O DITADOR DEVE MORRER

O artigo fora publicado em 1941 numa importante revista cultural de Buenos Aires e chegou às minhas mãos recentemente. Naquela época o mundo estava infestado de personagens teatrais que pretendiam resolver todos os problemas com discursos inflamados, violência e enganação. Nada muito diferente do que ocorre hoje em dia quando os atores são mais astutos e tão tergiversadores como aqueles: Mussolini, Hitler, Perón e Stalin que fizeram escola pelo mundo afora.

O artigo falava dos verdadeiros ditadores e não daqueles homúnculos bois-de-piranha que passaram para a história como símbolos da malignidade ou bodes expiatórios de grandes grupos e nações. Sua atualidade é indiscutível porque os verdadeiros ditadores não morreram, continuam muito vivos, porque são muito sabidos, muito mal sabidos.

“Cada ser humano, desde que balbucia as primeiras palavras e põe de manifesto seus desejos, mostra com clareza meridiana a presença, dentro de si, de um ditador que se empenha por impor a própria vontade pretendendo, como conseqüência de tão caprichosa inclinação, que todos lhe façam o gosto, quer dizer, que lhe obedeçam.”

Com esse lance ágil da inteligência o autor tira o foco das atenções daquelas histriônicas figuras centrando-o no próprio leitor: cada ser humano carrega dentro de si um ditador que deve ser eliminado; aquele ser inflexível que imagina que o mundo existe para servi-lo; que vê no opositor um inimigo; que não aceita nenhuma idéia diferente da própria; que traz no cenho carregado a imagem do dominador implacável.

E o autor prossegue explicando que esse ditador é a “soberba embebida de amor próprio” e que é muito difícil matá-lo. E finaliza concluindo que “a sensatez adverte que todo proceder correto, nobre e amplo haverá de inspirar simpatia e confiança, enquanto que a postura caprichosa, autoritária e intransigente, conspirará contra a própria personalidade”.

Quando González Pecotche escreveu esse artigo deveria estar com quarenta anos. O jovem pensador iniciara, onze anos antes, um grande movimento humanista que da Argentina se espalharia pelo mundo. Conhecido e reconhecido por sua inteligência e coragem, criara, no início daquela década, a revista Logosofia que cumpriria importante papel na divulgação de suas idéias num período em que a publicação de livros estava dificultada em função da grande guerra engendrada por terríveis ditadores.

Por isso dissemos a atualidade do conteúdo comentado: cada um de nós haverá de identificar, combater e eliminar o ditador pretensioso que se disfarça, qual camaleão, nas profundezas da própria psicologia.

Nagib Anderáos Neto

www.nagibanderaos.com.br

Extraído do Livro “Guardados Que Vivem”

Nagib Anderáos Neto
Enviado por Nagib Anderáos Neto em 15/08/2006
Código do texto: T216976