CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NA FORMAÇÃO DE ADOLESCENTES PROTAGONISTAS

CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NA FORMAÇÃO DE ADOLESCENTES PROTAGONISTAS

Autora: Aldenôra Vieira.

Co-visão: João Beauclair.

“Aprendi dentro de um contexto psicopedagógico que o essencial não é somente o textual e gramatical: o processo vai além, pois está subscrito, representando formas de vida, valores, conceitos, individualidades, singularidades, afetos, dificuldades, excessos, sexualidade, talentos, medos. Através da escrita representamos formas de vidas e em cada escrito estão imbuídos por entre sinais de pontuações e frases soltas às representações de histórias singulares, e esse é o “olhar-escutar’’. “E só é possível para aqueles que se propõe a se importar com isso de forma atenta, curiosa e pesquisadora, investigadora por excelência.”

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“Tudo caminha, tudo flui, nada está imóvel. O universo é como um rio: ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”. Palavras de Heráclito, citado por João Beauclair, no artigo “A subjetividade do aprendente”. Com esta frase, vinculo ao período da adolescência, etapa difícil e conturbada e ao mesmo tempo vigorosa e grandiosa. Como mergulhar nessas águas profundas do ser adolescente e ter a proeza de saber que é apenas uma etapa da vida onde os conflitos e questionamentos estão sempre presente?

A adolescência apresenta uma etapa da vida onde as transformações físicas, afetivas, cognitivas dentre outras são muito evidentes. É um momento de erupção, de gestar um novo Ser, é fase recheada de conflitos e conturbações. Diversos grupos sociais direcionam preocupações com a formação desses indivíduos que estão incluídos numa nova fase de vida ainda em desenvolvimento deparando-se com um novo momento existencial. A família é o primeiro grupo a sentir e interagir com tais mudanças.

Frente à esse cenário, instala-se um problema na forma como os pais se posicionam, interferindo de modo evasivo na vida dos filhos, muitas vezes querendo criar e estabelecer novos laços de amizade, num momento em que o adolescente necessita de certo afastamento desse núcleo. Objetivando olhar para outras coisas fora da dimensão familiar, interagir com outros “eus e mundos” e com isso, construir sua própria identidade. O momento de “adolescer” e perceber-se não criança, não adulto, provoca grande angústia e sofrimento por ser uma nova etapa, onde os questionamentos e influências hormonais são imensos, ao mesmo tempo que se busca pensar na proposição de usufruir do vigor da juventude: tais águas não retornam mais.

Diante deste contexto, menciono o trabalho desenvolvido durante três anos com grupos distintos de 25 adolescentes, com faixa etária de quinze a dezessete anos, no Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano da Secretária Municipal De Assistência Social e Cidadania (SEMASC).

Neste trabalho, o objetivo estava focado na formação do protagonismo juvenil e formação de multiplicadores na comunidade onde se inserem. Assim surge a oportunidade de banhar-se na descoberta de novos saberes e expectativas. Com esta experiência, num percurso de três anos de atividades em grupos distintos obtive a oportunidade de experiênciar práticas psicopedagógicas estudadas em minha formação como Psicopedagoga. Com os recursos próprios do saber psicopegagógico, com o aprender descobri o olhar psicopedagógico e a essencial escuta as águas do rio não são mais as mesmas.

Segundo Antônio Carlos Costa, (p 75, 1999), a palavra protagonista é formada por duas raízes gregas: proto, que significa “o primeiro, o principal”; agon, que significa “luta”. “Agonista, por sua vez significa lutador”. Protagonista quer dizer então, lutador principal, personagem principal, ator principal. Neste contexto, a oportunidade de desenvolver um trabalho com jovens em situação de vulnerabilidade social e formá-los protagonistas e multiplicadores seria um desafio. Os recursos do olhar e da escuta psicopedagógica favoreceram para elaboração de atividades criativas e diferenciadas, alcançando os objetivos do programa.

Observou-se, com tal olhar e escuta a angústia dos pais no desejo que seus filhos sejam pessoas felizes, projetando em cada um deles a possibilidade de ressignificar perdas de outrora. De acordo com Leda Barone, citando (Freud, 1914, vol. XIV, p. 108):“O<i> amor dos pais tão comovedor e no fundo tão infantil, nada mais é senão o narcisismo dos pais renascido, o qual transformando em amor objetal, inequivocamente revela sua natureza anterior</i>”.

Aqui reside outra importante reflexão: Como contribuir para a formação do adolescente protagonista, se gestados para serem melhores ou iguais os seus pais, e frente a esse pressuposto, durante seu desenvolvimento suprimir suas necessidades de ser outro?

A proposta para o desafio foi aceita e dentre os recursos psicopedagógicos mais utilizados, aprender, escutar e observar foram os mais importantes. A partir de então, houve a necessidade de atividades direcionadas aos problemas e dificuldades sentidas nos grupos, e assim atividades lúdicas propiciadoras ao alcance de metas a serem alcançadas foram desenvolvidas.

De acordo com BEAUCLAIR (2008), “<i>conhecer é um aspecto fundamental na constituição do sujeito e este processo ocorre nas interações entre os indivíduos e deles com o mundo</i>”. Os estudos psicopedagógicos sobre o olhar e a escutar foram fundamentais no desenrolar das atividades em oficinas.

Durante o percurso surgiram os sentimentos como: medo, desconfiança, instabilidade emocional, violência, individualidade, insegurança, baixa auto-estima o carência afetiva, falta do toque, timidez, dificuldades de aprendizagem, sexualidade etc. Em cada jovem percebia-se a singularidade, subjetividade e a necessidade latente de desenvolver boas relações grupais. Foi necessário criar, a partir do olhar e da escuta, atividades que valorizassem a individualidade de cada um em consonância com o todo, ou seja, trabalhando o individual e o coletivo numa relação dialética e dialógica.

O primeiro passo para a realização desse trabalho foi o acolhimento, um momento para elaboração de vínculos e construção da necessária confiança grupal em movimento de gestação. A importância do toque tem um significado de acolhimento. Após essas vivências, momentos de partilha grupal eram vivenciados com os adolescentes compartilhando necessidades, proporcionando ao grupo um crescimento significativo em vista que as dificuldades de uns eram parecidas com as de outros. Nesse momento maior iam sendo construídos laços de amizade, respeito, confiança e motivação. Em outra etapa, desenvolvíamos as oficinas de forma lúdica e construtiva sobre temas transversais, outras de sugestão do grupo e em outras de acordo com a escuta anterior as dificuldades do grupo. Os frutos produzidos destas oficinas eram apresentados e conduzidos para reflexões.

A escuta foi favorável para o crescimento do grupo em vista que não havia um posicionamento unilateral, mas uma proposta para construção mútua das relações. A articulação em observar a singularidade e o tempo que cada sujeito se desenvolvia conforme o viés que a vida criava, através dos momentos lúdicos que proporcionavam no trabalho psicopedagógico reflexão permanente e extrema aprendizagem sobre o tempo e espaço de cada jovem.

Os estímulos promovidos pelo profissional como: motivação, acolhimento, amor, verdade, informação, confiança e respeito foram premissas essenciais durante todo processo. Com o tempo, foi aparecendo o esperado: o conflito, a intempérie, o desequilíbrio. Com outros surgiu à empatia, a motivação, melhoria da auto-estima, dentre outros sentimentos que se afloravam. Assim, neste “espaço transicional”, estava sendo criada a possibilidade de jovens autônomos ou protagonistas no movimento de construção e desconstrução possibilitando que esse sujeito reconstruísse sua própria história, reiniciando movimentos facilitadores à sua autoria de pensamento.

Com oficinas lúdicas e recursos da Psicopedagogia, este trabalho foi extremamente positivo, pois o olhar e a escuta psicopedagógica possibilitaram aos grupos visualizar a si mesmo e o outro. Isso foi possível através da ressignificação de valores, respeito à culturas múltiplas, percepção à importância da formação cidadã para suas próprias vidas.

Esta experiência possibilitou o vislumbrar do colorido em momentos de erros na perspectiva de acertos, como também permitiu a observação do potencial humano de construir, desconstruir e reconstruir, para assim estarmos todos, com aberturas emocionais e cognitivas para os cotidianos desafios da vida.

Assim, o olhar e a escuta psicopedagógica possibilitou a construção de atividades lúdicas específicas às necessidades dos jovens que compõem o Programa Agente Jovem, o qual promovendo movimentações positivas em seus momentos de adolescência fortaleceu vínculos familiares e motivou-os a protagonizarem suas próprias histórias.

Aldenôra Vieira

E-mail: noritavieira@hotmail.com

Bibliografia:

BEAUCLAIR, João. A subjetividade Em Educação. Revista Psique. Psicopedagogia, Edição especial, 2008, p 19.

COSTA, Antônio Carlos. Cadernos Juventude Saúde e Desenvolvimento. Ministério Da Saúde, Secretaria De Políticas De Saúde, Área De Saúde Do Adolescente E Do Jovem. Volume I. p 75, 1999.

BARONE, Leda Maria Codeço. De Ler O Desejo Ao desejo De Ler. 3ª Edição, Petrópolis, 1998. p 37. Citando (Freud, 1914, vol. XIV, p. 108)

Joao Beauclair
Enviado por Joao Beauclair em 08/01/2010
Código do texto: T2018438