslanchar com a oficial fundação dos clubes que verdadeiramente praticavam o “football associaction”, fossem eles o “dribling games” ou “passing games”, em recintos fechados ou abertos, tais como os primeiros de 1900 que, conforme Thomaz Mazoni, foram os primeiros do início da década passada: Sport Club Savoia fundado em 1º de janeiro de 1900; Esporte Clube Rio Grande, fundado em 14 de julho de 1900; Associação Athética Ponte Preta, fundada em 11 de agosto de 1900, considerados os primeiros na prática do futebol, embora Savoia e o Paulistano estejam hoje desativados. O Savoia, foi sem sombra de dúvida, o primeiro time do interior de São Paulo a praticar o futebol.
O esquema de futebol adotado pelos ingleses a partir de 1880 era chamado “pirâmide”, (2-3-5), ou seja: dois zagueiros, três médios e cinco atacantes.
Embora Votorantim vivesse dias difíceis com a epidemia de febre amarela, a vida seguia regularmente, principalmente no que diz respeito à prática no esporte, já naquela época tida como benéfica para o físico e o desenvolvimento do corpo como um todo.
Houve uma paralisação no futebol a partir de meados 1900, até meados de 1902, em virtude da peste negra e da febre amarela que grassou na antiga vila de Votorantim, no Jurupará e também em Sorocaba. Os ingleses deixaram a cidade em virtude da epidemia e a maioria deles retornaram para a Inglaterra.
A paternidade no futebol brasileiro, sempre foi tema de discussão entre historiadores, embora não se negue a introdução do esporte bretão atribuída a Charles William Miller, que teria voltado da Inglaterra, em 1894, com duas bolas embaixo do braço e uniformes para os vinte e dois jogadores.
Um estudo mostra que o esporte já era praticado no Brasil alguns anos antes. José Moraes dos Santos Neto, historiador, professor da PUC de Campinas e autor do livro “Visão do Jogo- Primórdios do Futebol no Brasil”, afirma que nos arquivos do Colégio São Luís de Itu, do D. Pedro II e do Petrópolis, indicam que o futebol fazia parte do planejamento anual dessas instituições. Em Campinas, alunos do Colégio Culto à Ciência já vinham praticando o futebol desde 1897, liderados por Antonio de Oliveira, e acabaram fundando a Associação Atlética Ponte Preta, no ano de 1900.
O futebol em Votorantim foi iniciado em 1891, pelos ingleses. Talvez a falta de comunicação, difícil naquela época, impediu que se soubesse que na pequena vila de Votorantim ingleses já praticassem o futebol como um esporte, com regras próprias trazidas da Inglaterra, berço do futebol mundial. A própria cidade de Sorocaba, distante oito quilômetros de Votorantim ignorava aquilo que se passava no recinto fechado na fábrica do banco União, em relação ao esporte, desde o final da última década do século 18.
O futebol somente ganhou as manchetes nos jornais a partir de 1894, com a tentativa da introdução deste esporte em locais aberto, mas sempre como coadjuvante de outros esportes de origem inglesa, que eram praticados em colégios, introduzidos pelos padres; em cidades portuarias, introduzidos por marinheiros ingleses; pelas ferrovias, introduzidos por operários ingleses e nas fábricas introduzidos por técnicos ingleses. Conforme cita em seu livro Thomaz Mazzoni, autor do livro “História do Futebol Brasilero”, os italianos também tiveram uma grande parcela no desenvolvimento no futebol, eles que conheciam o “calcio”, uma espécie de futebol praticado na Itália. Na pequena Votorantim foram levados a jogar com os ingleses e ali desenvolveram dois tipos de futebol nas regras inglesas. O “passing games” pelos ingleses e o “dribling games”, mais afeto aos italianos pelo seu jeito descontraído e alegre de jogar futebol. O primeiro jogo em campo aberto foi realizado em Votorantim em 7 de setembro de 1903, entre Votorantim Athlétic Club e o Sport Club Sorocabano, no mesmo dia de sua fundação. Neste mesmo dia a preliminar foi realizada entre o Sport Club Savoia e o EFUSY Foot -Ball Club, equipe que tinha sido fundada em 15/05/1903.
SPORT CLUB SAVOIA
O Sport Club Savoia foi fundado em 1º de janeiro de 1900, conforme está atestado em vários documentos. A fundação está comprovada e certificada no Primeiro Registro de Títulos e Documentos da Comarca de Sorocaba. Sabe-se que os italianos que vieram para Votorantim a partir de 1891, quando no início da construção da fábrica de tecidos do Grupo União, já tinham formado um time de futebol para a sua recreação. Este quadro chamava-se Sport Club Savoia. Os “oriundis” em homenagem ao rei Umberto Primo da Casa de Savoia, vindos da região de Piemonte, ao Sul dos Alpes, divisa da Suíça e França, onde era território que tinha a cidade de Torino como capital do reino de Savoia, usavam as cores azuis e branco com a heráldica da família real.
Os “cascudos”, como eram conhecidos os italianos que atuavam no Savoia, apelido dado pela forma aguerrida e forte na marcação com que praticavam o futebol, foram por muitos anos os melhores da região de Sorocaba.
De 1900 até a década de 30, o Savoia foi um dos melhores times do interior do estado de São Paulo. Ficou conhecido como “esquadrão de ferro”. O “team” do Votorantim Athletic Club teve efêmera duração. A partir de 1903 os ingleses retornaram para o seu país de origem, ficando como 1º time da fábrica os italianos do Savoia.
A partir de 1903, com o retorno da maioria dos ingleses para a Inglaterra, os italianos do Savoia que não tinham autorização para representar a fábrica do Banco União, portanto não podiam usar o campo para treinos e jogos, teve uma comissão encabeçada por John e Willian Snapp, para fazer uma consulta à gerência da fábrica pleiteando que o S.C. Savoia passasse a ser o time oficial da fábrica de tecidos. Inicialmente não houve resposta da gerência. Mas o Savoia conseguiu autorização para ter sua sede própria que foi construída no bairro da Chave. Em seguida, sempre com a ajuda da família Snapp, iniciaram a construção de seu estádio ao lado do morro onde hoje se encontra a rua Savoia. Os italianos, admiradores do futebol do Savoia que eram em grande número, começaram a se cotizar para angariar fundos pagando recibos mensais para que a construção fosse possível. Os dirigentes do Savoia, dentre eles Pedro Dal Pian e Guido Picolotto, encabeçaram a comissão em prol da construção do estádio. O Jornal “O Cruzeiro do Sul”, em uma edição histórica do futebol, datada de 23 de março de 1986, na edição do caderno “Mais Cruzeiro”, publica uma entrevista com o veterano desportista Orélio Verlangieri, que foi testemunha ocular em 1902 da atuação dos ingleses John e Willian Snapp, que chegaram à beira do morro da Chave, e ali, com ajuda de operários, começaram a demarcar o espaço para construção do estádio do Savoia. Mais tarde ficou conhecido como “Parque do Castelo”, pela construção de uma tribuna de honra, onde os ingleses ficavam e era em formato da torre de um castelo.
Sem autorização da fábrica, o Savoia continuou fazendo seus treinos e jogos no seu campo, que pouco teve de ajuda de seus proprietários, agora já sem a presença maciça dos técnicos ingleses.
Somente em setembro de 1903 com a construção definitiva do estádio do Savoia e com a vinda de Tarcísio Nascimento na direção da indústria, é que a fábrica de tecidos resolveu deixar os italianos como segundo time, uma vez que o Votorantim Athletic Club ainda não havia sido extinto como clube social, deixando de ser um clube de futebol, assim as atividades sociais continuavam no meio da comunidade operária de Votorantim.
O Jornal “15 de Novembro”, do dia 06 de dezembro de 1903, deu a seguinte manchete: “tendo entrando muitos sócios de nacionalidade italiana, foi criado neste clube o segundo quadro com o nome de “team Savoia” Tarcísio Nascimento, diretor da fábrica de tecidos do banco União, era entusiasmado pela prática do futebol e resolveu a partir de 1903 fazer do Savoia o único time oficial da fábrica e conseqüentemente de Votorantim, daí o hiato que muitos entendem como paralisação do Savoia na prática do futebol.
Mandou construir no bairro da chave a sede do Savoia na antiga “Casa dos Ingleses”. Passou a prestigiar pessoalmente todos os eventos do Savoia, inclusive posando para fotos do “team”.
No dia 7 de setembro de 1903, o Votorantim Athletic Clube jogou contra o Clube Athético Sorocabano e ganhou por 4 a 1, formando com a seguinte escalação: A. Gray; Willian Snapp, J. Salvestrine, B. Ward; Domingos de Leon; W. Kiak, A. Snapp, W. Biercherdike, John Snapp, F. Hedfield, E. Ince, (nove ingleses e dois italianos). Na preliminar o S.C. Savoia jogou com o EFUSY - Estrada de Ferro União Sorocabana e Ytuana. Vencendo por 2 a 0, o Savoia formou com Salvestrine; I. Vetorazzo e Anselmo; Todesco, Picolotto e Luvison; Culbert, Dalpian, Manoel Silvestrine II E. Nonelli e Bellese, oito italianos e três ingleses.
Em 20 de maio de 1906, o Savoia jogou contra o Fortaleza Club, time da fábrica de tecidos, denominada Companhia Nacional de Estamparia- Cianê. O Time do Savoia jogou com F. Verlangieri; Guido Picolotto e Henrique; John Snapp e Anselmo; Otto, M. Forsato, Paulo, Silvestrine e Ward.
João dos Santos Júnior
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Acontece em Sorocaba
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