Calúnia, difamação e injúria na internet

Prólogo

Não se trata de um texto que vise a ensinar regras gramaticais, ou como se diz comumente a "ensinar português". Cuida, principalmente, de problemas de linguagem que ocorrem em meio ao trabalho dos envolvidos com a Ciência Jurídica e Social (Direito).

Os pequenos problemas identificados pela sociedade tais como: benevolência das leis, corrupção galopante, nepotismo, tráfico de influência e outros, dessa ciência, podem ser resolvidos com a conscientização das próprias deficiências humanas e com o estudo autodidático dos homens de boa-fé.

Calúnia, injuria e difamação, estão inseridos no Cap. V do Título I da Parte Especial do Código Penal Brasileiro, que trata “Dos Crimes Contra a Honra”. Este texto tenta ser o mais simples possível, e evita termos jurídicos. Pode não ser a explicação mais acadêmica, mas será a de mais fácil compreensão ao leitor e internauta de conhecimento médio.

O internauta quer seja um “blogueiro” ou um usuário de uma rede social como o Orkut, MSN, TWITTER, etc., muitas vezes esquece que as relações entre brasileiros e estrangeiros, mesmo as realizadas por meio da internet, estão sujeitas à lei.

A internet possui uma ampla área sem definição de normas, principalmente quando trata de relação entre pessoas e empresas de países diferentes, porém em muitos casos existe clara definição legal, em particular no Código Penal Brasileiro.

Uma destas áreas já protegida pelas leis brasileiras é o que se refere aos crimes contra a honra: calúnia, difamação e injúria. Notadamente existe uma grande confusão sobre os termos supramencionados.

Este texto busca esclarecer, com exemplos simples, as diferenças para que os internautas e notáveis leitores não sejam penalizados sem o conhecimento, pois autor não pode alegar desconhecimento da lei. Desta forma segue a explicação sobre cada um dos crimes supracitados.

Considera-se que o ato de ofensa pode ser realizado via qualquer sistema (site, blog, mensageiros, e-mail.). Normalmente, na internet, ocorre com textos escritos, mas pode ocorrer através de sistema de transmissão de voz e vídeo.

Calúnia

Art. 138, do Código Penal Brasileiro - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

Neste crime o autor divulga falsamente ato definido como crime a vítima, logo deverá existir alguma descrição correspondente no texto na lei como “fulano roubou a empresa X”.

No texto citado houve uma correspondência com o crime de roubo, porém dizer que “fulano é ladrão” constitui uma declaração de uma falta de qualidade moral e não uma especificação de um fato criminoso, desta forma não pode ser descrita como calúnia.

Observamos que ao escrever “fulana traiu o marido no dia X” também não constitui calúnia porque já não mais existe o crime de adultério, isto é, não se trata de um fato tipificado na lei como sendo crime.

De grande valia, em 28 de março de 2005, o Código Penal sofreu algumas reformas introduzidas pela Lei nº 11.106. Naquela ocasião o artigo 240, do CPB, que considerava o adultério um crime, foi revogado.

UM ESCLARECIMENTO NECESSÁRIO

Resta claro e evidente, que a pratica do adultério não incide mais em crime, portanto não apenado pelo Código Penal, por outro lado na orbita do direito civil, ainda persiste algumas permissivas, visto a existência de constrangimento, devendo aquele que pratica o adultério ter a plena consciência de que não será lhe atribuído uma pena tipificada pelo código penal, porém poderá arcar com a sentença de uma pena pecuniária na esfera civil.

Voltemos ao contexto que mais nos interessa. No crime de calúnia é necessária a intenção de divulgar fato falso definido como crime. Se não houve intenção de informar dado falso não constitui este crime, porém se houver dúvida na acusação e mesmo assim o autor a divulgou será calúnia. Boa parte dos estudiosos do Direito (doutrina) alega que é necessária a intenção de ofender, porém não há consenso nos tribunais.

Calúnia só existe quando existe divulgação, logo é necessário que a falsa afirmação chegue ao conhecimento de uma pessoa que não seja o ofendido. Se for um e-mail ou mensagem eletrônica de conteúdo ofensivo visto apenas pelas partes envolvidas não se trata de calúnia.

Difamação

Art. 139, do Código Penal Brasileiro - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

No crime de difamação trata da divulgação de fato ofensiva a reputação. Como a calúnia, também é necessária que chegue ao conhecimento de terceira pessoa, e que exista intenção de ofender, porém é importante distinguir que a acusação pode ser falsa ou verdadeira, ou seja, a divulgação de informação mesmo verdadeira que crie uma visão social negativa é difamação.

O dano é ferir a reputação daquele para quem foi direcionada a acusação. Assim, a divulgação da acusação que uma pessoa traiu o seu cônjuge, mesmo que verdadeira, é considerada difamação.

Atenção! Se o fato alegado constitui crime e for falso, trata-se de calúnia e não de difamação. Outro exemplo de calúnia. Pedro Bial diz ao ex-jogador de futebol Falcão: "Henrique assaltou Analu".

Como sabemos o assalto (roubo) está previsto no Código Penal Brasileiro (Art. 157). Sendo um crime e falsa a acusação contra o Henrique, neste caso, trata-se de uma calúnia.

Injúria

Art. 140, do Código Penal Brasileiro - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Este crime trata do sentimento pessoal do acusado, logo, a Injúria não precisa ser divulgada a terceira pessoa para que ocorra, já que a mensagem direta entre dois internautas pode ser definida como injúria. Trata-se de afirmações ou atos que ataquem como negativas as qualidades do acusado.

Retratação:

A retratação é o ato que permite que o autor, antes da sentença, nos casos de calúnia e difamação, negue a acusação alegada e propagada. Todavia, na injúria não é possível a retratação, pois é um sentimento pessoal que não será restabelecido pelo novo posicionamento do autor.

Ameaça:

Art. 147, do Código Penal Brasileiro - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Outro crime comum existente na internet é o crime de ameaça que está localizado no capítulo de Crimes Contra a Liberdade Individual. O fato de alguém escrever um “scrap” no Orkut ou mensagem em fórum intimidando uma pessoa como, por exemplo, “eu vou te matar” ou “estarei de olho na sua família” são ameaças definidas como crime.

Observações:

Os fatos considerados crimes para o efeito de calúnia não se encerram no Código Penal Brasileiro. Várias outras leis penais contem definições de crimes e penas como, por exemplo: Lei de Direitos Autorais, Lei de Proteção da Propriedade Intelectual de Programa de Computador, Lei de Proteção ao Meio Ambiente, etc.

Pode existir acusação de prática de dois crimes com o mesmo ato, como por exemplo, calúnia e injúria através de uma afirmação falsa de crime que penalize emocionalmente e moralmente o acusado.

Existem alguns detalhes na lei dos crimes citados omitidos, por exemplo, quando trata de acusações contra o Presidente da República e chefes de Estado estrangeiro. Esta minha omissão é para não me alongar no texto tornando-o enfadonho.

Conclusão:

Caluniar é imputar a outrem a prática de crime: por exemplo "seu ladrão", "seu estelionatário", "seu assassino", "seu estuprador".

Difamação é depor contra a fama de outrem, por exemplo: "tarado", "vagabunda", "prostituta".

Injúria é ofensa, por exemplo: "fulano é um bêbado".

Depende muito também do modo como é dito, de que maneira e para quem (publicidade).

Outros exemplos apenas para sedimentar o conhecimento ora transmitido:

Então levando para um exemplo bem simples: Se “A” disser que “B” roubou a carteira de alguém, sendo falsa essa alegação, estará cometendo crime de calúnia.

Já a difamação ocorre quando um indivíduo atribui a outro fato ofensivo à sua reputação, não precisa ser definido como crime. Exemplo: Se “A” disser que “B” foi trabalhar bêbado estará afetando sua reputação.

Por outro lado, a injúria consiste em atribuir à alguém qualidade negativa que ofenda sua dignidade. Assim, se “A” chamar “B” de ladrão estará cometendo o crime de injúria.

Perceba que enquanto na calúnia “A” diz que “B” roubou a carteira, na injúria “A” o chama de ladrão. Na calúnia pontua-se um fato, enquanto na injúria se generaliza.

Espero que tenha sido claro e objetivo, pois tentei fugir dos termos formais jurídicos. A idéia era criar um pequeno texto para não-advogados que fosse simples de entender pelo usuário médio.

Se o leitor amigo tiver alguma dúvida, ou se não me expressei corretamente dificultando a necessária compreensão, poderá fazer contato comigo para que eu, na medida do possível e do meu conhecimento, possa ajudar.

Este texto não faz analogia ao desempenho dos excelentes profissionais da área jurídica. Aos diletos colegas advogados meus sinceros respeitos e atenções às suas árduas batalhas nesse campo eminentemente formal e tão movediço quanto um pântano de águas fétidas, mormente quando envolvem sentimentos e relações interpessoais.

Entendo que um bom advogado é aquele que alia sólidos conhecimentos jurídicos (abstratos) à capacidade de aplicá-los às complexas situações da vida, com a percepção que deva ressaltar e do que convenha deixar na sombra, atendendo aos interesses da parte a que, de forma combativa, presta seus serviços profissionais com lealdade, ética e proficiência. O profissional da área jurídica é um eterno estudante, um autodidata recalcitrante, um vencedor de seus próprios limites.

Haja vista a frequência da incidência de tais crimes no cotidiano, e necessária saber diferenciá-los, para, assim, evitar confusão na hora da elaboração da queixa-crime e evitar aquelas famosas queixas-crime genéricas, em que mesmo a vítima tendo sido sujeitada a uma modalidade, os advogados, nem sempre incipientes na prática forense, por falta de conhecimento (insipiência), escrevem que “fulano foi vítima de calúnia difamação e injúria”.

Claro que nem sempre os juízes vão tornar inepta (Art. 295, do CPC) uma petição genérica, meio confusa. No entanto já presenciei um magistrado dirigir-se em voz baixa a um colega advogado para dizer: "... o doutor ainda faz confusão entre calúnia, difamação e injúria? Isso não é bom!".

Na ocasião o nobre advogado fez um muxoxo (trejeito) com os lábios para demonstrar desagrado ou desprezo pela observação do juiz, mas nada poderia fazer, posto que sua excelência estava certo no que dissera entredentes.

Afirmo que há muita gente considerada boa, isto é, de inquestionável conhecimento jurídico, nos Fóruns e Tribunais, fazendo uma grande confusão entre os termos: Calúnia, Difamação e Injúria.

Os juízes sabem disso porque muitos já advogaram e dentre eles há os que também continuam fazendo uma verdadeira confusão com ausência de clareza, de inteligibilidade, em suas sentenças com os termos latinos "ex nunc" e "ex tunc", mas isso é outra história.

UMA EXPLICAÇÃO NECESSÁRIA:

"Ex nunc" = A partir de agora, do presente, sem efeito retroativo: Exemplo: A decisão "ex nunc" do Supremo Tribunal Federal foi sábia.

"Ex tunc" = Com efeito retroativo, valendo portanto também para o passado: Exemplo: A revogação em causa produziu efeitos "ex tunc".

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NOTAS REFERENCIADAS

— Código Penal Brasileiro e Código de Processo Civil Brasileiro;

— Lei de Direitos Autorais, Lei de Proteção da Propriedade Intelectual de Programa de Computador, Lei de Proteção ao Meio Ambiente.