ORAÇÕES SUBORDINADAS: À LUZ DOS GRAMÁTICOS
ORAÇÕES SUBORDINADAS: À LUZ DOS GRAMÁTICOS
Jamille Araujo
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este trabalho tem como objetivo analisar a posição de alguns gramáticos diante dos processos de subordinação a partir das gramáticas de Rocha Lima, (1985) e Evanildo Bechara (2009), discutindo os conceitos contidos para que se evidenciem os aspectos de cunho divergentes e convergentes. Partindo desses pressupostos, confrontaremos as diversas análises que permeiam o campo das orações subordinadas, buscando exemplos e teorizando os pontos em comum no que dizem tais autores acerca dessas orações.
Procedemos à investigação de alguns compêndios gramaticais, cujo valor teórico é de suma importância para comentar dados referentes às orações subordinadas, considerando a maneira como elas são abordadas pelos diferentes autores analisados. A pesquisa foi realizada a partir de informações diferentes acerca do tema, fazendo-nos indagar sobre como se dá a classificação dos períodos compostos por subordinação, segundo dois gramáticos com particularidades diferentes. Nosso interesse é expor conceituações diversas, no intuito de confrontá-las.
REFERENCIAL TEÓRICO
Tradicionalmente, as orações subordinadas são simplesmente unidades dependentes, porém esta definição apresenta-se vaga, visto que, não define a natureza dessa dependência, que para uns é de ordem sintática, mas para outros deve dizer respeito antes ao sentido.
Ao analisar as orações subordinadas, percebemos que estas estão baseadas estritamente em aspectos sintáticos e para tal, nos deteremos especificamente em alguns autores como Bechara (2009) que, apesar de ser gramático, tem uma visão diferenciada dos demais, perpassando entre a linguística e a gramática tradicional e Rocha Lima (1985), cuja teoria dar-se-á pelo viés da gramática normativa tradicional. Estes autores introduzem quatro estruturas típicas no que diz respeito às orações, ou seja: coordenação, subordinação, correlação e justaposição, sendo que a subordinação, tema o qual iremos abordar, é visto como dependente sintaticamente, para Rocha Lima (op. cit.) e independente do ponto de vista sintático, segundo Bechara (op. cit.).
Bechara, assim como a maioria dos gramáticos tradicionais, classifica a oração subordinada como aquela que exerce uma função sintática sobre outra oração, que é tida como principal. Porém, afirma que pares como quer... quer e ou...ou são identificadores de orações alternativas ou concessivas, o que já menciona um aspecto meramente semântico. (cf. Bechara, 2009, p.496). Para ele, o estudo dos processos de subordinação não se apresenta definitivamente completo, além de não se configurar em comum acordo, não deve ser relegado à investigação puramente sintática, embora também possa se amparar nesta. Para Bechara (op.cit.), as subordinadas são as orações que, independente do ponto de vista sintático, sozinhas têm um sentido completo, ou seja, constituem um enunciado, no entanto, concorda que a oração que serve de suporte a uma oração subordinada denomina-se principal. Ele explica a relação dessas orações complexas pelo fenômeno da estruturação dos aspectos gramaticais conhecidos por hipotaxe ou subordinação.
Bechara (op. cit.) nos conduz a discussões importantes em relação às orações. Entre elas, podemos perceber que na divisão entre oração subordinada e oração principal, nem sempre a oração principal é aquela que detém o sentido mais importante, e isto demonstra que, de nada serve decorar as lista das conjunções, ou memorizar que o porém é adversativo, o ou alternativo, uma vez que, somente a situação comunicativa, na qual a conjunção estará inserida, determinará o seu valor. Neste sentido, observa-se que as orações subordinadas possuem funções e valores sintáticos diferentes, desencadeando num processo de hierarquização, onde as orações são sempre dependentes umas da outras, tanto no aspecto semântico quanto sintático.
A subordinação na perspectiva da Gramática Tradicional, são processos sintáticos analisados dentro do período composto e para tal, faz-se necessário ter em mente a função que cada uma dessas orações possui.
Para Rocha Lima (1985) a oração subordinada é aquela que desempenha sempre uma função sintática de sujeito, objeto direto, objeto indireto, complemento nominal, complemento relativo, aposto, predicativo, adjunto adnominal e adjunto adverbial; figurando entre as funções de adjetivo, substantivo ou advérbio, já que ela é um termo ou parte de um termo vinculado à oração principal. De acordo com a Gramática Tradicional analisada, a relação de dependência da subordinação estaria estritamente vinculada à presença dos conectivos, além de não terem existência própria, como um enunciado independente. Podemos observar que o autor deixa claro não admitir que o objeto indireto seja representado sob a forma oracional.
Um dos aspectos abordados por esse gramático e aceito pela maioria dos gramáticos é a forma como as orações subordinadas adverbiais são caracterizadas, ou seja: causal, concessiva, condicional, conformativa, consecutiva, comparativa, final, modal, proporcional e temporal.
Débora Marques (2007. p.5), em seu artigo A coordenação e a subordinação nas perspectivas tradicional e funcionalista: confrontos, aborda a maneira como a gramática moderna têm tratado os processos sintáticos na subordinação. Ela afirma, com base nos estudos dessas gramáticas, que
“[...] orações complexas são aquelas, numa definição sintaticamente definida, em que a unidade pode ser constituída de uma ou mais de uma cláusula. Podendo, dessa forma, ser constituída de um ou mais núcleos adicionais ou marginais, que são aqueles em que há uma relação de relativa dependência e que possuem diferentes graus de dependência [...]”. (p.5)
Bechara (op. cit.) nomeia as orações subordinadas por “orações complexas”, e as orações coordenadas por “grupos oracionais” visto que, há uma necessidade do autor permear entre os conceitos gramáticos e linguísticos. Dessa forma, há a substituição dos termos coordenação e subordinação por parataxe e hipotaxe, respectivamente. Ele tece uma crítica ao fato de que os gramáticos costumam apresentar a coordenação antecedendo à subordinação, dando a idéia de que aquela é mais importante que esta. Em sua gramática, menciona o fenômeno da coordenação e subordinação ao tratar dos termos da oração, mostrando que ambos podem ocorrer dentro da oração entre estratos do mesmo valor.
As orações denominadas, pela gramática de Rocha Lima (op. cit.), orações subordinadas substantivas, adjetivas e adverbiais são classificadas por Bechara (op. cit.) em orações complexas de transposição substantiva, adjetiva ou de relativo e adverbial. Este, ainda denomina a conjunção integrante que, a qual a gramática tradicional atribui a função de introduzir as orações subordinadas substantivas, transpositor, devido ao fato de transpor as construções que lideram tais orações. Ao tempo em que Rocha Lima (op. cit.) propõe o desdobramento, Bechara (op. cit.) propõe a análise por meio dessa transposição. Para este, a oração transposta deverá ser classificada de acordo à sua categoria. De modo mais específico, poderá ser classificada como substantiva adjetiva ou substantiva adverbial, uma vez que desempenha função sintática composta por adjetivo, advérbio e substantivo. Verifiquemos um exemplo de oração transposta adverbial, dado por Bechara.
ONDE me espetam eu fico. (cf. Bechara, 2009, p.472)
Exemplo de desdobramento:
Não vejo onde você está. → Não vejo o lugar em que você está. (grifo nosso)
Neste caso, são subordinadas adjetivas.
Bechara (op.cit.) aborda as orações subordinadas resultantes de substantivação: as interrogativas e exclamativas, utilizando os seguintes exemplos:
Ainda não sei que vou fazer hoje (cf. Que vou fazer hoje?).
Os garotos não descobriram ONDE os pais tinham posto os presentes. (oração objetiva direta). (cf. Bechara, 2009, p.465 e 469)
Nestes exemplos de transposição, há segundo o autor, “[...] a vantagem de encarar uma realidade da língua, e não uma substituição que a ela nem sempre equivale.” (BECHARA, 2009. p.470)
Quando tratamos de subordinação, é relevante acrescentar a relação destas a respeito da correlação e da justaposição. Para tal, podem-se estabelecer diferenças entre os conceitos mencionados por Rocha Lima (op. cit.) e por Bechara (op. cit.). Este argumenta que a coordenação e a subordinação dizem respeito ao valor sintático de independência ou dependência dentro do período composto; correlação e justaposição se referem ao modo de se ligarem ente si essas mesmas orações. Aquele, diz que ao lado das orações coordenadas e subordinadas são colocados dois tipos diferentes de orações: as correlatas e as justapostas, sendo expressões correlativas as aditivas, as consecutivas e as comparativas.
Bechara (2009, p.319) diz que conjunção “é a expressão que liga orações ou, dentro da mesma oração, palavras que tenham o mesmo valor ou função.” Segundo o autor, as conjunções se dividem em dois tipos: coordenativas, aquelas que ligam palavras ou orações do mesmo valor ou função, e subordinativas, que são aquelas que estabelecem uma relação de dependência entre duas orações por elas ligadas. Observamos então que ambos os gramáticos analisados tratam esses elementos conectores conjuntivos como a classe possuidora da função de estabelecer ligações entre palavras e orações.
O quadro a seguir procura sintetizar algumas semelhanças e diferenças observadas entre as gramáticas analisadas neste artigo, no que diz respeito às orações subordinadas.
Pontos divergentes Pontos convergentes
Bechara (op. cit.) coloca em pontos opostos as orações dependentes e independentes; Rocha Lima (op. cit.) aborda essa oposição entre coordenadas e subordinadas. Analisam as orações subordinadas voltado para o nível frástico.
Bechara (op. cit.) ultrapassa a distinção superficial entre coordenadas e subordinadas; além de questionar a divisão entre oração principal e subordinada. Dividem as orações em quatro estruturas típicas: coordenação, subordinação, correlação e justaposição.
Para Rocha Lima (op. cit.) há uma subdependência na subordinação. Priorizam os aspectos sintáticos em detrimento dos semânticos para definir as orações.
Bechara (op. cit.) nomeia as orações adjetivas conectivas, enquanto que Rocha Lima (op. cit.) utiliza a nomenclatura orações adjetivas desenvolvidas. Apontam conceitos como dependência e independência para distinguir subordinação de coordenação.
O autor Rocha Lima (op. cit.) coloca a
possibilidade de as orações adjetivas converterem-se em reduzidas de particípio
presente, de particípio passado, de gerúndio (em um caso particular) e de infinitivo. Concordam quanto à concepção das orações adjetivas que valem por adjetivos, funcionam como adjunto adnominal e subordinam-se a qualquer termo da oração anterior cujo núcleo seja substantivo.
Associam as justapostas à ausência de conjunções.
Observemos também, a relação que existe entre esses dois autores, quanto a nomenclatura e classificação das referidas orações.
Evanildo Bechara Rocha Lima
Subordinação: oração complexa.
▪ Orações complexas de transposição substantiva: sujeito, obj. direto, complemento relativo, predicativo, obj. indireto, aposto.
▫ Orações subordinadas resultantes de substantivação: as interrogativas e exclamativas.
▪ Orações complexas de transposição adjetiva: ▫ orações adjetivas ou de relativo.
▫ orações adjetivas explicativas e restritivas.
▪ Orações complexas de transposição adverbial: ▫ subordinadas adverbiais propriamente ditas;
▫ subordinadas adverbiais comparativas e consecutivas: orações subordinadas consecutivas. Classificação a partir de dois critérios:
▪ Função: ▫ substantivas: sujeito, obj. direto, obj. indireto, complemento relativo, complemento nominal, aposto, e às vezes, predicativo.
▫ adjetivas: adjunto. adnominal e predicativo.
▫ adverbiais: adjunto adverbial.
▪ Forma: ▫ desenvolvida;
▫ reduzida;
▫ justaposta.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da análise levantada, pudemos perceber que, embora algumas gramáticas apontem para diferenças entre subordinação e coordenação, estas diferenças são semânticas, o que ocasiona a mistura e a indefinição de critérios, pois ora se faz uma análise baseando-se na sintaxe, ora na semântica, o que leva a uma caracterização de cunho dependente e por vezes independente para as cláusulas subordinadas.
Notamos também, que ao exemplificar as orações subordinadas, Rocha Lima (op. cit.) se utiliza de exemplos de natureza literária, fazendo recortes de trechos de obras canônicas, o que os torna insuficientes, uma vez que, na realidade nos deparamos com situações não-canônicas.
Segundo Andrade (2002), há um processo de interdependência no período. Tendo em vista este aspecto, o autor questiona a nomenclatura oração principal, já que as orações obedecem a uma sequência lógica, contribuindo dessa forma, para a compreensão das outras. Desta maneira, entende-se que ambas as orações se constituem para desencadear um significado, portanto, como separar principal de subordinada?
Fica evidente que a contribuição dada por esses gramáticos analisados, enriquece o conhecimento e o uso da língua, porém, não podemos deixar de constatar que uma visão mais aproximada do sentido, torna a expressão do pensamento mais compreensível, haja vista, não haver um consenso geral entre esses estudiosos.
BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Tadeu Luciano Siqueira. Revendo a Coordenação e a Subordinação nas gramáticas e no Ensino do Português. In. Estudos de Sintaxe. Cadernos do Congresso Nacional de Linguística e Filologia. Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos. Ano VI, nº 9. ISSN 15198782. p. 10 à 20. 2002.
BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. Ver., ampl. E atual. Conforme o novo Acordo Ortográfico. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.
MARQUES, Débora. A coordenação e a subordinação nas perspectivas tradicional e funcionalista: confrontos. In. Derandina Revista Eletrônica, Juiz de Fora - MG, p. 05. 2003.
Disponível em :< http://www.darandina.ufjf.br/edicao1.html>. Acesso em 18 agosto 2009.
ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. Gramática Normativa da Língua Portuguesa. 26. ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1985.