O SER E O NÃO-SER DO INTELECTUAL LATINOAMERICANO
Nada mais justo que cada país, ou unidade cultural, prestigie os seus grandes homens. Cada grupo destaca especialmente aqueles que mais contribuíram para a sua identidade cultural. Nos Estados Unidos, por exemplo, especial destaque é dado aos descobridores de novas máquinas e instrumentos. Relativamente são poucos os intelectuais, no sentido clássico, prestigiados pela sociedade norteamericana. O norteamericano é mais pragmático e menos intelectual. Mesmo assim há bom número de economistas, sociólogos, educadores e filósofos que caracteristicamente são intelectuais norteamericanos.
Na Europa os intelectuais já são bem mais prestigiados, pois se entende que eles imprimem a identidade cultural a cada povo, e dinamizam a vida, orientando o progresso e o bemestar através de suas ideias, intuições e críticas. Dali a importância dos filósofos, dos escritores, dos cientistas sociais na cultura europeia.
E na América Latina?
Infelizmente ainda não existe em nosso continente uma intelectualidade suficientemente numerosa com identidade tipicamente latinoamericana. Embora haja referência a filósofos, escritores, sociólogos, educadotes, etc... que se destacaram na América Latina, é, no entanto, raro encontrar quem desenvolva um pensamento e uma análise das questões latinoamericanas a partir da América Latina. Só muito recentemente começou a crescer a consciência latinoamericana, mas ainda numa exígua minoria de intelectuais do continente.
Quase todos os nossos intelectuais consideram superior o que vem da Europa e dos Estados Unidos, e inferior o que se refere à América Latina. Preferem ser intelectuais de 2a. ou 3a. categorias, em relação à Europa e Estados Unidos, a se identificarem como intelectuais latinoamericanos inculturados. Isto, naturalmente, é lamentável, e revela a alienação de grande parte dos nossos intelectuais. Dali também a pouca consideração que merecem do povo em geral. Esperamos poder contribuir para que esta situação um dia se reverta. Pois entendemos que a sociedade latinoamericana apenas conseguirá humanizar-se na medida em que conseguir suficientes intelectuais inculturados, para que sejam os mentores, os analistas, os críticos e os construtores de nossa realidade social e e cultural.
É necessário que a sociedade latinoamericana prestigie 100% mais os seus intelectuais. Mas somente aqueles que exercitam a sua intelectualidade de forma inculturada a partir da América Latina. De fato, não interessam aos latinoamericanos intelectuais simples imitadores ou caudatários daquilo que foi pensado e proposto na Europa ou nos Estados Unidos. A esperança de que um dia possamos ter um continente humanizado, com uma economia, uma educação e uma cultura tipicamente latinoamericanas somente se concretizará quando nossos intelectuais deixarem de ter vergonha de serem latinoamericanos. Pois, enquanto persistir esta vergonha também persistirá o vergonhoso desejo, de grande parte de nossos intelectuais, de se evadir da América Latina.