CARNAVAL DA VELHA GUARDA

CARNAVAL DA VELHA GUARDA

“Se a velha guarda em termos de música fosse um embrião que não tivesse brotado, o que seria da música popular brasileira? Triste”.

(Antonio Paiva Rodrigues)

O ressurgimento ou, pelo menos, a curiosidade pública em torno da Velha Guarda, então num completo abandono e ostracismo, devem-se ao Almirante. Essa figura é um expoente musical das antigas e que encantava multidões. Foi ele que, em meados de 1954, organizou no estado de São Paulo o primeiro festival da Velha Guarda, alertando a platéia e ao público em geral para a excelência dos músicos que a compunham, interessando os aficionados nas execuções do grupo, fazendo renascer, enfim, a simpatia de todos pela música singela e pura de Pixinguinha, Donga, João da Baiana e demais componentes do conjunto.

Que nomes... Autoridades musicais. De lá para cá a Velha Guarda ganhou novo alento, o povo aceitou e aplaudiu em conseqüência dessa audiência surgiram outros festivais. Apareceu em “show” de “boite”, tendo excursionado e merecido lançamento do seu primeiro LP (Long Play)-SLP 1038, editado pela SINTER com incontestável sucesso.

Nesse disco, ao contrário do primeiro, quando o famoso Pixinguinha surgia como executante, temos o autor de “Carinhoso” colocando em evidência os seus dotes de orquestrador. Aqui Pixinguinha orquestrou e dirigia a orquestra que formou com clarineta, flauta, flautim, pistão, tuba, bombardino, cavaquinho, dois violões, coro vocal e grande bateria. Chamamos a atenção dos interessados o ritmo que dá o maestro à seção rítmica para a execução de sua música. Pixinguinha era muito interessado, organizado e queria em troca pela beleza de suas músicas a atenção do público. O samba verdadeiro, o de linhagem, o que continua fiel à sua origem africana, não pode, de maneira alguma, prescindir do ritmo; ao contrário desse samba, abolerado e moderno, insosso, que está na moda e há de ser efêmero de tão descaracterizado que está.

Na orquestra, além das cordas que fazem o centro e a baixaria e que, portanto, são ritmos também, temos Donga (prato e faca), João da Baiana (pandeiro), Heitor dos Prazeres (ganzá), Alcebíades Barcelos (o BIDÊ) (afoché) e Sebastião (surdo). Que timaço!

Dos integrantes da Velha Guarda, já estiveram no estúdio de gravação, além dos citados (Donga e João da Baiana), o compositor J. Cascata, que apareceu como cantor após seu grande êxito em “Nosso Ranchinho”, em quatro faixas; Alfredinho, no flautin; Rubens, executando um dos violões e Waldemar, no cavaquinho. Pixinguinha, como disse e coloco nas entrelinhas deste trabalho, de pesquisa, limitou-se a arranjar e dirigir o conjunto onde, vez por outra, destacava-se o pistão de Pedroca ou o bombardino de Adobar que, nota-se, Pixinguinha usou para substituir, na orquestração, o seu sax-tenor das execuções livres.

Nos oito números inseridos quatros são cantados por Cascata, três por Almirante (sempre presente e incentivador da Velha Guarda e um pelo coro). Até aí foi um sucesso de arrepiar e um público num frenesi aplaudia de pé a apresentação da orquestra; Pixinguinha cresceu no gosto popular. Das músicas, três são de autoria do Alfredo da Rocha Viana (Pixinguinha). São elas: “Ai eu queria”, cuja primeira gravação surgiu na voz de Francisco Alves, acompanhado pela orquestra do cassino Copacabana; “Gavião Calçudo” e já te digo. O “Gavião” teve duas gravações, ambas cantadas por Patrício Teixeira; a primeira, em disco Parlophon, com a orquestra Típica Pixinguinha-Donga e a segunda, em disco Odeon, onde o cantor era acompanhado por uma estranha combinação de piano e dois violões. Quanto a “Já te digo” foi lançado também pela orquestra típica Pixinguinha-Donga, com o cantor Benício Barbosa.

Aliás, a letra deste samba, poderá provocar curiosidade do ouvinte, quando diz: - Um sou eu... o outro eu não sei quem é! Esclareço: um é Pixinguinha naturalmente, que é o autor; o outro o seu grande rival na época, o sambista Sinhô, que a letra caricatura, num desafio, numa provocação tão ao gosto dos sambistas naquela época. Almirante, como ficou dito, canta três músicas: “O Gavião Calçudo” e mais “Cristo nasceu na Bahia”, do maestro Sebastião Cirino, com letra de Duque, e “Pelo Telefone”, de Donga. O samba de Cirino que, tal como Pixinguinha, é um orquestrador de recursos executantes de diversos instrumentos e sambista puro, foi sucesso, não somente no Brasil, como também em Paris, quando por lá andou o cancionetista e dançarino Duque, que faleceu logo após. Em 1920, já era apreciadíssimo pelos franceses.

A letra do samba, inclusive, é de sua autoria. A primeira gravação da época foi feita pela América Jazz Band, do pianista Sílvio de Souza. O outro, ou, ou seja, “Pelo Telefone”, de Donga, data de 1917 e foi gravado pelo Baiano. O selo do disco explicava que a música era um samba e isso acabou por se constituir num fato histórico: foi à primeira vez que a palavra designou, num disco, o estilo musical que hoje, no estrangeiro, é praticamente sinônimo de música brasileira. Completando este L.P de excelente qualidade tem o samba de João da Baiana, o (“Mulher Cruel”), um de Gastão Viana, o (“Adeus Morena”), que Orlando Silva gravou na Victor e que, apesar de ser um excelente samba, passou então desapercebido e, finalmente, “Depois que você me deixou”, de autoria de J. Cascata e Nassara.

Ressalte-se para os leitores que a Velha Guarda não era um estilo de música e sim uma orquestra que fez muito sucesso na época como visto nas entrelinhas desta matéria que hora repasso para quem gosta de música e principalmente de sua história e suas nuances.

ANTONIO PAIVA RODRIGUES-ESTUDANTE DE JORNALISMO DA FGF

Paivinhajornalista
Enviado por Paivinhajornalista em 07/09/2006
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