O dom de Deus
O DOM DE DEUS
Pois Deus de tal forma amou o mundo, que deu seu Filho
Único, para que todo o que nele crer não morra, mas tenha
a vida eterna (Jo 3, 16).
Na iniciativa da criação o Pai se revela como o grande doador. A vida, os alimentos, a natureza, tudo é dom gratuito do Criador. Nesse particular, criação, vida e salvação são juízos convergentes e práticas integrantes do projeto amoroso do Deus rico em misericórdia que preparou todos os passos da nossa salvação. Na raiz de todo dom, as Sagradas Escrituras nos ensinam a reconhecer uma iniciativa divina:
Todo dom de valor desce do Pai das luzes (Tg 1, 17).
Nesse contexto, ao homem se impõe um abrir-se ao dom de Deus (cf. Mc 10, 15). Recebendo os dons divinos, o ser humano se torna capaz de uma generosidade autêntica, uma verdadeira caridade. Iluminado pela graça de Deus, o homem é chamado a colocar esses dons em ação, em prática (cf. 1Jo 3, 16ss). Sobre a busca dos dons, São Paulo nos diz:
Aspirem aos dons mais altos. Aliás, vou indicar a vocês um
caminho que ultrapassa todos (1Cor 12, 31).
O capítulo 13 da Primeira Carta aos Coríntios, que trata do amor, é aberto com o último versículo (v. 31) do capítulo 12. Nesse capítulo podemos identificar dois tipos de dons: os edificantes, que glorificam diretamente a Deus e os que podem glorificá-lo mediante a ação do homem, como falar em línguas, fazer milagres, curar e partilhar. São Paulo começa a falar em dons no capítulo 12 e vai até o 14. No 13, entretanto, ele centra, no amor, a excelência do dom de Deus, afirmando, após cada realidade humana
Se eu não tiver o dom do amor, isso de nada me adianta...
(cf. 1Cor 13, 1-13).
Se a descoberta dos dons ocorre a partir da encarnação de Jesus, podemos ver que o Antigo Testamento é mais um tempo de promessa do que de dom. No decorrer de todo o Pentateuco ressoou a promessa de Javé a Abraão:
Darei esta terra, desde o rio do Egito até o Eufrates, à sua
descendência (Gn 15, 18).
Essa promessa de um dom, grande e futuro, tem caráter de uma aliança perene. Na verdade, não era uma terra de alguns quilômetros quadrados que Deus estava prometendo à posteridade de Abraão, mas algo mais. A promessa abrangia a chamada “terra prometida”, que serviria, por alguns séculos, de morada para o povo hebreu, egresso da escravidão no Egito. Essa ocupação de uma terra abençoada, onde brota leite e mel (cf. Ex 3, 8), é uma prefigura ao dom maior que é o Reino dos Céus, onde não haverá mais nenhuma contrariedade (cf. Ap 21).
Sucessivamente, Deus vai enriquecendo seu povo com significativos dons, como, por exemplo, a Lei (Dt 5, 22). No entanto, a lei só terá eficácia se for compreendida e vivida por corações novos. Num coração mau, de pedra, a lei de Deus perde seu significado (cf. Ne 9, 13.26). Para Israel é imprescindível a transformação do coração (a conversão) de pedra em coração de carne (cf. Ez 36, 26ss). Para esse dom futuro, Deus vai mandar seu filho. Com a encarnação os tempos ficam completos (cf. Mc 1, 15).
Ah, se você conhecesse o dom de Deus... (Jo 4, 10)
Os antigos dons do AT, como o pão do céu que contém todo o sabor (Sb 16, 20), a água do rochedo (Nm 20, 11; Sl 105, 41), a visão do alto que cura (Nm 21, 8), são uma pálida amostra dos dons futuros, nos tempos messiânicos. Quem aceita o dom de Deus aceita, implicitamente, fazer aliança com ele. Estabelecer aliança subentende bondade e partilha de dons, excluindo atitudes hostis (cf. Gn 32, 14; Js 9, 12ss).
Em boa parte das antigas Escrituras, o dom divino é ainda compreendido de forma material, como trabalho, comida e bebida (cf. Ecl 3, 13) e riquezas e bens próprios ao sustento (5, 19). Para retribuir aqueles dons, o povo de Israel oferecia dízimos (Lv 27, 32) primícias (Ex 34, 26) e sacrifícios (Lv 1, 1-17) a Javé. Essas ofertas eram uma retribuição pelos dons recebidos e também um pedido de desculpas pelas infidelidades cometidas contra a Aliança.
A hesed hebraica nada mais é que uma misericórdia humana, recíproca e discernida, baseada na riqueza incalculável dos dons de Deus. O cristianismo é que vai trazer a compreensão mais aprofundada a respeito da graça e dos dons que Deus, generosa e gratuitamente, dá. Na medida em que o homem vai aprofundando sua amizade com Deus, e penetrando em seu conhecimento, vai descobrindo os dons, que ele possui, que os outros possuem e os que Deus pode ainda dar. É verdadeira a afirmação de que não possuímos todos os dons. Vivendo em comunidade, somamos os que temos e os empregamos em favor de todos.
No latim, dom é donum, o mesmo que presente. Por isso, quando se fala em dom, a primeira idéia que nos vem à cabeça é o de sua gratuidade. Sobre isso, encontramos em São Paulo um texto bem revelador:
Se, de lado, a morte é o salário do pecado, o dom gratuito
de Deus é a vida eterna, em Jesus Cristo, Nosso Senhor
(Rm 6, 23).
Nesse aspecto, observa-se que é possível classificar os dons em naturais e sobrenaturais. Os dons naturais São aqueles que fazem parte da vida, como a percepção, a tendência para essa ou aquela atividade, por exemplo, a música, a sensibilidade, a capacidade de harmonizar, etc. Os sobrenaturais, além daqueles teologais, cujo objeto é Deus, impressos no batismo, como fé, esperança e caridade, são as chamadas obras do Espírito, como amor, alegria, paz, paciência, bondade, benevolência, mansidão e domínio de si (cf. Gl 5, 22s), a que o platonismo havia chamado de virtudes cardeais. A virtude, tanto na concepção estóica como aristotélica, é uma ação humana orientada pela razão e para o bem.
Há quem confunda virtude com dom. As virtudes, e o exemplo são as morais, podem ser desenvolvidas e adquiridas. Os dons, mesmo os naturais, como a aptidão para a música, esses nascem com o indivíduo. É um engano afirmar que dons (ou virtudes) naturais, podem ser aprendidos. Quando se escuta, por exemplo, um virtuose no violino, geralmente se diz: “Esse possui um dom de Deus...”. Muitos desconhecem o que é o dom de Deus. Para esses (e para nós), São Paulo adverte:
Sobre os dons de Deus, irmãos, não quero que vocês fiquem
na ignorância (1Cor 12,1).
Os céticos e racionalistas, aproveitam para redargüir, “... pudera, depois de dez anos de aprendizado num conservatório...”. Esquecem-se esses que, muita gente tem esses dons naturais até mesmo sem estudo, e que outros, mesmo com cem anos de aula jamais tocariam um décimo do virtuose. O dom é natural mas característico de cada pessoa. É dom, ela nasce com ele, ganhou aquela virtude sem nenhuma interferência humana.
No terreno sobrenatural, o dom maior que Deus dá aos homens é seu filho Jesus Cristo, que se torna caminho de salvação. Em paralelo com esse inestimável presente, há outros dons adjutórios, capazes de auxiliar a quem está a caminho de usufruir o dom maior. Tudo que temos é dom de Deus. É preciso reconhecer tantas dádivas e saber agradecer.
Não é de admirar que muitos cristãos tenham algumas dúvidas a respeito do dom de Deus. Primeiro, porque há poucos livros de teologia que falem especificamente desse assunto. Há publicações sobre os “sete dons do Espírito Santo”, editados por grupos carismáticos ou pentecostais; Tudo numa linha devocional, sem aprofundar; com pouca extensão teológica. Igualmente as enciclopédias de teologia pouco se estendem em relação ao assunto. As edições católicas da Bíblia, tão afeitas a divulgar seus “glossários” ou “vocabulários” pecam, a maioria delas por não apresentar nenhuma linha sobre o fascinante e obscuro assunto dons de Deus.
Deste modo, a descoberta dos dons, muitas vezes por falta de um conhecimento teológico, ou da aausência de um acompanhamento comunitário e pastoral, deixa aturdida a pessoa, que, sem saber como desenvolver e colocar em ação seus carismas se angustia para, posteriormente, enterrar esses dons. O ciúme, a inveja e o medo de perder certas posições, falhas nitidamente humanas e usuais em muitas comunidades, têm, igualmente, dificultado a frutificação de dons, bloqueando, em alguns casos, a própria ação de Deus.
Ah, se você conhecesse o dom de Deus... (Jo 4, 10)
O maior dom, autêntico presente que Deus nos dá é Jesus, seu filho. Sendo ele o dom por excelência, é dele que vem a graça maior que é a salvação Quem não compreende a gratuidade da ação doadora de Deus, ou, quem sabe movido por inveja, pode afirmar que, dando mais para uns e menos para outros, Deus poderia estar cometendo uma injustiça.
É preciso ter cuidado quanto a isso. É bom lembrar, com referência aos dons, que o próprio Deus começa a se revelar ao homem a si mesmo. Por aí começa o mistério do dom sobrenatural atuando na vida humana e na comunidade.
Para que Deus nos dá dons?
Antes do para que, seria bom sabermos o porquê. Deus nos dá seus dons, simplesmente porque nos ama. Um pai dá coisas boas aos filhos, antes mesmo de saber o que vão fazer com aquelas coisas, fica caracterizado que as deu como gesto de amor. Com Deus é um pouco diferente, pois ele sabe com que finalidade dá o dom. Nessa doação, o por quê tem resposta imediata: porque nos ama. E para que ele nos dá seus dons?
A História Sagrada, bem como a humana, está cheia de narrativas onde Deus dá alguma coisa aos homens. É uma seqüência lógica e crescente, de amor e misericórdia. Sua amizade é um dom. Quando ele se revela nosso pai, está nos obsequiando com a graça da filiação. A vida, o paraíso, a eleição de um povo, a pedagogia da provação, no deserto e no cativeiro, os profetas, os consolos, a redenção, sua presença perene no Cristo, no Espírito e na Igreja, tudo é dom.
Sabemos que o homem foi criado para a amizade com Deus e para a felicidade. Soberbo e incapaz de usar bem sua liberdade, o homem trilhou caminhos diferentes dos que o Criador havia traçado para ele. Deus, então, decidiu nos dar seus dons, e Cristo é o maior deles, para nos trazer de volta à sua casa, e com ele vivermos a felicidade eterna. Deus nos dá seus dons para que sejamos felizes; nesta e na outra vida. Sobre isso, a palavra de São Paulo nos orienta:
Os dons de Deus, assim como seu chamado, são
irrevogáveis (Rm 11, 29).
No episódio do diálogo com a mulher samaritana, Jesus se revela o Senhor até da água, alguém que é maior que o patriarca Jacó, antigo dono daquele poço. Naquele contexto, a água viva representa a “vida eterna”, o dom por excelência, a graça divina que enseja a salvação. Para caracterizar a doação, Jesus emprega, através da água, uma imagem bem palestinense, onde a água, nas regiões semi-áridas, é uma riqueza comparável à salvação. Assim como aquela mulher, que a princípio julgava que a água que Jesus lhe oferecia era a do poço, até hoje tem gente que não sabe identificar corretamente a oferta generosa de Deus, mensurando-a com critérios puramente humanos.
Deus vem ao encontro do homem, e lhe dá os dons necessários à sua salvação. Desta forma, os dons sempre são dados conforme a capacidade de cada um (cf. Mt 25, 15b). Os dons ofertados, com finalidade construtiva e salvífica, são gratuitos, independentes de mérito. Os critérios de Deus, embora justos e amorosos, são um mistério.
O uso desses dons, discordante do plano de Deus, ou seja, sem um propósito de buscar a salvação, própria e comunitária, por ser um simples ato de auto-glorificação, torna-se blasfemo. Não passa de coisa inútil ou ruído irritante (cf. 1Cor 13, 1). Concluindo, se ficar dúvidas à questão “para que Deus nos dá dons?”, parece claro afirmar que ele nos dá seus dons, primeiro porque nos ama (mesmo sem merecermos), depois, porque nos quer felizes e realizados ainda nesta vida, e, por último, o dom maior, a salvação, para que estejamos sempre com ele, onde ele estiver. Parece claro. A idéia paulina sobre os carismas, vai nos ajudar esse aprofundamento.
Os carismas segundo São Paulo
O carisma, segundo algumas escolas teológicas, é um dom especial do Espírito Santo, dado ao cristão para o bem do próximo e para a edificação da Igreja (cf. Ef 4, 12). O Espírito Santo, ao confiar à Igreja-comunhão os diversos ministérios, enriquece-a com outros dons e impulsos especial, chamados carismas. Podem assumir as mais variadas formas, tanto como expressão da liberdade absoluta do Espírito que os distribui, como em resposta às múltiplas exigências da história da Igreja.
Carisma, charisma, é uma palavra de origem grega que provém de cháris (graça) e, no português recebe a tradução de dom do Espírito Santo. Os carismas são forças, permanentes ou transitórias, que Deus, pelo seu Espírito, concede ao ser humano. Eles podem designar todos os dons de Deus, que são, irrevogáveis (cf. Rm 11, 19), notadamente o dom da graça (cf. Rm 5, 15s) e cujo fruto é a vida eterna (cf. Rm 6,23). Com efeito, como ensina São Paulo, em Cristo, Deus nos cumulou de graças (cf. Ef 1, 6) e nos concederá toda a espécie de dons (cf. Rm 8, 32) se assim lhe pedirmos. Um dos dons mais ricos é o próprio Espírito Santo, que foi infundido em nossos corações e põe neles a caridade (cf. Rm 5, 5).
Nesse particular, o dom realiza a koinonia (comunhão) no amor, e é capaz de suscitar em todos aquela alegria da “ação de graças” (cf. 2Cor 9, 12-15). Aquele que coloca seus dons em proveito da comunidade, agradece a Deus tanto quanto e mais que o beneficiário, pois sabe que sua própria generosidade é uma graça (cf. 2Cor 8, 1), um fruto do amor que vem de Deus (cf. 1Jo 3, 14-18). Por isso, positivamente, “há mais felicidade em dar que em receber...” (cf. At 20, 35). O capítulo 12 da primeira carta de São Paulo aos Coríntios fala detidamente nos dons do Espírito Santo:
A manifestação do Espírito é dada a cada um para proveito comum. A um o Espírito dá uma palavra de sabedoria; a outro, uma palavra de ciência segundo o mesmo Espírito; a outro, a fé, no mesmo Espírito; a outro, o dom das curas, nesse único Espírito; a outro, o operar milagres; a outro, a profecia; a outro o discernimento dos espíritos; a outro, o falar diversas línguas, e a outro ainda, o interpretar essas línguas (1Cor 12, 4-6; cf. 28-31; cf. Rm 12, 6-8).
Os carismas, sejam extraordinários ou simples e humildes, são graças de Deus no Espírito Santo que têm, direta ou indiretamente, uma utilidade eclesial, ordenados como são à edificação da Igreja, ao bem dos homens e às necessidades do mundo.
Sobre os dons de Deus, irmãos, não quero que vocês fiquem
na ignorância (1Cor 12,1).
Desde a Antigüidade judaica, essa presença do Espírito de Deus, se manifestava nos homens, através de “dons extraordinários” que iam desde a clarividência profética (1Rs 22, 28), aos arrebatamentos (1Rs 18, 12), ao êxtase (Ez 3, 12). Isaías relacionou ao Espírito, os dons prometidos ao Messias (cf. Is 11, 2), e Ezequiel, a transformação dos corações humanos (cf. Ez 36, 26ss). É preciso, na compatibilização da vida espiritual com a prática cristã, que haja, na justiça, a busca de uma continuidade, como ensina São Paulo:
Não extingam o Espírito, mas julguem tudo e conservem o que
é bom (1Ts 5, 12; 19-21).
Assim empregados, os carismas, na sua diversidade e complementaridade, estarão concorrendo para o bem comum, ou seja, realização e felicidade para todos, como Deus projetou, e não para alguns poucos incluídos no sistema, de hoje. Analisando detidamente as formulações teológicas de São Paulo, veremos que ele resume o dom de Deus, com a palavra tudo:
[...] tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus,
daqueles que são chamados à salvação, conforme o projeto
de Deus (Rm 8, 28).
Esse tudo evidencia uma doação absoluta, abrangente e irreversível. Nesse aspecto, o dom é sinal e prefigura da herança do Reino, imperecível e irredutível. Nesse aspecto, Paulo não se preocupou em formular uma classificação racional dos carismas, embora os enumere diversas vezes (cf. Rm 12, 6; 1Cor 12, 8ss) . É, no entanto, possível reconhecer os campos da atividade humana em que os dons divinos têm lugar.
Certos carismas são relativos às funções do ministério (cf. Ef 4, 12): os dos “apóstolos”, dos “profetas”, dos “doutores” dos “evangelistas” e dos “pastores” (1Cor 12, 28). Outros concernem às diversas atividades úteis à comunidade: serviço, ensinamento, exortação, palavra de sabedoria, de ciência, fé eminente, dom da cura, falar em línguas, etc. (1Cor 12, 8ss) (Vocabulário de Teologia Bíblica, Ed. Vozes).
Tais ensinamentos evidenciam que o múnus cristão e a vida da Igreja dependem inteiramente dos carismas, que é por onde o Espírito de Deus governa o povo, sobre o qual ele foi efundido em generosa abundância, dando a muitos o poder e a graça para serem úteis à comunidade e responder à sua vocação, sempre visando a edificação do Corpo de Cristo (cf. Ef 4, 12).
Na consecução do processo de salvação, segundo São Paulo, Jesus entregará ao Pai toda a realeza (cf. 1Cor 15, 24), os justos receberão o Reino como herança (cf. Ef 5, 5), retratando deste modo o oferecimento gratuito - o dom - que Deus oferece ao homem, na pessoa de Jesus Cristo. Assim o apóstolo ensina à Igreja que Cristo é o Senhor e Salvador, e que nele todas as promessas de Deus encontram o seu sim. Em gratidão a tão generosos dons, a Igreja toda, num gesto de glória brada “amém” ao doador dos dons (2Cor 1, 20).
Os Dons do Espírito Santo
O dom de Deus – já falei neles em outra oportunidade – realiza a união no amor, e suscita em todos uma atitude de gratidão, como que uma ação de graças (cf. 2Cor 9, 12-15). Quem sente em si o dom de Deus, capaz de impulsioná-lo a serviço do Reino, coloca-se em atitude de gratidão e disponibilidade, pois sabe que esse serviço é uma graça (cf. 2Cor 8, 1), um fruto do amor divino (Cf. 1Jo 3, 14-18), e como tal, irreversível.
A afirmação de Jesus – diz J. Alday – é chave: “Vocês receberão uma força do alto...”. Essa assertiva manifesta a finalidade direta da efusão do Espírito Santo, quando os discípulos poderão, à semelhança de Jesus, proclamar a Boa Notícia do Reino de Deus (Lc 4,1. 14. 18. 43).
Essa mesma autoridade transformará os missionários em testemunhas do Ressuscitado, e seu campo de ação será o mundo inteiro. Na despedida, Jesus acena com a vinda do Espírito Consolador (o Paráclito), que trará discernimento aos homens com relação à verdade e ao julgamento sobre o pecado e a justiça. Esse Espírito, que Jesus depois de glorificado enviou, é o que veio anunciar as coisas futuras (cf. Jo 16, 13).
Aqueles que se convertem, portanto, são conduzidos para
fora da órbita do juízo, pelo Espírito Santo, e introduzido
na justiça que se encontra em Jesus Cristo, e está nele
porque a recebe do Pai, como um reflexo da santidade
trinitária (DV 48).
No contexto dessa realidade inefável, o Espírito Santo é o agente principal da conversão, evangelização e santificação dos cristãos e nos concede uma infinidade de dons. Entre tantos, há aqueles especiais, descritos nas Sagradas Escrituras (cf. Is 11, 1-4) que a Igreja venera e cultiva com muito carinho, conhecidos como os sete dons, que são entendimento, sabedoria, piedade, fortaleza, conselho, ciência e temor de Deus.
Sobre os dons de Deus, irmãos, não quero que vocês
fiquem na ignorância (1Cor 12,1).
Renovado pela gratuidade dos dons do Espírito Santo e pelas demais graças atuais, o homem penetra na gratuidade da vida divina, vivendo aquela intimidade dos filhos de Deus. Se o cristão pedir os dons que lhe faltam para a sua conversão, perseverança e santificação, ele, por certo os recebera, pois
[...] o testemunho de Cristo tornou-se firme em vocês, que
esperam a Revelação de Nosso Senhor Jesus Cristo, a tal
ponto que não lhes falta nenhum dom (1Cor 1, 7).
Cabe dizer que Deus faz morada no coração daqueles que, acolhendo os dons, e acolhendo-os com a devida dignidade, fazem bom uso deles, empregando-os para a obra de Deus, em si, nos homens e no mundo.
Pois Deus de tal forma amou o mundo, que deu seu Filho Único, para que todo o que nele crer não morra, mas tenha a vida eterna.
Que o Pai, o Deus-da-vida seja para sempre adorado e glorificado! Que seus dons nos dêem a força e a coragem de proclamar sempre sua glória, amém!
Excerto de um retiro de religiosos levado a efeito em março de 2010 no interior de São Paulo. O autor é Biblista e Doutor em Teologia Moral, escritor com mais de uma centena de livros publicados, entre eles “O dom de Deus – Um Deus que vem ao nosso encontro”, Ed. Ave-Maria, 1999.
Para ler outros artigos, religiosos e profanos, ver
www.recantodasletras.com.br/autores/mesquitagalvao