Anemias: Uma Revisão Para Leigos.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 30% da população mundial é portadora de anemia, que pode afetar crianças, gestantes, lactantes, meninas adolescentes, mulheres adultas em fase de reprodução, homens e idosos de modo geral. A prevalência entre as crianças menores de 2 anos pode chegar a quase 50%.
A anemia é uma das desordens mais comuns do sangue, que, dentre outras funções, é o responsável pelo transporte de oxigênio dos pulmões para os tecidos. Esse trabalho de oxigenação é realizado pela hemoglobina, uma proteína existente no interior dos glóbulos vermelhos, também chamados de eritrócitos ou hemácias. Cabe à hemoglobina a função de transferir oxigênio e outros elementos químicos necessários para a sobrevivência celular, pois é dentro das células que ocorrem milhares de reações bioquímicas que mantêm o organismo em funcionamento.
Conceitualmente, a anemia é a falta ou redução de glóbulos vermelhos no sangue, bem como o baixo teor de hemoglobina, parâmetro mais estável e confiável, que consta em todos os hemogramas. Para que haja a oxigenação correta de todos os tecidos corporais, a taxa de hemoglobina tem que estar em níveis adequados: acima de 13 g/dL para homens, 11,5 g/dL para mulheres e 11 g/dL para gestantes e crianças entre 6 meses e 6 anos. Valores abaixo destes patamares sugerem anemia.
Há várias maneiras de classificar as anemias. As principais delas são através do tamanho médio dos glóbulos vermelhos (VCM), da sua cor (HCM/CHCM), do tipo de resposta da medula óssea (boa ou má), do formato das células vermelhas e da hereditariedade, dentre outras formas. Existem, portanto, dezenas de tipos diferentes de anemia.
A anemia é caracterizada por vários sintomas. As queixas mais comuns das pessoas anêmicas são cansaço, fraqueza, falta de ânimo e sonolência. Palidez da pele e das mucosas é o sinal mais evidente. No entanto, podem existir outros sintomas ou sinais, geralmente associados à sua causa ou à piora de doenças coexistentes.
Existem várias causas de anemia. A carência de ferro é a mais frequente em todo o mundo. Nas crianças, é proveniente de má alimentação. Nos adultos, perda de sangue (nas mulheres pela menstruação e nos homens por meio de sangramento digestivo) é a responsável habitual pela escassez desse mineral no organismo.
Outras carências também resultam em anemia, como, por exemplo, a falta de vitaminas B12 e B9 (folatos), que leva ao surgimento da anemia megaloblástica. Há, ainda, as anemias hereditárias, tais como a falciforme e as talassemias, cada vez mais diagnosticadas. Além disso, a anemia pode ser consequência de várias doenças primárias da medula óssea, como a leucemia, o exemplo mais assustador, ou não-primárias, como é o caso das anemias associadas a reumatismos, doenças renais ou endócrinas, etc.
Os fatores desencadeadores dependem do tipo de anemia. Como já foi mencionado, na falta de ferro, a má alimentação e as perdas de sangue são os mais comuns. Nas hereditárias, a má hidratação, a alimentação errada e as infecções são os “gatilhos” mais freqüentes de piora do quadro.
No que diz respeito ao tratamento, o mesmo consiste em reverter a causa da anemia, além de reverter a própria. Por exemplo, a anemia ferrocarencial secundária à perdas menstruais excessivas em uma mulher, é corrigida com a redução da menstruação e reposição do ferro perdido com o sangue. Vale dizer que para cada mililitro de sangue perdido cerca de 1 mg de ferro é eliminado junto.
Há quem diga que a anemia pode evoluir para problemas mais graves, como leucemias. Este é um mito antigo que precisa ser revisto. Habitualmente, a maioria delas não se transforma em leucemia. Existem, entretanto, alguns tipos raros de anemia que podem "avançar" para leucemia, como a aplásica e as mielodisplasias. As carenciais, todavia, não evoluem para câncer. Por outro lado, uma anemia carencial pode decorrer de um câncer, razão pela qual todas as anemias precisam ser devidamente investigadas.
Em se tratando de prevenção, uma boa alimentação, uma menstruação “normal” e visitas regulares ao médico podem, por exemplo, prevenir uma anemia ferropênica. Mas há certos tipos de anemia que são difíceis de serem previstas, como é o caso das secundárias às leucemias. O que ocorre é que, dependendo do tipo, existe um grupo de pessoas mais propenso a desenvolver essa doença. Em caso de predisposição genética, o contato com certas substâncias tóxicas, como os derivados do benzeno, o tabagismo e a radiação, pode servir de “gatilho" para o surgimento desse tipo de câncer.
O diagnóstico de anemia pode ser feito por meio da realização de um hemograma, que mostrará a queda na contagem de hemácias, da hemoglobina ou do hematócrito. O passo seguinte é buscar a sua causa. Embora os sintomas sejam bem definidos, clinicamente eles podem ser confundidos com os de outras enfermidades, como no caso de problemas na tireóide. A depressão é outro diagnóstico diferencial comum. O hemograma nas outras doenças, porém, pode ser normal.
Apesar da Medicina ter evoluído muito nas últimas décadas, alguns tratamentos atuais são os mesmos de dezenas de anos atrás. A falta de ferro continua sendo tratada com a reposição do mesmo, independentemente do composto usado, além da correção da causa-base. Por outro lado, outras drogas mudaram o perfil de certas anemias, como é o caso da hidroxiuréia na falciforme, e o mesilato de imatinibe na leucemia mielóide crônica e sua consequente anemia nas fases avançadas.
Assim, toda e qualquer anemia deve ser devidamente investigada e tratada. Chega de, apenas, ofertar ferro para todos os anêmicos...
Leal FP. Anemia: danos que causa ao organismo; Revista Mídia e Saúde, agosto de 2007, n° 66, ano 6, pp. 12-13.
Obs.: Publicado com alterações.