O que é a Ira

O que é a Ira

A Ira tem origem com o surgimento das espécies.

Se acompanharmos a evolução das espécies, verificamos que todas as formas de substância viva são capazes de responder com excessos, transmutando-se de sensíveis em atuantes, quando afetadas pelos chamados “estímulos” ou “excitantes”. Toda célula viva tem essa propriedade denominada de “Irritabilidade”.

No itinerário evolutivo das espécies ocorreu o aumento da complicação estrutural da substância e apareceram os chamados “órgãos de secreção e de movimento”, mediante os quais certas plantas e a quase totalidade dos animais se defendem e atacam.

Entretanto, somente na parte superior da escala animal encontramos formas de irritabilidade que sejam motivadas por impulsos e necessidades internas surgidas no organismo do animal. Neste caso, não é a presença, mas a ausência de certos estímulos convenientes (ar, alimento, etc.), que irrita o ser e põe em marcha acelerada seus dispositivos de ataque ambiental.

Em psicologia, essa forma de comportamento, equivalente à conduta invasora do animal no seu espaço vital é denominada “Agressividade”: a Irritabilidade se desencadeia sem causa aparente nem presente.

Entretanto, o homem no topo da escala evolucional, além de trazer dos ancestrais a Irritabilidade Celular e a Agressividade Animal, evoluiu a reação aos “estímulos” acrescentando a manifestação do “desejo de poder”.

Os objetos do desejo de poder são variáveis: saúde; dinheiro; fama; pureza; mando; saber; liberdade; beleza; etc. Mas o desejo de poder é constante.

A presença das guerras nos leva a concluir: somente as espécies do reino hominal, os homens, são capazes de assassinarem-se mediante um plano, estratégias, táticas e utilizando a ciência.

Por ambicionar demais o homem é vítima dos maiores temores. Por isso é também o mais irascível de todos.

Emilio Myra y López afirma no seu livro “Gigantes da Alma” que a Ira só nasce graças ao Ventre Negro do Medo, apesar de o homem ter os ingredientes – Irritabilidade Celular; Agressividade Animal e Ambição Humana.

A centelha da Ira é a consciência ou a ameaça do fracasso.

A Ira procede do Medo. Nasce sempre que o pavor nos assalta, sem nos aniquilar, e volta-se contra ele, atacando-o. Porém o alívio que nos proporciona é efêmero e perigoso; pode converter-nos em bestas humanas.

A Ira, juntamente com o Medo são dois sentimentos necessários e importantes para a sobrevivência do ser humano que, desde os primórdios, sempre precisou descobrir, através dos instintos, o momento de lutar (Ira) e o momento de recuar (Medo) diante dos perigos que a vida lhe impunha.

Se procurarmos o conceito do termo Ira nos dicionários, vamos concluir que é impulso violento contra o que nos ofende e sinônimo de cólera, raiva, fúria, zanga. Entretanto, tendo a consciência ou ameaça do fracasso como centelha, então a Ira apresenta-se como uma intenção defensiva contra o Medo.

A Ira é um sentimento que fomenta energia e coragem de lutar pelo que se quer, e leva à exposição e à ação. É um sentimento sustentado pela incapacidade de gerenciar uma situação.

A principal característica da Ira é que nos posiciona ativamente diante das situações e das pessoas, bem como na direção do que queremos como meta de vida.

A Ira tem seu lado negativo e seu lado positivo.

O lado negativo da Ira é a capacidade de destruir o objeto, pessoa, ou situação “sentida” como ameaçadora. Puro instinto de sobrevivência. Sentimentos e necessidades de ninguém são levados em consideração e, às vezes, nem os próprios sentimentos, pois pensamento e ação estão dirigidos para seu foco: sobreviver a qualquer custo.

Temos vários exemplos sobre este traço extremo na história da humanidade: Hitler é o mais divulgado.

O lado positivo da Ira é a capacidade de ser assertivo e construtivo frente a uma situação ou pessoa. Neste caso, está presente o senso de consciência de quem se é e do que se quer.

Para entendermos o processo da manifestação da Ira é interessante mencionarmos a teoria do Sujeito-Objeto.

Esta teoria coloca a idéia de que existem apenas duas coisas em nossa existência, eu, o sujeito e o não-eu, o objeto. Tudo o que sentimos, desde nosso nascimento, são emoções e sentimentos em resposta ao objeto, no caso estímulo.

Assim,teremos estímulos do mundo externo ao sujeito, que são as coisas, os fatos, os acontecimentos, e os estímulos internos, que são nossos sitemas fisiológicos, nossa bioquímica, etc.

A Ira manifesta-se ao processar-se um estímulo. A Ira está dentro e não fora. É a reação e não o estímulo. A Ira é reação derivada da interpretação que fazemos ao estímulo.

E a interpretação será condicionada pelo estado psicológico daquele instante, ou daquela fase da vida. O mesmo estímulo pode gerar raiva em um momento, compreensão em outro e, ainda, compaixão em um terceiro.

Daniel Goleman, autor do best-seller Inteligência Emocional, explica que temos, na parte mais primitiva de nosso cérebro, um órgão chamado amígdala. Sua função seria a de desencadear respostas aos estímulos ambientais originados de causas ameaçadoras. É a amígdala a primeira a perceber uma cobra, por exemplo. E, antes mesmo de informar o córtex, a parte racional do sistema nervoso, a amígdala já disparou um estímulo aos músculos das pernas, que reagem afastando-nos do animal mortal. Só que a amígdala é burra. Não sabe diferenciar uma cobra de um pedaço de corda no chão. Reagir é sua função, não interpretar. Quem interpreta é a razão, que é mais lenta.

Os tipos e os graus de intensidade de manifestação da Ira, por ser ela diretamente proveniente do Medo têm sempre algo dele em suas entranhas.

Quando é mínima a presença do Medo, a Ira apresenta-se na sua mais pura e intensa manifestação: em forma de raiva ou fúria. Quando é máxima, interioriza-se e o ser adquire a palidez mortal do Rancor. Quando se estratifica, ou torna-se crônica, “a Ira em conserva”, adquire a loucura do Ódio.

Manifesta-se desde sua forma mais leve, como um sentimento de exaltação atinge graus mais intensos como o da Raiva e chega ao limite da Fúria.

O que diferencia o grau de intensidade são a potência da ofensiva e o nível de controle da conduta individual, ou seja, o desenvolvimento moral e psicológico do indivíduo.

Na intensidade de Irritação, por exemplo, não nos detemos num justo limite da ofensiva. Só nos damos satisfeitos quando a reação o foi mais violenta e nociva do que o motivo da irritação.

Na Raiva a Ira se apodera por completo da direção da conduta individual e, na Fúria o sujeito não só perde o controle de seus atos, mas inclusive a consciência ou percepção dos mesmos.

É por isso que em todos os códigos admite-se como atenuante (ou até como isenção) a “obcecação” e o “arrebatamento” desencadeados pela Ira.

O Ódio é a “ira em conserva”, ou seja, uma atitude iracunda (irada, enfurecida, raivosa) que se estratifica, quando a Ira não é totalmente descarregada ou satisfeita, pela insuficiente descarga de seus impulsos destrutivos.

O Ódio aumenta à medida que o sujeito é mais semelhante a nós, isto é, que seus atos sejam mais equivalentes aos nossos. Pode-se dizer que muitas vezes usamos os nossos semelhantes para odiar e censurar neles as nossas fraquezas.

De todos os males criados pela dança desses dois gigantes da alma, o Medo e a Ira, o Ressentimento é o que nos traz mais sofrimento e que nos deixa praticamente indefesos.

O Ressentimento é gerado pelo Ódio, quando as ações necessárias para objetivar sua manifestação não são possíveis (covardia, inferioridade, incapacidade etc).

A Ira pode ser domesticada da mesma forma como as feras podem ser domadas.

Esses enormes núcleos energéticos, que constituem as gigantes paixões e impulsos primários, são semelhantes às fontes de energia natural: é preciso pô-las a serviço do desenvolvimento. Da mesma forma como Fogo, Água e Ar foram transformados pela técnica em forças produtivas, devemos usar a Ira sem nos consumirmos.

Emoções assumem a forma do vaso que as contém, no caso, nós. Somos irritados pela conjunção de duas causas: pela existência de um estímulo com potencial irritante e por que nos permitimos ser afetados pelo potencial irritante do estímulo.

Se quisermos transformar a ira destrutiva e anuladora em impulso construtivo e progressivo, nos esforcemos até a melhor compreensão recíproca dos termos – o sujeito e o objeto. Então, a Ira se transformará em segurança e determinação, que irão produzir esforços disciplinados que, por sua vez, poderão gerar valor.

Não é exato que a alternativa iracunda seja destruir, ou destruir-se, anular, ou anular-se. A verdade é que, no caso do homem, se oferece outra variante, pela qual o “instinto de morte” se converte em força criadora. Tal variante é representada pela derivação dos impulsos iracundos para a “aventura exploradora”.

A Ira pode transmutar-se em curiosidade e diluir-se em trabalho explorador. Pode também sublimar-se em gestos de conquista, de simples afirmação do poder individual em um terreno, que não ocasione sofrimento alheio: tal é ocaso dos recordistas, dos campeões, dos colecionadores.

Para superar as manifestações da Ira, observemos o desconforto que produzem em nós.

Devemos manter uma atitude de vigilância, atitude mental capaz de testemunhar o que estiver ocorrendo e sem a intenção de julgamento, mas voltada para recuperação da clareza mental. Uma atitude vigilante capaz de investigar como aquela manifestação da Ira surgiu e de escutá-la, ouvindo quais forças precisamos desenvolver para evoluirmos.

Como estamos no meio do percurso evolutivo do homem, é certo que novos tempos serão caracterizados por um homem capaz de utilizar essas dádivas, para assegurar sua sobrevivência na construção de uma sociedade voltada para a cooperação, preservação e convivência pacífica.

Paz, justiça e amor não serão utopias, ou temas de poetas e futurólogos, mas atributos das criaturas mais próximas da Casa do Criador.

“Recado de Ira” é esforço em rimas, que entendemos insuficiente, para cantar o gigantismo desse impulso, dádiva da sabedoria universal, para garantir a sobrevivência em remotas eras.

Fontes:

Gigantes da Alma – Emilio Mira y López;

Inteligência Emocional – Daniel Goleman;

mariab9@uol.com.br;

pensandobem@abril.com.br ;

wikipédia.

Recado de Ira

Fui, do Criador, doação,

para dar a vida continuidade.

minha primeira manifestação,

foi, na célula, a irritabilidade.

No homem, minha gestação

deu-se no ventre do Medo,

na união, mantida em segredo,

entre agressividade e ambição.

Tu, ainda, homem-anão,

pequeno em evolução,

foges da tua missão,

que é usar-me na construção.

Converti a cruz em espada,

fui : fogueira nas Inquisições;

holocausto nazista;

ódio entre raças ou religiões;

massacre de Anabatistas;

guerras; e revoluções.

Quando a mão que sevicia, afagar;

quando a boca caluniadora, calar;

quando o fogo destruidor, fecundar;

então, serei Ira do caminhar,

para a Casa do Pai retornar;

então, serei Ira do caminhar,

para a Casa do Pai retornar.

J Coelho
Enviado por J Coelho em 13/02/2010
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