Capacidade de indignação

CAPACIDADE DE INDIGNAÇÃO

A palavra indignação tem sua origem em uma reação diante de algo indigno. Trata-se de um sentimento de revolta experimentado frente a uma indignidade, injustiça, afronta ao bem comum ou desprezo à ética social.

A indignação sempre aponta para uma reação ética contra atitudes, sejam do cotidiano sócio-familiar ou das relações políticas, em que os juízos de valor revelam a ilicitude e/ou impropriedade de algum tipo de comportamento.

A indignação ética desencadeia necessariamente um tipo de reação em que a pessoa toma consciência de algum ilícito e parte para uma demonstração, formal, pacífica ou até violenta de inconformidade.

Há dias, escutei um programa em uma rádio de Porto Alegre em que o assunto “indignação” foi enfocado, a partir da agressão sofrida por Silvio Berlusconi, quando um cidadão italiano abalado com tanta corrupção moral, botou para fora toda a sua revolta contra aquele homem público. Revendo alguns fatos, passados e não tão passados, recordei a revolta do torcida do Coritiba; a mulher que quebrou os vidros de um hospital que atendeu mal sua filha de dois anos; a sapatada que um jornalista iraquiano deu em Bush, e outras tantas passeatas frente à casa de políticos que se vê por aí.

Essas agressões, todas elas injustificáveis, denotam a que ponto chega a exasperação das pessoas. Quando não se bota para fora a indignação, ela vai se comprimindo num processo de recalque, qual uma mola pressionada. Um dia o disparo é inevitável. É perigoso o estouro de uma indignação.

No terreno das indignações com os descaminhos políticos, alguns ingênuos costumam citar o voto, como ferramenta de faxina na sociedade. Trata-se de um ledo engano. Primeiro porque a mudança vai levar quatro anos; depois, porque muitos conseguem se reeleger, e por último, não é raro a gente eleger alguém que parecia sério e competente, e depois se revela um desastre. A indignação nasce do sentimento de impotência que sentimos diante de fatos que contrariam o bom senso, a ética e a decência.

São vazias certas manifestações de desconformidade, pois a corrupção nacional é uma bandeira, a incompetência tornou-se um outdoor dos burocratas e a indiferença uma prática usual. A geração crescente de escândalos e a impunidade se tornaram a antítese de nossa capacidade de indignação.

É lamentável constatar que nesse país das liminares, dos habeas-corpus, dos desmentidos do indesmentível e de tantas pizzas, indignar-se é tempo perdido e geração de estresses.

Escritor e filósofo