Simulador de Pássaro

Escapamos, como um pássaro, do laço dos passarinheiros; o laço quebrou-se, e nós escapamos. (Salmo 124:7)

Sentado em um banco do jardim, ocupava-me em observar um lago (minúsculo) de formato oblongo (oval comprido). As criancinhas vão muito ao local para olhar alguns peixes e as plantas flutuantes. Apesar de miúdo, o lago abastece quero-queros e sabiás, com gostosos e refrescantes sorvos d’água. Gorjeios de agradecimento são entoados pelas aves, após agradável banho, concluído com indispensável toalete. Ainda molhadinhas, despedem-se do festejo e, com indizível delicadeza e ternura, voam para outro sítio.

A Casa de Rui Barbosa, antiga construção carioca, que guarda o acervo (livros e coisas) do grande patriota, esbanjava sua generosidade, recebendo-me, um assíduo visitante, como se fora vez primeira. Mesmo que tentasse forçar, jamais vira o ajuntamento das plantas do laguinho, sugerir qualquer forma ou desenho.

Desta vez, foi diferente. O vento juntara as folhas, de modo a exibir com clareza, o número três. Não estranhe, se uma idéia, aparentemente boba puder proporcionar idêntica quantidade de vantagens:

1 - Aumentar as vendas atuais

2 - Alavancar novos negócios

3 - Evitar desastres aéreos

Não muito longe da Casa de RB, Johannes Vogelnicht, diretor executivo da “Sem Asa Consultoria”, suspendeu as comemorações pelas metas alcançadas e também por sua organização ter passado a fazer parte de privilegiada posição, no ranking das melhores empresas de um “Guinesszinho Empresarial Br”. Mandou chamar sua diretora de marketing, uma inteligente e simpática sudaca (sul-americana).

-- Papagena Condor! Que bom que você veio! – falou com sarcasmo Vogelnicht. Era assim que se comportava quando estava danado. E continuou:

-- Papagena! Acabo de suspender as comemorações, pois estou com um problema, que, não sendo solucionado me fará perder os clientes e impedirá a conquista de novos. Às cinco da tarde vou para teu país. Quando voltar, quero o assunto resolvido, falei?

-- Dr. Vogelnicht, peço-lhe que me faça saber do problema e tentarei encontrar a saída. –disse a obediente subordinada peruana.

-- Bóim. – um barulho desagradável foi ouvido, provocado por mais um pássaro que batia com sua cabeça na vidraça da janela da “Sem Asa Consultoria”.

-- Papagena. Eu não falei do problema, justamente porque estava querendo que você mesma visse. Já é o quinto pássaro que faz o haraquiri (se mata) essa semana. Perdemos dois negócios importantes e adiamos três reuniões de clientes antigos que tiveram a infelicidade de testemunhar o suicídio das aves. – Você me ajuda?

Papagena fez um estudo do comportamento de pássaros. Antes da construção do edifício, os seres emplumados voavam livremente naquela área. As informações ficaram gravadas no cérebro dos passarinhos, que não conheciam outra rota. Sem se darem conta, esborrachavam-se nos vidros do prédio.

Papagena realizou um concurso entre os funcionários da “Sem Asa Consultoria”. Quem fornecesse a melhor solução, viajaria para o Peru para conhecer o Condor, com dois acompanhantes, ciceroneados por Papagena.

Eis algumas das 1500 idéias apresentadas:

Papageno

Predadores

Simulador

Semiótica

REGA – Retorno do Esforço Geral e Aproveitamento

Papageno

Assistir ao trecho da Flauta Mágica – Ópera de Mozart, onde um passarinheiro chamado, Papageno toca flauta para pássaros.

Serviu para rir e descongestionar o cérebro diante do problema. Foi eleita a música para as comemorações que haviam sido suspensas.

Predadores

Idéia muito importante. Com ela foi possível Identificar o gavião, pássaro que poderia comer as aves que atropelavam a janela.

Simulador

Assim como no aeroporto existe o simulador de vôo, poderia ser desenvolvido um para aves indesejáveis. Projeto caro, coisa para a Infraero;

Semiótica

Uma estagiária de comunicação, aconselhou que fosse afixado um símbolo. Bastava colocar na área vítrea, o desenho de um pássaro, com a famosa listra proibindo a colisão.

A idéia de semiótica (símbolo) foi aprovada com alteração feita pela própria Papagena. É evidente que ave não entende signos como, proibido fumar e outros mais. Porém. o desenho de um predador, posicionado como sentinela, certamente impõe respeito, impedindo definitivamente choques no ar.

-- Papagena. Suba imediatamente até meu gabinete, já portando a Carteira Profissional. Conforme seja sua explicação, será de pronto defenestrada (jogada pela janela, demitida). – Determinou, muito aborrecido, o diretor recém-chegado de viagem.

-- Dr.Vogelnicht. Que bom! O senhor está bem humorado! É claro. Estamos completando uma semana sem acidentes aviários. Gostou dos falcões que mandei desenhar na vidraça. Antes de voar, os passarinhos olham as caras zangadas dos grandalhões e, aí sim, mudam a rota. Trouxe minha carteira sim, para que o senhor autorize o aumento salarial prometido antes de atingirmos a meta, lembra?

-- Lógico, Papagena. Você é a marqueteira que eu precisava. Marque as comemorações. Se possível, coloque um trecho da ópera Die Zauberflüte (A Flauta Mágica), onde canta um tal de Papageno. Vai ser uma festança!

-- A descoberta sua é extremamente importante para a “Sem Asa”. Estou até pensando em recomendar à empresa que administra aeroportos. Quem sabe? Eles descobrem qual é o predador do urubu e desenham um bem aterrorizante nas proximidades do aeródromo. Chega de acidente aéreo você não acha?

Enquanto o homem falava, o som do passarinheiro Pagageno obedecia à determinação de Vogelnicht (sem pássaro) e encerrava o expediente, iniciando a maior comemoração já feita pela “Sem Asa Consultoria”. Papagena respondeu:

-- Dr. Vogelnicht. É uma idéia. Talvez a magnitude do problema implique em uma solução de maior envergadura. Começo a imaginar a construção de um Simulador de Pássaro.

Gilberto Landim
Enviado por Gilberto Landim em 08/09/2006
Código do texto: T235390