Concepções de Ensino-aprendizagem

A partir das pesquisas e concepções difundidas por grandes pensadores como o psicólogo suíço Jean Piaget, o soviético, Lev Vygotsky, a argentina, Emília Ferreiro e o francês, Henri Wallon eclodiu o interesse de estudos sobre o processo de funcionamento da inteligência e aquisição do conhecimento. Embora, as teorias desses estudiosos do comportamento humano apresentem alguns aspectos divergentes, evidenciam-se em suas obras um alto grau de aproximação e interrelacionamento.

Inicialmente, é considerável afirmar que Piaget não intencionou formular considerações pedagógicas através dos seus estudos. Ele tentou comprovar que a criança raciocina mediante estruturas lógicas próprias que evoluem conforme faixas etárias estabelecidas. Na visão de Piaget, as operações cognitivas são ações interiorizadas de onde se conclui que o conceito de ação passa pelas manifestações da inteligência ao longo do desenvolvimento, desde suas formas primitivas as mais avançadas e abrangentes. Nesse foco, a criança só pode conhecer ou construir seus conhecimentos, através da ação individual que exerce sobre os objetos.

“(...) cada vez que ensinamos prematuramente a uma criança alguma coisa que poderia ter descoberto por si mesma, esta criança foi impedida de inventar e consequentemente de compreender completamente. Isso obviamente não significa que o professor deve deixar de inventar situações experimentais para facilitar a invenção do seu aluno”. (Piaget, 1975)

Posteriormente, a psicolinguística argentina, Emília Ferreiro deslocou o foco de investigação do “como se ensina” para o “como se aprende”, colocando a criança como sujeito central da aprendizagem, sujeito ativo que elabora hipóteses sobre o funcionamento da linguagem escrita em seu contexto social. De acordo com as preposições de Ferreiro, 2002:

“Há crianças que ingressam na língua escrita por meio da magia (uma magia cognificamente desafiante) e crianças que entram na língua escrita pelo treino de habilidades básicas. Em geral, as primeiras se tornam leitoras; as outras têm um destino incerto”.

Nessa perspectiva, Ferreiro também alega que a aprendizagem da leitura e da escrita não está limitada à sala de aula. Ressalta ainda que, o processo de alfabetização é iniciado muito antes da criança entrar na escola. Em suma, a alfabetização deixa de ser saber exclusivo da ação pedagógica. O processo inicial da aprendizagem é explicado também por variáveis sociais, culturais, políticas e psicolinguísticas.

É relevante observar que, os estudos de Emília Ferreiro e seus colaboradores partiram do pressuposto que a criança é capaz de criar hipóteses, testá-las e constituir sistemas interpretativos na busca de compreensão do mundo que a cerca. Complementa a autora, que não existe ponto zero da aprendizagem escrita; a criança sempre apresenta um conhecimento prévio que o sujeito reestrutura a partir de um processo de acomodação e assimilação mental.

“As crianças são facilmente alfabetizadas desde que descubram, através de contextos funcionais, que a escrita é um objeto interessante que merece ser conhecido (como tantos outros objetos da realidade aos quais dedicam seus melhores esforços intelectuais)." (Ferreiro, 1983)

É oportuno salientar que, apesar de Piaget e Vygostsky explicitarem visões distintas, ambos podem perfeitamente dialogar por partirem do mesmo pressuposto: o desenvolvimento humano é desencadeado mediante as relações recíprocas e contínuas entre sujeito e objeto, meio físico e social.

Nesse sentido, Vygostsky fundamenta-se por um cunho sócio-histórico, salientando a importância das interações entre sujeito e objeto, explicitando que a ação do sujeito sobre o objeto passa essencialmente pela mediação social. É notório no conceito de Piaget que, a criança é fundamentalmente ativa.

Na percepção Vygotskyana, a criança além de apresentar-se ativa, é sobretudo interativa. Nesse prisma, a teoria sócio-histórica define o conhecimento como uma construção social que é resultado da apropriação do sujeito, dos saberes, das produções culturais da sociedade pela interrelação e mediação da própria sociedade.

“Desde o nascimento as crianças estão em constante interação com os adultos, que ativamente procuram incorporá-las a sua cultura e à reserva de significados e de modos de fazer as coisas que se acumulam historicamente. No começo, as respostas que as crianças dão ao mundo são dominadas pelos processos naturais, especialmente àqueles proporcionados por sua herança biológica. Mas através da constante mediação dos adultos, os processos psicológicos instrumentais mais complexos começam a tomar forma (...)”. Vygotsky, 1988)

Faz-se necessário refletir sobre o conceito de aprendizagem postulado por Vygotsky. Para ele, a linguagem humana é o instrumento fundamental para a mediação do sujeito e o objeto do conhecimento. Pois ao longo do desenvolvimento do indivíduo, a linguagem é internalizada através das interações sociais, e passa a funcionar como instrumento imprescindível de organização do conhecimento.

Nesse aspecto, acrescenta o autor que, o professor deve agir e pensar de forma ampla, compreendendo que o conhecimento é um conjunto de capacidades ativadas: observação, atenção, memória, raciocínio etc.; e que o aperfeiçoamento de uma destas capacidades significa o melhoramento das capacidades em geral. Assim, concentrar a capacidade de atenção na leitura e compreensão de texto implica em melhorar a capacidade de atenção sobre qualquer disciplina ou temática.

Outras contribuições bastante significativas na compreensão do processo ensino-aprendizagem são as valorosas pesquisas destinadas a professores e gestores da educação concebidas por Henri Wallon, autor da Teoria do Desenvolvimento. Em sua teoria, Wallon priorizou conceitos importantes que nortearão um processo pedagógico mais produtivo e satisfatório para o aluno. Esses conceitos envolvem: integração, integração organismo-meio e integração dos conjuntos funcionais-emoção, sentimento e paixão. Ou seja, o papel da afetividade nos diferentes estágios.

A compreensão e a afetividade do professor na prática pedagógica são recursos fundamentais para a eficácia do ensino nos anos iniciais. A relação interpessoal professor-aluno é determinante, para desenvolver aprendizagens significativas. Desse modo, é extremamente importante perceber que, para o professor atingir seus objetivos, faz-se preciso: confiar na capacidade do aluno; promover constantemente o próprio desenvolvimento; desenvolver diferentes saberes, entre eles, habilidades de relacionamento pessoal e conteúdos culturais. Estes saberes são conhecimentos construídos ao longo do tempo e através da socialização familiar e escolar.

Nesse contexto, Wallon adverte que, o desenvolvimento humano é estabelecido sob o foco do potencial genético combinado com vários fatores ambientais. Dessa forma, a ênfase da teoria do desenvolvimento é justamente a interação da criança com o meio. Em linhas gerais, é claramente perceptível que o pensamento de Wallon propõe um relacionamento bastante proximal com as idéias de Vygotsky.

“O meio é um complemento indispensável ao ser vivo. Ele deverá corresponder as suas necessidades e as suas aptidões sensórios-motoras, depois psicomotoras. Não é mesmo verdadeiro que a sociedade coloca o homem em presença de novos meios, novas necessidades e novos recursos que aumentam a possibilidade de evolução e diferenciação individual. A constituição biológica da criança ao nascer não será a única do seu destino (...) Os meios em que vive a criança e aqueles com que ela sonha constituem a forma que amolda sua pessoa (...)”. (Wallon, 1975)

A teoria Walloniana insere em suas fundamentações pontos relevantes como o “afeto” e a “emoção”. Sendo que, os processos afetivos são estados que despertam sensações de prazer ou desprazer. Já a emoção caracteriza-se como um estado afetivo que comporta sensações de bem-estar ou mal-estar, que tem um início, é ligado a uma situação de duração relativamente breve e inclui ativação orgânica.

Do ponto de vista Walloniano, emoção é a exteriorização da afetividade que desencadeia várias expressões: corporal, motora e fisiológica. É o primeiro recurso de ligação entre o orgânico e o social. A emoção promove os primeiros vínculos com o mundo humano e através dele com o mundo físico. Sucintamente, emoção é uma forma concreta de participação mútua. É sobretudo, instrumento de socialização. A emoção é determinante na evolução mental: a criança corresponde a estímulos musculares, viscerais e externos.

Em síntese, observa-se que o processo de desenvolvimento e aprendizagem do ser humano é um tema amplo, mutável e complexo. Este envolve várias compreensões sobre a natureza humana: dimensão genética; aspectos sócio-histórico-culturais; fatores afetivos e estímulos; interação e medição da construção do conhecimento.

Face às proposições referidas por esse autores, conclui-se que as concepções definidas iluminam diferentes aspectos no cotidiano escolar trazendo consigo contribuições valorosas que poderão auxiliar professores e gestores educacionais a refletir sobre a complexa temática “ensino-aprendizagem”, bem como nortear e redirecionar as práticas escolares. Atenta-se ainda que, a melhor forma de promover um processo de alfabetização e letramento exitoso é oportunizar as crianças um espaço alfabetizador lúdico, onde o aluno possa interagir com o outro e com o objeto mediado pelo olhar atento e comprometido do professor.