A Ressurreição do Felino e o País do Futuro!

Lembro-me dos meus tempos de infância no Largo de São Miguel Arcanjo (na realidade é Rua São Miguel Arcanjo – mas como em São Paulo que tem seu Largo do Arouxe, eu tenho o Largo de São Miguel).

Dos meus tempos de infância o que mais me intrigava eram as mentiras dos “adultos”. Mentiras do tipo os gatos têm sete vidas. Isso foi um prato cheio para as estripulias infantis. Peguei o gato Conrado com mais algumas crianças amigas e o matamos a base de pauladas, depois o amarramos com uma corda de nylon junto a um pé de amora em um lote baldio (onde tínhamos nossa sala de justiça, pra variar eu era o super-homem de cueca e tolha nas costas) para ver se depois de morto o felino iria voltar, quem sabe até para se vingar dos seus algozes. Pois bem, isso não ocorreu. Voltamos um dia, dois dias, três dias depois e... Nada! Só uma carcaça em decomposição. Pronto! Fiquei frustrado, sacrifiquei o Conrado de minha avó Gertrudes, nada que eu fizesse o traria de volta. Isto posto, não sei de quem foi a culpa, se minha como mentor pelo brutal assassinato do bichano, ou dos adultos que insistem em sofismar para os rebentos em detrimento de uma montanha de mentiras que vem se perpetuando de gerações em gerações.

Hoje, próximo dos trinta já sou quase um adulto! Não tive e não tenho problemas de envelhecimento precoce. Mas mesmo assim lembro-me de uma outra grande mentira, essa por sua vez contada por professores apaixonados e bem politizados não importa o partidarismo – direita ou esquerda, tanto faz, a mentira é a mesma “O Brasil é o País do Futuro” – um trocadilho que não me convence. Não me convence pelo simples fato de ser um sofisma. Pois, quando eu nasci me disseram que era para esperar porque o futuro seria todo pra mim. Agora eu cresci as mentiras são as mesmas, apenas tenho uma reação a elas. Tudo continua igual! Veio o plano real, mudou uma realidade inflacionária, tudo estava indo bem demais tivemos um período de expansão econômica, o Brasil atraía os investimentos internacionais, porque apesar de todas as mazelas temos um mercado interno de 190 milhões de consumidores. Mas não foi o suficiente, logo, os investidores perceberam a mentira e aos poucos se definharam do nosso mercado, e foram investir num mercado verdadeiramente promissor com mais de 1 bilhão de consumidores de olhinhos puxados - os chineses. Eles por sua vez não contam mentiras, e como conseqüência é o país que mais cresce no globo.

Que mentiras seriam essas? Mentiras em forma de descaso. Não temos infra-estrutura, não temos estradas, não temos uma instituição forte - no sentido de seu estrito cumprimento. Temos uma Constituição que assegura a democracia concebida no áureo ano de 1988. Nesse período eu ainda acreditava em ressurreição de felinos – também me encontrava no auge dos meus dez anos. Nesse período o Brasil tinha heróis fantasiados de Ulisses Guimarães com sua liga da justiça – para o alto e avante! A partir de hoje viveremos em um país com os olhos voltados para o futuro. 2004 dezesseis anos depois, o futuro não veio a passos largos, o que nos torna carentes de heróis e de investimentos. Até quando vamos viver de mentiras? Precisamos encarar a realidade em todos os seus aspectos: precisamos evoluir como cidadãos, que participam de decisões que simplesmente interessam a nós como sociedade, como nação, e não ficarmos alheios aos acontecimentos, esperando que tudo seja feito conforme a vontade de nossos representantes. Precisamos participar na elaboração de leis que realmente venha fazer efeito, para não cair em desuso. Precisamos de participação, para acabarmos com a cultura da criação de leis e assuntos que desviam a nossa atenção para o que realmente necessitamos. Isso também é uma questão cultural da época dos grupos escolares. No entanto volto para o Largo de São Miguel Arcanjo, sem uma solução de como acabar com os sofismas, e me sentindo do mesmo jeito quando assassinei o pobre Conrado.

Natalino Oliveira
Enviado por Natalino Oliveira em 25/05/2005
Reeditado em 20/01/2011
Código do texto: T19624
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