Estatística e Realidade
Todos os diretos reservados ao O GLOBO – INFOGLOBO.
A publicação deste artigo neste site não possui finalidades comerciais e profissionais.
Estatística e Realidade
Os dados mostram um avanço inegável da segurança pública no Rio de Janeiro nos últimos dez anos. Também é certo que iniciativas como as Unidades Pacificadoras são altamente empreendedoras e ousadas. Pretendem devolver ao Estado áreas antes dominadas por um cruel poder paralelo, ou melhor, devolver o Estado para pessoas antes dominadas por aquele poder outro. Que devemos comemorar, sim, mas prudentes como sábios, e ainda insatisfeitos, como estrategistas para os quais, somente a vitória final realmente interessará.
O número de homicídios por cem mil habitantes, por exemplo, caiu de cerca de 43 há dez anos, para cerca de 34 em 2009. Para alguns, um belo progresso, para outros, uma queda tímida que revela nossa insuficiência em gestão pública.
Trinta e quatro homicídios por cem mil habitantes é, na realidade, um número pavoroso de tão alto, e mesmo que nos próximos dez anos a taxa caísse, por exemplo, para 23, seguindo a tendência de declínio da ultima década, ainda assim teríamos uma das taxas de homicídio mais vergonhosas do planeta, e isto em uma cidade global, sede de mega-eventos mundiais, conhecida no mundo inteiro e visitada por turistas de todas as partes do globo. A taxa de homicídios de Londres, por exemplo, é 15 vezes menor do que a do Rio, ou seja, algo em torno de 2,26. Para podermos contextualizar melhor tal questão, vejamos qual a maior taxa de homicídios por cem mil habitantes, não de uma cidade, mas de uma nação européia. A taxa de Portugal, é de 2,15, sendo considerada a pior taxa de toda Europa Ocidental, mas quando se leva em conta a União Européia, a Lituânia aparece na incômoda primeira posição, com 8,13 homicídios por 100 mil habitantes, segundo dados da ONU. De acordo com jornal local de Portugal, o “Público 20”, que divulgou a pesquisa da ONU, a cidade de Lisboa, com uma população um pouco superior a dois milhões de habitantes, registrou apenas 15 homicídios em todo ano de 2005, o que soma menos de 1 homicídio por grupo de cem mil habitantes.
Obviamente nossa realidade revela-se outra, e outros, nossos processos históricos e sociológicos, daí que nosso empenho em mudar e nos permitirmos almejar taxas tão baixas como algo exeqüível, também deva ser outro, diferente, pois, daquele que sempre nos acompanhou. Não basta comemoramos estes dados que nos apresentam, sem que empreendamos, todos, Estado e sociedade civil, profundas reflexões e ações em prol de transformações culturais realmente significativas. O problema de segurança pública, deve passar inexoravelmente pela questão de uma educação forte e eficiente para nosso povo. A simples repressão ao crime, no máximo fará com que nossas taxas continuem a cair, com sofreguidão, pelas próximas décadas. Somente mudanças outras, mais profundas, que formem cidadãos educados, instruídos e informados, com acesso a trabalho digno, não permitirão, a partir do interior mesmo de cada cidadão, que o crime se alastre pelas mentes e ruas cariocas e brasileiras. Enquanto isto não ocorrer, e homens continuarem a exercer podres poderes, como diria Caetano, “cada paisano e cada capataz, com sua burrice fará jorrar sangue demais”... E nos refestelaremos em mil carnavais, enquanto a realidade nos espera logo ali, na quarta feira de cinzas.
Artigo originalmente publicado no endereço abaixo:
http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2010/02/09/estatistica-realidade-nos-dados-sobre-crimes-no-rio-915821323.asp
Todos os diretos reservados ao O GLOBO – INFOGLOBO.
A publicação deste artigo neste site não possui finalidades comerciais e profissionais.