Reflexões sobre o Artigo “DIRETRIZES CURRICULARES DA PEDAGOGIA: IMPRECISÕES TEÓRICAS E CONCEPÇÃO ESTREITA DAFORMAÇÃO PROFISSIONAL DE EDUCADORES” do professor “JOSÉ CARLOS LIBÂNEO*”
Reflexões sobre o Artigo
“DIRETRIZES CURRICULARES DA PEDAGOGIA: IMPRECISÕES TEÓRICAS E CONCEPÇÃO ESTREITA DAFORMAÇÃO PROFISSIONAL DE EDUCADORES” do professor “JOSÉ CARLOS LIBÂNEO*”
Este artigo do professor José Carlos Libaneo traz muitas reflexões sobre a formação do pedagogo e a regulamentação dessa formação, principalmente em relação ao que preconiza a “Resolução CNE/CP n.1, de 15/5/2006 que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em pedagogia, na modalidade licenciatura”
Este artigo traz uma exposição crítica ao conteúdo do documento, indicando que mantém antigas imprecisões conceituais com relação ao campo pedagógico que não contribuem para a superação de problemas acumulados na legislação sobre o assunto p.843
Seu posicionamento crítico sobre a lei busca desvelar “imprecisão conceitual” que transformou a concepção da função pedagogo tornando-a generalista e misturando-a com a função docente.
A insuficiência epistemológica, decorrente da ausência de uma conceituação clara do campo teórico da pedagogia, originou uma Resolução cheia de imprecisões acerca da natureza da atividade pedagógica, do campo científico da pedagogia e seu objeto, das relações entre ação educativa e ação docente, entre atividade pedagógica e atividade administrativa, comprometendo todo o arcabouço lógico e teórico da Resolução p.849
O que entra em discussão no texto é a validade das especificidades formativas para profissionais gestores e coordenadores, diferenciando-as da formação do docente. O autor começa, então, a clarear fronteiras entre a licenciatura e o bacharelado em Pedagogia.
O objeto próprio da ciência pedagógica é o estudo e a reflexão sistemática sobre o fenômeno educativo, sobre as práticas educativas em todas as suas dimensões. p.849
Dessa forma, por respeito à lógica e à clareza de raciocínio, a base de um curso de pedagogia não pode ser a docência. Todo trabalho docente é trabalho pedagógico, mas nem todo trabalho pedagógico é trabalho docente. Um professor é um pedagogo, mas nem todo pedagogo precisa ser professor. Isso de modo algum leva a secundarizar a docência, pois não estamos falando de hegemonia ou relação de precedência entre campos científicos ou de atividade profissional. Trata-se, sim, de uma epistemologia do conhecimento pedagógico. p.850
Vem à luz algumas concepções para refletir. Quando o professor Libaneo fala que não precisa um pedagogo ser professor, entende-se que a formação de pedagogia, da ciência da educação, não pode estar atrelada exclusivamente para a formação de docente, de professor. O que então se quer defender é a formação de um cientista da educação que trabalhe, além das escolas, em todas as esferas onde se lida com formação humana, aprendizagem e conhecimento.
O curso de pedagogia não pode ser igual a curso de licenciatura para formação de professores de educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental – o curso de pedagogia é uma coisa, a licenciatura outra, embora interligados; b) a base da formação do pedagogo não pode ser a docência, pois a base da formação docente é o conhecimento pedagógico; c) todo docente é um pedagogo, mas nem todo pedagogo precisa ser docente, simplesmente porque docência não é a mesma coisa que pedagogia p.851
À frente, o professor, então, delimita o que viria a ser um docente e um gestor (função essa exercida por um bacharel em Pedagogia), citando V.H. Paro
O docente é aquele que ensina para que o aluno aprenda o que necessita para inserir-se de forma crítica e criadora na sociedade em que vive. O gestor é o que dispõe e coordena a utilização adequada e racional de recursos e meios, organiza situações, para a realização de fins determinados, tal como escreve Paro com relação à atividade administrativa (Paro, 1986, p. 19-20). P.852
Assim, defende no texto que a Resolução do CNE trouxe consequências graves aos cursos de Pedagogia: inchamento de disciplinas devido às várias atribuições dadas ao professores-pedagogos, o esvaziamento dos estudos teórico-investigativos em pedagogia, rompimento da tradição de formação de especialista em pedagogia entre outros. Tudo isso devido ao fato de unir as concepções formativas de um docente e um pedagogo. E o campo da pesquisa pedagógica fica a cargo de outros especialistas
Não se estuda pedagogia nos cursos de pedagogia, a teoria pedagógica e a investigação de formas específicas de ação pedagógica estão ausentes das faculdades de educação. Em boa parte delas, quem emite juízos sobre questões de pedagogia hoje são os sociólogos, os cientistas políticos, os especialistas em políticas educacionais, os psicólogos, não os pedagogos. p.860
E assim, gestores, diretores e coordenadores acabam tendo uma formação generalista, preparados também para a docência, e acaba tendo dificuldades em tratar de questões mais complexas que exigem um tratamento teórico-metódologico, através de uma investigação científica mais acurada. Tudo isso devido à ausência de conteúdos que prezem a busca científica de construção teórica sobre a pedagogia. Os pedagogos entram em contato com conteúdos disciplinares que visam estritamente à docência.
É difícil crer que um curso com 3.200 horas possa formar professores para três funções que têm, cada uma, sua especificidade: a docência, a gestão, a pesquisa, ou formar, ao mesmo tempo, bons professores e bons especialistas, com tantas responsabilidades profissionais a esperar tanto do professor como do especialista. Insistir nisso significa implantar um currículo inchado, fragmentado, aligeirado, levando ao empobrecimento da formação profissional. p.861
O autor não vem desmerecer a atividade docente, mas atentar para as transformações que ocorreram nos cursos de pedagogia e na não definição clara de seus objetivos. Pincela em seu artigo, a razão por essas mudanças, que remete a movimentos contestatórios da década de 80 que via a escola como forma de perpetuação dos modos capitalistas, refletindo a estrutura hierárquica da sociedade onde um ordenava “o gestor” e o outro executava “o docente”. Libaneo convida a refletir que não podemos simplesmente fazer essa analogia sem uma reflexão profunda dos termos. Uma que os alunos, alvo principal de toda atividade educativa, não podem ser encarados como um produto de um sistema capitalista e que há outros fatores do sistema escolar que podemos compreender como manifestações ideológicas capitalistas, e não só o posicionamento hierárquico de funções.
Há de se considerar que os professores, como também os especialistas, que atuam na escola, não são agentes diretos do capital, nem os alunos mercadorias a serem produzidas. Isso leva a distinguir produção de coisas e produção de seres humanos como processos não-idênticos, ainda que estruturas organizacionais sejam planejadas para que uma possa estar a serviço de outra. Além do mais, se convém ao capitalista produzir trabalhadores assalariados automatizados, isso não significa que a subjetividade do trabalhador seja sempre subjugada em função do capital. O que ocorre, pois, é que o trabalho escolar tem sua especificidade, ainda que não descolada dos seus vínculos com a organização social e econômica da sociedade. p. 857 e p.858
Assim, defende as especificidades do trabalho docente e pedagógico, mas alerta para a confusão formada pela decisão da Resolução da CNE em questão que deixou não claro as funções e provocou um esfriamento nos trabalhos de formação, tanto do docente quanto do pedagogo.
Que fique claro: um professor também é um pedagogo e o melhor que pode fazer é formar, criar e constituir sua própria pedagogia. A formação permanente do professorado requer uma pedagogia crítica engajada, uma pedagogia que possibilite a compreensão teórica dos problemas, as instrumentalidades de ação docente e a efetiva solução dos graves problemas que atingem o sistema de ensino brasileiro. p.867
O que se espera de um professor é que, pelos conhecimentos que adquire e pela preparação para a atividade docente prática, vá formando um pensamento pedagógico e um modo de agir pedagógico próprio. p. 867
Nenhum investigador e nenhum educador prático poderão, pois, evadir-se da pedagogia, pois o que fazemos quando intentamos educar pessoas é efetivar práticas pedagógicas que irão constituir sujeitos e identidades. p.867
Por fim, ficam as considerações do professor sobre o curso de Pedagogia “cuja especificidade é proceder à análise crítica e contextualizada da educação e do ensino na qualidade de práxis social, formando o profissional pedagogo, com formação teórica, científica, ética e técnica com vistas ao aprofundamento na teoria pedagógica, na pesquisa educacional e no exercício de atividades pedagógicas específicas.” P.870
Pelas atribuições elencadas percebe que fundir docência e ciência pedagógica torna-se um excesso formativo que não atinge o objetivo. Não entro na discussão entre especialidade ou generalidade, mas a Resolução da CNE pode ter feito desaparecer o especialista pedagogo e transformado o docente em alguém sem o preparo para atender demandas mais complexas sobre a gestão do ensino numa instituição escolar.
Evidentemente que essas são reflexões parciais de uma primeira leitura do texto do professor José Carlos Libaneo. Meu objetivo, claro, é fomentar interesse pela leitura do artigo e aumentar a discussão sobre o tema. A leitura cuidadosa dos termos expostos aqui, mais a leitura integral do texto do professor Libaneo poderão contribuir para a formação de novos conceitos, concordantes ou discordantes, que colocam no palco das discussões a formação do pedagogo e o currículo de Pedagogia nas instituições superiores do Brasil.
Professor Valdir dos Santos Lopes
* CITAÇÃO
LIBANEO, José Carlos. Diretrizes curriculares da pedagogia: imprecisões teóricas e concepção estreita da formação profissional de educadores. Educ. Soc., Campinas, v. 27, n. 96, out. 2006. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302006000300011&lng=pt&nrm=iso>.
Acessos em 03 abr. 2010.