Liberdade

E ele estava ali! Cabisbaixo, olhos cravados no chão, mãos para trás: a representação visual da infelicidade e da vergonha. Seu advogado tinha falado em transação penal (um tal de prestação de serviços à comunidade, frase que de tão comprida e pomposa, terminou decorando) que o livraria da prisão. Mas ele continuava ali, sendo julgado por seu ato impensado, uma "tolice" (pensara antes de fazer), mas agora via a gravidade do mesmo. É certo que não foi um delito dos mais complexos ou comprometedores, mas ele, que nunca tinha experimentado uma situação assim, perdera bens mais preciosos que qualquer riqueza material: paz, liberdade, tranqüilidade, dignidade.

Absorto em seus pensamentos, lembrava-se do que seu pai dizia: "Com responsabilidade, você tem a liberdade para fazer tudo que quiser e puder". Então, ele começou a ouvir, ao longe, uma voz falar-lhe: era o juiz que estava a fazer uma síntese dos fatos para, depois, dizer-lhe dos benefícios da tal "transação penal" e só então indagar-lhe: "O senhor concorda?" Sua resposta durou o tempo que os neurônios levam entre o despertar para o fato de estar sendo perguntado e a pronúncia das palavras; respondendo (após este intervalo para o cérebro processar as ideias): "Sim". Um monossílabo que ainda não o demovia da angústia interior de ter errado; sentimento próprio dos homens honestos.

Pronto, agora assinara um acordo na Justiça e iria mensalmente trabalhar como carpinteiro - ofício que bem desenpenhava - em uma instituição de caridade, como punição por seu erro.

Para com a sociedade ele iria se redimir; mas de sua consciência, quem o absolveria? Que advogado seria tão brilhante a ponto de livrá-lo de seu próprio julgamento? Sabia que aquela assinatura não o eximiria da condenação de sua consciência ou, pelo menos, que um bom tempo seria necessário para o seu tribunal íntimo conceder-lhe o benefício de uma liberdade condicional: a aceitação de que, com o erro, crescemos.

(Danclads Lins de Andrade).

Danclads
Enviado por Danclads em 23/05/2010
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