A Tristeza Que Nos Causa A Superficialidade
Por Vinicius Carvalho da Silva
Após anos de Academia e o contato com aquela efervescência intelectual típica da pesquisa cuidadosa, acabamos por perceber a vasta riqueza cultural que advêm da tradição emanando dos antigos aos contemporâneos. Tantos são os indeléveis princípios morais assentados nas mais profundas pesquisas em Ética, Direito, Política... Da Ética de Aristóteles ao princípio categórico de Imannuel Kant, dos ensinamentos sapienciais de Buda, no Oriente, á moralidade Cristã no Ocidente... Da filosofia Moral e Política, da Doutrina do Direito, da Antropologia Cultural e filosófica, da Sociologia, enfim, das perenes idéias socráticas, das análises culturais de um Claude Lévi Strauss, das ponderações penetrantes e arrojadas de brasileiros como Milton Santos e Darci Ribeiro, da reflexão acurada de tantos juristas, tanto como a respeito do fenômeno da Justiça, quanto como em torno dos fundamentos do Direito e da Democracia... Enfim um oceano de sabedoria acumulado em milhares de anos de História da Cultura se estende à nossa frente para que possamos escolher sabiamente, autênticos parâmetros para a vida pública.
Sejam quais forem suas raízes, devem de ser profundas, e rijo o vosso tronco. Tais parâmetros devem ser como princípios transcendentais – verdadeiras orientações para o espírito quanto ao modo de viver, e viver melhor, em sociedade. Qualquer pensamento não superficial basta para que saibamos que fatos particulares não podem ser parâmetros para a vida pública. Ora é falaciosa a tentativa de generalizar o ingeneralizavel, de universalizar aquilo que é sumamente particular. A superficialidade causa-nos, então, tristeza. Como a atuação de um órgão isolado, em um julgamento sem processo, em que apenas sete pessoas possuíam o direito a voto, como dizer que tal evento é um parâmetro para a vida publica? Logo em um país tão carente de parâmetros autênticos, sublimes, verdadeiramente sólidos. É tal como se, tendo Villa Lobos, Ernesto Nazareth, Radamés Guinatari, Guerra Peixe, enfim toda uma vasta e rica tradição, encolhêssemos como modelo estético-musical uma apresentação específica de uma única banda marcial. Com tanta tradição à nossa frente, como dizer que a atuação do CNJ é o nosso parâmetro? Como dizê-lo? O Globo, nesta semana, o disse. Com tão vasta literatura da moralidade, sendo tão alto o edifício da reflexão em Ética, Democracia e Doutrina do Direito, somente um ignorante menosprezaria esta tradição em detrimento de adotar como parâmetro um caso isolado.
Diante disto, por que não silenciar-me? Há anos atrás houve um evento chamado “O silencio dos intelectuais” que abordava tamanha apatia de pensamento em face de um processo social tão contraditório e fugaz. Ora , quando nos calamos, somos culpados por omissão. É nossa própria petrificação intelectual que nos condena. Para Okada, pensador Japonês, os imaturos que se contam aos montes mesmo entre os homens públicos “procuram exagerar e fazer alardes de questões insignificantes, sem se dar conta de que estão atraindo o desprezo dos esclarecidos. Seu comportamento nada mais é que a demonstração de sua inferioridade. Tais indivíduos são, infalivelmente, umas nulidades, homens de conceitos restritos. Certamente é por causa de tantos elementos sem maturidade que não se consegue chegar a conclusões e resoluções rápidas nos debates políticos de hoje. O problema é que os esclarecidos se retraem no silêncio, por detestarem discutir com gente teimosa (...) O indivíduo honesto, mas fraco, não é um honesto autêntico e sim um pusilânime”. Em acordo com tal filosofia moral é que não posso confortar-me no silêncio diante de tal estapafúrdia diretriz, que qual móbile, oscila entre a superficialidade dos ingênuos e a acidez da choldra ignóbil. Santo Agostinho, o filósofo patrístico, em suas Confissões diz: “Encontrei muitos com desejo de enganar outros, mas não encontrei ninguém que quisesse ser enganado”. “O Globo” ao apresentar em sua Opinião, como um parâmetro para a vida pública a atuação do CNJ no caso Roberto Wider, é como se quisesse ludibriar-me, prestando o imenso desserviço, como veículo de comunicação em massa, de, ao invés de fomentar uma reflexão social profunda sobre a vida pública, lançar ao vento, sem base, simplória opinião.
Na encíclica Fides et Ratio do Sumo Pontífice João Paulo II há o seguinte trecho: “Não há moral sem Liberdade (...) se existe o direito de ser respeitado no próprio caminho em busca da verdade, há ainda antes a obrigação moral grave para cada um de procurar a verdade e de aderir a ela...”. Não me parece que a Verdade em matéria de Vida Pública, que há de ser sublime, penetrante e universal, possa emanar do julgamento inconstitucional do CNJ ao desembargador Roberto Wider, fato que, além de particular na história, porque inédito, individualizado também no espaço, porque restrito às searas do CNJ.
Se o “O Globo” satisfaz-se com parâmetro tão duvidoso, quiçá em flerte anacrônico com raias repulsivas, posto que inconstitucional e logo antidemocrático, proponho ao Brasil, cá de minha parte, que vá buscar os seus parâmetros em sesmarias mais nobres, lá de onde, a partir de uma reflexão moral profunda, possam nos advir as bases autênticas de uma real Democracia.