ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AS PRÁTICAS E AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AS PRÁTICAS E AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA

Divalnise Emanuelle Albuquerque Costa Guedes

Carlos Medeiros de Monteiro

A leitura tem importância fundamental na vida das pessoas. A necessidade de muita leitura está posta entre todos, haja vista, que propicia a obtenção de informações em relação a qualquer contexto e área do conhecimento, assim como, pode constituir-se em fonte de entretenimento. Para uns, atividade prazerosa, para outros, um desafio a conquistar.

Com isso, urge compreender que a técnica da leitura garante um estudo eficiente, quando aplicada qualitativamente. Tal técnica requer atenção, intenção, reflexão, espírito crítico, análise e síntese; o que possibilita desenvolver a capacidade de pensar. Indiscutivelmente, é preciso saber ler, ler muito e ler bem.

Nessa perspectiva, surgem alguns aspectos e/ou habilidades importantes e que precisam ser consideradas. Ler unidades de pensamento e não palavras por palavras, relacionando tópicos e estabelecendo sentido na sua leitura, seja ela individual ou coletiva; Ajustar a velocidade (ritmo) da leitura ao assunto, tema e/ou texto que está lendo; Avaliar o que se está lendo, perguntando pelo sentido, identificando a ideia central, isso faz com que o leitor interaja com o texto, buscando sentido nas “entrelinhas”, isto é, alcançar sentidos subentendidos na sua leitura, para isso faz-se necessário que o leitor apresente algum conhecimento prévio a respeito do assunto tratado em seu texto; Adotar habilidades para conhecer o livro, indagar pelo que trata determinada obra e se essa vai suprir alguma necessidade e se vai responder as dúvidas do leitor; Discutir com colegas o que lê, centrando-se no valor objetivo do texto, resultando em um conhecimento e vocabulário mais vasto; Adquirir livros que são fundamentais (clássicos), zelando por uma biblioteca particular, assim como, frequentar espaços e ambientes que contenham acervo literário, por exemplo, bibliotecas; Ler assuntos vários, não estar condicionado a ler sempre a mesma espécie de assunto, pois a diversidade de leituras engrandece o léxico nas diversas variedades linguísticas; Ler muito e sempre que possível, considerando a leitura como uma atividade de vida, não desenvolvendo resistências ao hábito de ler, uma vez que leitura é emoção, entretenimento, conhecimento e acima de tudo é prazer. Portanto, ao aprender a ler ou a ler para compreender, o indivíduo executa um ato de conhecer e compreender as realizações humanas registradas através da escrita. Visto que, para alcançar o objetivo esperado, ou seja, a leitura e a compreensão do que se está lendo, sem apenas decodificar, mas além de tudo entender e interagir com o autor, é preciso ler com objetivo determinado, ter uma finalidade, saber por que se está lendo e, com isso, ser um leitor atento.

Atualmente, a leitura não é mais considerada como decodificação de sinais gráficos, letras, palavras, ler vai muito além. Desse modo, quando se trata do tema, a primeira constatação é de que ler consiste em se fazer a “leitura do mundo”. Então, ao ler um texto, sendo textos verbais e não-verbais, é preciso atribuir significados, já que pressupõe que o leitor tenha conhecimentos e que esses vão reconstruir o texto. A partir desse processo, entendemos que ler é acionar todos os conhecimentos de mundo do leitor, fazendo com que os sentidos ganhem uma maior significação, ultrapassando aqueles sentidos de superfície, em que todas as pessoas que sabem ler conseguem reconhecer (MICHELETTI, 2000). É dessa leitura que nasce a construção do real, aparentemente preso nas “entrelinhas” e o leitor salta para a vida e para a realidade, na medida em que a leitura da palavra escrita pode conduzi-lo a uma interpretação do mundo.

Qualquer variedade de texto, desde aquele de aparência mais “simples”, como por exemplo, uma notícia, que seja de linguagem clara e precisa, compreende mais de um nível de leitura. Ao ler, em primeiro lugar, o leitor domina o código e a informação mais rápida; depois a esmiúça, observando as várias partes do discurso e analisando a seleção das palavras empregadas pelo autor, avalia-as na organização da frase, esta na construção do parágrafo e, por fim, volta a fixar-se no todo (KATO, 1999).

Então, após as etapas de leitura de um texto serem vencidas, é necessário estabelecer estratégias, uma vez que, as boas e produtivas leituras são realizadas através delas, a começar pela operação de inferência, em que consiste na criação de significados por meio de pistas contextuais, ou seja, algumas ideias em que o autor vai deixando transparecer ao longo da narrativa, tornando, assim, o leitor mais dependente da informação adquirida e, dessa forma, mais integrador de informações co-ocorrentes. Com esse mecanismo é possível ter-se uma leitura eficiente, pois a interpretação derivar-se-á do contexto, inferida através de pressuposições semânticas e pragmáticas (KATO, 1999).

Portanto, Kato (1999), anuncia que um bom leitor, é um leitor proficiente que determina as estratégias de leitura por vários fatores, tais como objetivando um maior entendimento com a leitura, analisando o grau de novidade do texto, o local do texto, o objetivo da leitura, a motivação da leitura etc.

A leitura pode ser entendida como um conjunto de habilidades que envolvem estratégias de vários tipos. Essas habilidades seriam encontrar parcelas significativas do texto, estabelecer relações de sentido e de referência entre tais parcelas, estabelecer coerência entre as proposições do texto, avaliar a verossimilhança e a consistência das informações extraídas e inferir o significado e o efeito pretendido pelo autor. Para atingir esses objetivos, o leitor utiliza seus “esquemas”, dos quais faz parte a sua Gramática. Os esquemas (e, portanto, a gramática também) contêm, além de regras e taxonomias, um componente de procedimentos (estratégias), que dita como utilizar suas partes para processar os estímulos que recebe ou para codificar intenções.

As estratégias são classificadas em metacognitivas e cognitivas em leitura, em que a primeira consiste em atividades de leitura de natureza metacognitiva, ou seja, explicita os objetivos da leitura (procura o tema do texto, analisa a consistência textual, compara as temáticas do texto com o que se sabe sobre o assunto e observa se as duas informações são coerentes); identifica os aspectos importantes da mensagem; monitora o próprio comportamento para ver se está ocorrendo compreensão, ou seja, observando se o objetivo está sendo atingido; toma ações corretivas ao detectar falha na compreensão; recobra de atenção quando a mente se distrair ou fizer digressões; já as estratégias cognitivas são atividades que pressupõe que o texto apresente ordem canônica e que seja coerente (KATO, 1999).

Para Gray (1960), ao ler um texto, o leitor pode acionar várias habilidades, tais como, perceber a palavra, compreender aquilo que é lido e reagir às ideias apresentadas pelo autor e assimilar o texto. Já Robinsosn (apud SILVA, 1996) incrementa o modelo proposto por Gray adicionando um novo elemento ou habilidade, a velocidade da leitura, afirmando que a velocidade da leitura é uma função da flexibilidade do leitor e natureza do texto. Tal autora, também, redefine as habilidades propostas por Gray; com isso, a percepção envolve reconhecimento e sentido de palavras; a compreensão envolve sentido literal e subentendido e, por fim, a reação envolve julgamento intelectual e respostas emocionais.

Compreender a mensagem, compreender-se na mensagem e compreender-se pela mensagem – eis aí os três propósitos fundamentais da leitura, que em muito ultrapassam quaisquer aspectos utilitaristas ou meramente “livrescos”, da comunicação leitor-texto. Ler é, em última instância, não só uma ponte para tomada de consciência, mas também um modo de existir no qual o indivíduo compreende e interpreta a expressão registrada pela escrita e passa a compreender-se no mundo (SILVA, 1996, pág. 45).

Ensinar a ler é uma atividade exclusiva de todo professor, não só de Língua Portuguesa. Essa ideia refere-se a sua responsabilidade pela dificuldade do aluno de entender e analisar textos e questões de outras disciplinas, porém, é preciso levar em consideração que é tarefa de todos que lidam com o ensino, pois o desconhecimento do que seja leitura e dos processos sócio-cognitivos levam as pessoas a construírem uma limitação relacionada ao ato de ler.

A noção sobre texto, discutida no ambiente escolar, restringe o trabalho com a leitura, porque o texto é abordado apenas como produto, desconsiderando suas especificidades e intenções, abstraindo-se o seu processo de significação, o contexto, as intenções comunicativas e todos os recursos que enriquecem a sua produção.

Apesar do avanço tecnológico que envolve todos os recursos audiovisuais, inclusive a internet, a leitura ainda é o recurso mais importante e fundamental para a realização do processo de transmissão e aquisição de cultura. Por isso, o ato de ler deve ser encarado como elemento indispensável ao aprendizado.

De modo geral, os alunos confundem leitura com a simples decodificação de sinais gráficos. Visto que, os mesmos não estão habituados a entender a leitura como um processo amplo que envolve o leitor com o autor em uma relação de interlocução, pois a leitura é o processo através do qual o leitor interage verbalmente com o autor, por meio de um texto escrito.

Aprender a ler não é uma atividade fácil, porque requer do leitor uma postura crítica, sistemática, uma disciplina intelectual e para se adquirir esses aspectos só é possível através da prática, já que o processo de ler implica vencer as etapas da decodificação, da intelecção para atingir a interpretação e, posteriormente, a aplicação.

A leitura não constitui uma disciplina científica autônoma, mas apenas um objeto de estudo diferente construído e parcelado por um conjunto de disciplinas. Como sendo uma atividade que se ensina e aprende, ela tem sido um objeto de interesse da pedagogia por estar voltada para o ensino e o aprendizado. Apesar de elas terem sempre compartilhado esse interesse, em diferentes graus, com outras disciplinas, como a filosofia e a sociologia - a atenção à leitura ampliou-se nas últimas décadas, para um conjunto de diferentes áreas de conhecimento.

Por esse motivo, a leitura é o resultado de uma produção ou de um trabalho realizado pelo leitor, que busca interagir a informação visual com o conhecimento prévio - enciclopédia ou teoria do mundo - para atingir um objetivo ou atender a um interesse ou uma necessidade.

Segundo Silva (1996), enquanto prática, a leitura associa-se desde seu aparecimento à difusão da escrita (ou numa forma similar a essa), à fixação do texto na matéria livro, de preferência na fase infantil ou juvenil de sua vida, à alfabetização do indivíduo e à adoção de um comportamento mais pessoal e menos dependente dos valores tradicionais e coletivos, veiculados por meio oral através da religião e dos mitos.

Difusamente, as práticas de leitura tendem a marcar os atuais contornos do interesse das ciências sociais a respeito do ato de ler. Ela os marca, primeiramente, em oposição às abordagens frequentes na tradição de estudos psicológicos, pedagógicos, linguísticos e cognitivos sobre o tema que aprendem os processos mentais da leitura e da sua aquisição como um conjunto de processos abstratos e universais, desenvolvidos por um leitor ideal.

Mas, em oposição a essas abordagens, a expressão designa uma tendência a lidar com a leitura em seu acontecimento concreto. Em que esta é desenvolvida por leitores reais e situada no interior dos processos responsáveis por sua diversidade e variação, uma vez que as práticas possibilitam diferentes modos de ler e impõem modos precisos de recepção, levando os leitores a interagirem com o texto.

Outra concepção sobre práticas de leitura é aquela que atribui a essa atividade um valor e uma necessidade sempre iguais e que seriam – ou que deveriam ser – compartilhadas por todos. Visto que ler seria a maneira por excelência de exercício do poder, modificados pelo livro e pelo impresso, tendo sempre um poder emancipador para o indivíduo e constituiria sempre um fator de democratização social e possibilidade de ascensão.

Nem leitura, nem literatura, pois há consistência suficiente para se apresentarem como disciplinas autônomas, porque o ato de ler é um processo de compreensão, de intelecção, de análise e aplicação de que o leitor necessita para interagir com outros leitores e com o autor.

No século XIX e início do século XX, a leitura em voz alta formava o estudante no uso da língua, em especial na expressão oral, respondendo às necessidades da Retórica, ainda dominante na escola. Com o advento da pedagogia, da psicologia e de outras disciplinas, essa prática de leitura não atende mais aos pré-requisitos do ato de ler, porque a leitura não se limita apenas à expressão oral, mas também a todo tipo de leitura que possa ampliar o conhecimento dos leitores, levando-os à interpretação e à compreensão dos textos lidos.

“Ler sem refletir é comer sem digerir”. Analisando esta citação de Marquês de Marica, o ato de ler é muito mais do que decifrar meras letras. Ler está acima do decodificar. Ler é um ato de reflexão. Reflexão esta que precisa ser “digerida”, esmiuçada, para assim podermos dizer que estamos realizando leitura.

Quando falamos de leitura também falamos em aprendizado. Mas porque mencionar o aprendizado? Quando possuímos o hábito de ler estamos aprendendo, já que as mais diversas leituras nos engrandecem em vários níveis do nosso intelecto. O hábito de leitura perpassa por vários tipos de gêneros textuais desde a bula de remédio ao texto literário.

Assim, a leitura é de suma importância para o aprendizado, pois este é adquirido através de métodos e técnicas bem estruturadas levando o leitor ao conhecimento científico, que refletirá num sentido amplo. É também uma das maiores potências do vocabulário e expressão, envolvendo e informando o leitor com ideias, as quais lhe darão enfoques abrangentes para o conhecimento cultural do qual depende o seu progresso na vida.

A leitura amplia nosso entendimento do mundo, propicia o acesso à informação com autonomia, permite o exercício da fantasia e da imaginação, estimula a reflexão crítica, o debate e a troca de informações. É vista em seu significado mais amplo e pode ser entendido como atribuição de sentidos. Pode-se falar em leitura tanto sendo a fala cotidiana, como um texto científico.

Ela é uma condição prévia para a escrita, pois com boas leituras haverá excelentes produções de textos, pois tais leitores além de terem o que dizer, já terão descoberto e recreado mecanismos para fazê-lo. Portanto, leitura e competência escrita caminham juntas. A leitura é um dos meios mais eficazes de desenvolvimento sistemático de linguagem e da personalidade, pois trabalhar com a linguagem é trabalhar com o homem.

Segundo Orlandi (1983), ao ler, o interlocutor interage com o texto, atribuindo, assim, uma significação que resulta não somente no decodificar de palavras, mas, principalmente, na construção de ideias críticas:

A leitura é o movimento crítico da constituição do texto, pois é o momento privilegiado do processo da interação verbal: aquele em que o interlocutor, ao se identificar como interlocutor, desencadeia o processo de significação (Orlandi, 1983.p, 20).

A leitura proficiente não se processa palavra por palavra, mas por blocos, que produzem unidades de informação, podendo um vocábulo, às vezes, constituir sozinho um tipo de unidade. Então, a capacidade de reconhecimento instantâneo de palavras não é produtiva, pois a leitura fluente resulta da compreensão. Poder-se-ia perguntar se a leitura é compreensão de segmentos maiores que a palavra e que envolve sempre um processamento na base de análise e síntese com um bom componente de adivinhação e inferência.

A leitura eficiente é produzida a partir de dois produtos distintos: a) a interpretação poderia, nesse processo, derivar não da palavra realmente vista, mas hipotetizada no contexto, resultando daí uma interpretação inferida através do conhecimento de regras colocacionais e das pressuposições semânticas e pragmáticas; b) seria o entendimento por respostas instantâneas do bloco por poder ele ser extraído, da mesma forma que as palavras visualmente conhecidas, não de um léxico mental, mas, no caso, de um glossário.

Com isso, leitor idealizado é aquele que sintetiza o significado das partes menores para obter o significado do todo. Dessa maneira, pode-se entender que leitura, aprendizado e escrita estão intrinsecamente ligados, pois um não pode se concretizar sem o outro, um implica no outro. Portanto, o leitor imbuído destes processos é capaz de dar significado ao que lê, transformando a leitura em reflexão crítica e em aprendizado, tornando-se o próprio autor de sua história.

A leitura (ou a resultante do ato de se atribuir um significado ao discurso escrito) passa a ser, então, uma via de acesso à participação do homem nas sociedades letradas, na medida em que, permite a entrada e a participação no mundo da escrita; a experiência dos produtos culturais que fazem parte desse mundo só é possível pela existência de leitores.

Sendo assim, o texto sempre depende da disponibilidade do leitor de resumir, numa totalidade, os aspectos que lhe são oferecidos, criando uma sequência de imagens e acontecimentos que desembocam na constituição do significado da obra. Esse significado só pode ser constituído na imaginação, depois de o leitor absorver as diferentes perspectivas do texto, preencher os pontos de indeterminação, sumariar o conjunto e decidir-se entre iludir-se com a ficção e observá-la criticamente, pois, consequentemente, ele aprende e incorpora vivências e sensações até então desconhecidas, por faltarem em sua vida pessoal.

BIBLIOGRAFIA

MICHELETTI, Guaraciaba. Leitura e Construção do real: o lugar da poesia e da ficção – São Paulo: Cortez, 2000.

Kato, Mary Aizawa. O aprendizado da leitura. 5º ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1999.

SILVA, Ezequiel Teodoro da, 1948. O ato de ler: Fundamentos psicológicos para uma nova pedagogia da leitura. 7 ed.- São Paulo: Cortez, 1996.

FARIA, L. M., GALVÃO, A. M. de O. Modos de ler / formas de escrever: estudos de história da leitura e da escrita no Brasil. Luciano Mendes Faria, Organizador; Ana Maria de Oliveira Galvão....[et. Al.], - 2. ed. – Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

GRAY, W. S., SHIPLEY, G. T., HARDY, M. GERSTMEYER, E. E., ADAMS, M. A. O ensino da leitura. Revista de educação, São Paulo, v.7, n3, jun. 1929, p.272 – 292.

GALVÃO, A. M. de O., BATISTA A. A. G. Leitura: práticas, impressos, letramentos. Antônio Augusto Gomes Batista, Ana Maria de Oliveira Galvão (organizadores). – 2. ed. – Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

MANGUEL, Alberto. A última página. In: - Uma história da leitura. (trad. Pedro M. Soares). São Paulo: Companhia das Letras, 1997, pp. 15-38.

ORLANDI, Pulcinelli Eni. Revistas Leitura Teoria e Estudos da Linguagem. Prática Julho, 84 Nº. 1.

Divalnise Emanuelle
Enviado por Divalnise Emanuelle em 07/03/2010
Reeditado em 15/03/2010
Código do texto: T2125315