O HOMEM E A TÉCNICA
O homem se relaciona com a realidade através de experiência sensível. Este é o primeiro e o único elemento de que dispomos a fim de nos assegurarmos de que algo exterior existe e nos envia mensagens. Algo de estranho encontra-se ao alcance de nossos sentidos. Mas este estranho que nos limita esta encerrada em nossa subjetividade: para além da cadeia de nossas sensações, nada sabemos desse mundo exterior, nada sabemos que não seja de antemão integrado em nós mesmos, filtrado por fugidias percepções. Conhecer a realidade significa, pois, interpretar as suas mensagens de forma a conferir-lhes objetividade. Significa, não apenas tocar e sentir o real, mas desvendar a sua estrutura e suas leis.
Acontece, porém, que interpretar objetivamente as mensagens do mundo exterior exige, de nossa parte não apenas um aparato lógico extremamente desenvolvido, mas também uma certa independência das relações afetivas, familiares e existenciais. O homem, segundo Einstein, procura sempre de algum modo adequar, plasmar para si uma imagem do mundo claro e simples, e vencer assim o mundo da existência, esforçando-se por substituí-lo por uma imagem. Muitas das vezes, o mundo da existência, quotidiano e vital, é ainda um mundo hostil e desconhecido, e o homem, sem condições de substituí-lo por uma imagem objetiva. Ainda incapaz de submetê-lo às relações lógicas do discurso científico ou de penetrar na sua regularidade, cria para si uma imagem desse mundo que é muito mais a projeção de seus temores, de seus desejos, de sua afetividade.
È nessa tentativa de representar o mundo de alguma forma que surge a técnica como aparato para um possível meio que possa explicar a natureza. O homem, nesse sentido, se relaciona com a técnica. Esta, por sua vez, foi criada pelo próprio homem a fim de responder variados tipos de questões que até então perseguem a consciência humana. A técnica possui, ainda, a característica de: nada adorar, nada respeita; tem apenas uma função: despojar, aclarar, em seguida utilizar racionalizando, transformar tudo em meio. Muito mais do que a ciência, que se limita a explicar “como” as coisas acontecem, a técnica é desacralizante, pois mostra pela evidência e não pela razão, pela utilização e não pelos livros, que o mistério não existe. (ELLUL, 1968, p. 147)
Mesmo com toda essa característica, a técnica traz em si um grave problema: dela ser absolutizada de tal forma que a impede de enxergar seus limites. Especialmente em meio a uma época que tanto a ciência quanto a técnica tornaram-se elementos dominantes. Quanto que na verdade é justamente a reflexão filosófica, a humanização que possibilitará a técnica e a ciência a uma auto-reflexão. Pois:Desde a pré-história o conhecimento tem sido também uma tentativa de controle do ambiente e de manutenção de uma relação de equilíbrio entre o homem e o meio. Mas nem sempre, nem em toda parte, o saber apareceu como um crescimento, nem sempre nem em toda parte apoiou-se na cooperação dando lugar a instituição baseadas na colaboração e no uso de uma linguagem com aspiração de universalidade . (ROSSI, 2000. p. 48)
Portanto, a interferência humana na concretização da técnica e da ciência possui em si a finalidade de uma junção entre humanização e técnica. Resultando, assim, uma técnica mais racional por perceber sua funcionalização à dialética. Em suma, é em favor do homem e de sua autogênese que o filósofo deve levantar a voz, como a consciência da humanidade. Sua palavra se volta ao encontro, por isso é mediadora de humanização .
REFERENCIAS:
ELLUL, Jacques. A técnica e o desafio do século. Tradução de Roland Corbisler. São Paulo: Paz e terra, 1968.
OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e racionalidade moderna. São Paulo: Loyola, 1993.
ROSSI, Paolo. Naufrágios sem expectador – a idéia de progresso. Tradução de Álvaro Lorencini. São Paulo: Unesp, 2000