O jovem, a educação e a cultura
Prof. Arnaldo de Souza Ribeiro
O ensino: como a justiça e a administração, prospera e vive muito mais, realmente, da verdade e moralidade com que se pratica, do que das grandes inovações e belas reformas que se lhe consagram.
Rui Barbosa. Advogado, escritor, ministro, político e pensador baiano, 1849-1923.
Jovem: é o ser ainda em formação, sujeito às mudanças, enquanto assimila e incorpora novos conhecimentos e ensinamentos que irão delinear uma nova forma de viver e agir.
Educação: é o caminho percorrido pelo ser humano para desenvolver sua capacidade intelectual e moral, notadamente adquirida no convívio com bons mestres e boas leituras.
Cultura: é a resultante do modo de agir, dos costumes, comportamentos, crenças, manifestações artísticas e intelectuais; é a tradição de um povo, aquilo que foi legado pelos seus ancestrais, resultantes das práticas familiares, da religião, dos usos e costumes transferidos de geração a geração, ou seja, “a herança do ontem”.
Meus caros jovens e demais presentes. Seguirei este contexto: jovem, educação e cultura para fazer uma breve reflexão com os senhores.
Posso ver pela fisionomia de cada um que a maioria dos presentes encontra-se neste momento denominado juventude, que é caracterizado por importantes transformações, ou seja, são as crianças de ontem transformando-se nos adultos de amanhã, portanto, sofrendo diretamente as influências da educação e da cultura.
Observo na condição de professor e conferencista, no convívio diário com jovens e adultos, que existe certa dificuldade na compreensão, assimilação e prática destes costumes, chegando às vezes, a gerar impiedosas críticas, o que distancia e dificulta o relacionamento entre jovens e adultos. Os adultos são vistos como atrasados, detentores de conceitos antiquados, enquanto os jovens são vistos como rebeldes, irreverentes, modernos, geradores de conflitos.
Este comportamento antagônico entre duas gerações que deveriam respeitar-se reciprocamente fundamenta-se basicamente nos fatores abaixo, quais sejam:
Na cultura pluralista: que resulta dos novos e diversificados valores culturais, oriundos das rápidas transformações ocorridas nas últimas décadas, em razão da industrialização, da urbanização e do avanço tecnológico. A mudança sistemática dos padrões de consumo, influenciado pelas propagandas e outros comportamentos trazidos do exterior, (notadamente pela televisão que, diariamente apresenta usos e costumes de pessoas que vivem em regiões e países totalmente diferentes e distantes). A televisão e os meios de comunicação de massa atuam de forma tão poderosa e ostensiva, que podem interferir na vida da nação e na vida de cada um de seus usuários.
Os satélites interligam o mundo em poucos segundos e com isto os canais de televisão mostram aqui em uma cidade do interior, o que está acontecendo nas Américas, na África, na Europa, na Ásia e na Oceania, enfim, o que ocorre no mundo e até no espaço sideral.
Estas influências são facilmente assimiladas pelos jovens, pois são eles, na maioria das vezes os destinatários, por serem na maioria das vezes a porta de entrada para as mudanças, pela inquietude e curiosidade a eles inerentes, sempre ávidos por novas emoções e conhecimentos.
Cultura urbana: nas últimas décadas percebemos o aumento da população nas grandes cidades, em razão do êxodo rural, em especial de jovens, na busca de escola e trabalho, uma vez que a escola tornou-se uma necessidade para uma sobrevivência digna e confortável. Ademais, a vida e o trabalho rural deixaram de ser atrativos para a maioria das pessoas, em especial pequenos proprietários.
Cultura musical: a música é também um poderoso canal de comunicação e disseminação de influências; os jovens sempre assimilaram o conteúdo das letras, dos ritmos e a partir deles, criaram seus ídolos e incorporaram seus valores. Para elucidar basta citar as influências de Miguel Aceves Mejia, Elvis Presley, Beatles, Charles Aznavour, Henri Salvador, Sérgio Endrigo, Gigliola Cinquetti e Rita Pavone, no mundo e, Roberto Carlos, Vinicius de Moraes, Chico Buarque de Holanda, Geraldo Vandré, Raul Seixas, Antônio Marcos, Carmem Miranda, Maísa, Vanderléia, Nara Leão e Elis Regina no Brasil, dentre outros. Cientes desta realidade, grandes empresários promovem festivais e shows, arrebanhando multidões e junto à música e aos espetáculos, surgem inevitavelmente, a presença de bebidas, drogas e toda sorte de consumo.
Computadores: outro fator predominante foi a convivência com esta nova e surpreendente tecnologia, denominada informática: para alguns pensadores estamos vivendo uma nova revolução tecnológica.
Movimentos de massa: presentes em especial nas grandes cidades, protagonizados por jovens e adultos, artistas, políticos e intelectuais, demonstrando irreverência e contestação. Estes movimentos intensificam as relações entre as pessoas, a descoberta da sexualidade, a valorização do misticismo, a defesa da natureza, a procura da paz e do progresso. Como prova destes movimentos citamos: as “Diretas Já” na década de 80, a Eco-92, realizada no Rio de Janeiro, nos dias 3 a 14 de junho de 1992, ocasião em que a “Cidade Maravilhosa” recebeu líderes do mundo inteiro e durante o evento, para a alegria dos cariocas e amigos da cidade voltou a ser capital do país, como já o fora no período de 1763 a 1960. As edições do “Rock in Rio” nos dias 11 a 20 de janeiro de 1985, com a participação 1,5 milhões de pessoas e no “Rock in Rio II”, nos dias 18 a 26 de janeiro de 1991, com a participação de 700 mil pessoas, animadas pelo brilho e a cultura de estrelas da música nacional e internacional, dentre eles em 1985: Erasmo Carlos, Lulu Santos, Alceu Valença, Queen, James Taylor, George Benson; 1991: Barão Vermelho, Cássia Eller, Engenheiros do Hawaii, Prince, Carlos Santana, o ex-beatle, Paul McCartney, dentre outros.
Diante desta nova realidade cultural, a religião, a família e a escola perderam parte significativa de sua influência sobre os jovens, não conseguindo oferecer-lhes o exemplo, o discernimento e o apoio necessários.
Por estas razões estamos a viver e a conviver com uma nova cultura, novos hábitos, que trazem consigo valores diferenciados: alguns edificantes outros não, portanto, faz-se necessário que jovens de todas as classes, estejam preparados para absorverem os valores positivos desta nova cultura e conservarem os valores edificantes herdados de sua família, de sua religião, de sua comunidade, de seu país e do mundo.
Para que isto seja possível faz-se necessário que os adultos de hoje, jovens de ontem, onde quer que estejam: nas escolas, no lar, na Igreja, no trabalho, nos clubes, procurem compreender, amparar e elucidar os jovens, nos seus momentos de rebeldia e insegurança, no desejo natural de auto-afirmação, dando-lhes uma palavra de consolo, um conselho certo, orientando-lhes para o melhor caminho fundamentado na experiência já vivida, sem, contudo, impor-lhes unilateralmente os valores de sua cultura e pensamento como verdades absolutas.
Que as divergências entre a cultura herdada do ontem e a construída hoje, não sirvam para gerar conflitos, mas sim, que uma possa harmonizar-se com a outra e juntas, criarem uma nova cultura voltada para o bem comum, sem extremismos.
Enfim, que o jovem tenha a humildade e o bom senso para compreender e aceitar sua condição de um ser em formação, sujeito a erros e o adulto, tenha a paciência e compreensão necessárias para entender e relevar certas rebeldias e irreverências inerentes aos jovens, para que ambos atinjam o objetivo comum, almejado por todos, que é a união, a paz e uma sociedade mais justa e fraterna.
Em resumo: que os adultos saibam orientar e ensinar e que os jovens saibam e queiram aprender.
Muito obrigado pelo convite e pela oportunidade de fazer esta breve reflexão com os senhores, que entendo ser importante e necessária para todos nós.
Um grande abraço e boa noite para todos.
Itaúna, 22 de julho de 1992
Arnaldo de Souza Ribeiro.
Advogado e Professor de Introdução ao Estudo do Direito e Organizações e Técnicas Comercias, no COLÉGIO JOÃO DE CERQUEIRA LIMA – Itaúna – MG
Obs. 1. Este texto foi utilizado como referência para várias palestras que ministrei para estudantes em Escola de Segundo Grau, nas cidades de Itaúna, Itatiaiuçu, Mateus Leme e Pará de Minas, no segundo semestre de 1992 e durante os anos de 1993,1994 e 1995 a convite de Professores e Diretores.
2. Palestra publicada no livro: Magistério: estudos, pesquisas e palestras. 1. ed. Itaúna: Vile – Escritório de Cultura, 2014, p. 19 a 23.