Sextas Pensamentais
Qual é a paz...?
Você pode se sentar, confortavelmente, e deixar o trem levar. Você pode, definitivamente, percorrer a direção oposta à qual seu trem o leva, caminhando em frenesi pelos corredores, irritando outros passageiros. Pode até adormecer, comer, usar o banheiro, escovar os dentes, soltar um pum, mas, você jamais, sobre circunstância alguma, pode ficar parado em um trem em movimento.
Quase todos os dias encontro novos blogues, novos temas, novas pessoas com novos ângulos. Como são poucas as coisas que verdadeiramente me desinteressam, a quantidade de informações às quais sou completo ignorante aumentam a cada dia. Posso ficar total e clinicamente doido se não me concentrar em um tema fixo, mas daí vem o escritor a colocar seu lado pessoal em questão, o que já nem a mim interessa. O fato é que de tantos e tantos linkes colados ao lado, há os mais importantes, os que valem mais ler, e há os que mais divertem, os dos amigos, os informativos, os locais (politicagem), os internacionais, mais a firmar uma base de amigos e amigas escritores e escritoras do que para qualquer outro fim. E há, meus caros, apenas agora, alguém com quem me identifiquei de imediato, de quem mesmo meramente ouvindo a respeito, algum dia destes, dos perdidos à memória, suficientemente me despertou a simpatia e inspirou a um determinado caminho, alguém que eu sei jamais poder me igualar em feitos, nas mesmas circunstâncias e cenários que vivo e experimento a cada dia, com uma mentalidade muito parecida com a minha, que não pode ser igual porque o cara é o cara, é o tal, é o foda, senhor comum, hoje bem mais senhor do que eu, ao qual poderia dizer tranquilamente que deu a Fidel, e apenas sorriria respondendo: ‘Como soube?’ Meu herói, em outras palavras, o senhor Howard Zinn.
Ainda encontrarei, espero, com tempo e calma, mais a respeito do figura em Português. Por enquanto, há de se contentar o leitor que fala o idioma internacional do gringo, mesmo que meu professor tenha dito hoje que o idioma internacional seja o Francês, o que me despertou interesse, mas não convenceu. Aí está senhoras e senhores, o linke de meu herói, na sessão Internacional.
Se no Sextas passadas falei da guerrilha popular e combate violento às injustiças sociais e acúmulo de riquezas políticas, governamentais ou hierárquicas, hoje falo desta mesma luta, contra as mesmas injustiças, com melhores resultados, mas pacífica, sem a utilização da morte como vitória pífia sobre adversários idênticos.
Howard Zinn, historiador, é um dos maiores ativistas sociais vivos. Sua história, contudo, fala por si a respeito de suas visões. Marxista, socialista, anarco-comunista e sócio-democrata, judeu nascido no Brooklin, em NY, atualmente residente de Massachussets, chegou às suas conclusões políticas, o senhor Zinn, depois de participar nos bombardeios do estágio final da Segunda Guerra, em 1945. Graduou-se pela universidade de NY através do programa militar, e conseguiu seu diploma de doutorado graduado em Columbia. Logo, este meu herói não foi de se sentar à frente da televisão e indignar-se com as notícias, nem muito menos, apenas ler e compreender os fascínios das políticas sociais e seus aspectos filosóficos. Como o próprio homem diz, ‘imagine que tu tens um bule apitando no rabo, e não podes permanecer sentado, te causa um mal-estar ficar sentado, e precisas te movimentar...’ Pois, o conselheiro introduziu o exemplo, e foi uma das vozes mais memoráveis em seus tempos militantes, que jamais terminaram, e seguem aos dias de hoje.
Seu livro mais conhecido e popular tem o nome em Inglês de ‘A People’s History’, ou A Históia de um Povo, em tradução livre. Partes deste livro aparecem em cenas de Um Gênio Indomável, de Matt Damon e Ben Affleck, um de meus favoritos, e no episodio (para quem gosta, e eu gosto) sobre o dia de Colombo, no seriado Sopranos. Recomendo o filme, em tradução igualmente livre, ‘Você não pode ficar parado em um trem em movimento’ (You can’t stay still on a moving train), que mostra a vida de Zinn da juventude aos anos recentes, em seu ativismo incansável, com narração de Damon, vizinho em infância do casal Zinn e grande admirador das idéias do homem.
Foram tantos seus livros e contribuições à história da sociedade, no geral, que não menciono os demais por hora, ou a nitroglicerina não lhes fará efeito algum. Zinn é uma prova viva de que se pode e se deve lutar pacificamente, em sua percepção revolucionária, unindo pensamentos de Bakunin, Proudhon, Marx, Engels, entre alguns dos filósofos em suas linhas variadas, em um pensamento único de liberdade e igualdade entre os povos, muitas destas igualdades garantidas por lei, que deveriam, de fato, servir ao sistema. Comprova que a maior parte dos documentos classificados pelo governo ou milícia, não o são por medidas de segurança pública, mas apenas porque causam vergonha aos próprios portadores das mentiras e das verdades manipuladas. Howard foi responsável por passeatas diversas ao longo dos Estados Unidos, principalmente com os alunos da faculdade de Spelman, de onde foi afastado do cargo por conduta rebelde.
E são estas as condutas, as ações não-violentas, que me atraem mais. Até onde eu sei, sempre existirão justificativas às excessões. A independência dos Estados Unidos, ou a Independência ou Morte Brasileira, como exemplos, trazem um país tirano como fruto primeiro, e um país jamais visto livre, como segundo fruto. Estas foram vossas conquistas violentas, caros amigos e amigas. Outras, foram a própria chegada dos Europeus às ‘Índias’, assassinando, massacrando, e ludibriando nossos índios. Também houve vitória, e também serviu à causa das independências... De quem, exatamente, é onde pesa a moeda, de onde chegam as excessões. Amo os árabes, mas se estouram uma bomba em nome de sua causa, o resultado é o mesmo da bomba estourada pelo isralense, a quem eu também amo, enquanto ambos se odeiam. Se justifico a violêcia de Chê ou Fidel, outros justificam a exata mesma violência por outras causas. E justificam, vão por mim que justificam, ninguém fez parte da Alemanha quando Hitler hipnotizou uma nação em depressão, mas muitos estiveram, como eu, em um país zumbítico, guiado por um paralítico cerebral chamado Bush. Justificativas à violência, ao descaso, ao ódio, sempre há. Justificativas sempre há, no geral, e para quem não sabe, pergunte a um psicólogo, há toda uma hierarquia pessoal dentro de cada um de nossos cérebros. Nós nos desculpamos, quase sempre. Só não conseguimos, muitas vezes, nos perdoar, mas aí são outros mil.
Às vias de fato, são pensamentos como os de Howard os que me atraem, porque suas ações encorajaram centenas de pessoas, e contribuiram a mudanças concretas, como a união racial na maior parte dos Estados Unidos, algo que somente foi natural por existirem Howard Zinn’s espalhados mundo afora. Ghandi é apenas um exemplo, mas há muitos, e no Brasil temos os nossos, verdadeiros heróis, como Chico Mendes e o inesquecivel Betinho. Além disto, temos os jornalistas pasquinianos e muitos outros participantes políticos, incluindo nosso presidente, que por radical, jamais se soube de ter matado alguém em nome de sua causa, e eu espero muito não estar enganado. Os partidos, a política social, os artistas, os jornalistas, todos têm mérito nesta luta social que nos vem tomando de tempos em tempos, responsável pelas mudanças verdadeiras em nossos valores e sociedades, que cá entre nós, se perderam em educação, ganharam em concretas áreas de nossas estruturas sociais. São, ainda e todavia, os ativistas como Zinn que verdadeiramente arriscaram, propositalmente, foram presos porque sabiam que seriam presos se saíssem às ruas e parassem o trânsito, se fizessem barulho, foram atacados e espancados porque procuraram o porrete e a polícia, não porque queriam a policia, mas porque sabiam que estaria policiando, e mesmo assim não desistiram de suas causas. Ou seja, radicalismo sim, desobediência civil sim, violência NÃO, jamais, e ESSE é o ponto, e aqui jaz enterrado o cão.
Por isto, é meu heroi. Porque fez, e faz, porque escreve, faz filme, faz peças de teatro (assisti a trechos de Marx em Soho, sua última peça, um verdadeiro marco histórico na bela narrativa de Marx voltando aos tempos modernos e rindo-se de suas previsões), e vai às universidades, fala com os alunos, aparece em passeatas enquanto o permite a saúde, atende a pedidos de pessoas que querem saber mais como lutar e pelo quê, exatemente, lutar, e por ser um dos unicos atualmente a ainda fazerem alguma coisa, mas FAZEREM alguma coisa, concreta, ele é meu mais exclusivo e especial herói entre todos os possíveis heróis que já tive.
Hoje iniciei meu curso de introdução à comunicação em massa, e enquanto todos falavam um pouco cada qual sobre si e seus interesses pessoais, fui o único a mencionar jornalismo social como quesito, e o professor me olhou diferentemente, como se um alienígena estivese presente, mas o olhar me pareceu mais positivo do que negativo. Muitos, mas muitos, gostariam que as coisas fossem diferentes. Já nem se incomodam, os professores, em ensinar às mentiras, e sim, as mentiras, o que para o leitor anônimo do Pirata faz enorme diferença e neste caso, para nós, também. As pessoas têm medo, sim, medo de agir. Medo de quebrar a cara. Medo de passar por marginais. E, ora essa, se todos têm medo e quem não tem medo, em maioria, vai às armas, o mundo tem mesmo sua data de validade quase expirada.
Por isto, continuo contra a violência. Há sempre vidas e mortes, sem dúvida, faz parte da naureza, mas sinceramente, paciente demais é quem tolera a palhaçada que temos por vida social. Paciente demais, para não dizer preguiçoso. O melhor entre os piores é a opção mais conformista que eu conheço. O pior dos piores é emocionante. O melhor dos melhores, inexistente.
Aos abrax para um final de semana sem cima, nem muro,
RF
(Howard Zinn: Historiador, ativista dos direitos humanos e contra as guerras desde 1960. Um dos maiores na contemporaneidade. Suas idéias incorporam a democracia social, o marxismo, socialismo e anarquismo comunitário.)
(Publicado n'Os Intensos, todos os direitos reservados a Shaping Performances, inc, www.osintensos.blogspot.com, 25 de Agosto de 2006)