O MANDADO DE SEGURANÇA COMO SUPEDÂNEO GARANTIDOR DA LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO DOS MILITARES

A nossa Constituição Federal em momento algum proibiu a concessão de mandado de segurança em favor da liberdade de locomoção, mas, proibiu expressamente a sua concessão quando a liberdade de locomoção pudesse ser alcançada por habeas corpus. Confira-se a redação contida no inciso LXIX do art. 5º:

“conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica nas atribuições do poder público.”

Por sua vez, o art. 142, § 2º da CF/88 traz a seguinte redação:

“não cabe habeas corpus em relação a punições disciplinares militares.”

Logo, a regra é de que “não cabe habeas corpus em relação a punições disciplinares militares ” e, uma vez que o habeas corpus não pode amparar a liberdade de locomoção dos militares, onde está a proibição da impetração do mandado de segurança? Onde se ampara legalmente tal proibição? Estavam tratando também dos militares, os estudiosos do direito, quando desautorizam a impetração do mandado de segurança em favor da liberdade de locomoção?

A resposta as duas primeiras indagações, é de que não há proibição legal para que o mandado de segurança garanta o direito líquido e certo da liberdade de locomoção. Todavia, há proibição para sua impetração quando tal medida puder ser alcançada por via de habeas corpus: o que não é o caso. A resposta a terceira indagação só pode ser negativa. Pouquíssimas pessoas se dedicam aos estudos do direito administrativo e disciplinar militar. Na verdade, os estudiosos do direito vedam a impetração do mandado de segurança para garantia da liberdade de locomoção no meio civil, fora do âmbito da caserna, porque dele tratam e não proibição para sua concessão no meio militar, porque daqui não tratam. Também, anote-se que não tem cabimento o mandado de segurança contra crime militar, pois, é possível a impetração do habeas corpus nesses casos, restando afastado a impetração do mandado de segurança. Portanto, o mandado de segurança é remédio correto para atacar punição disciplinar militar, uma vez que o habeas corpus não ampara a liberdade de locomoção nesses casos e, ainda, frise-se exaustivamente que não há proibição legal para a sua impetração nesses casos.

Com precisão, Ythalo Frota Loureiro , um dos poucos defensores desta corrente, defende a utilização do mandado de segurança como supedâneo garantidor da liberdade de locomoção dos militares presos disciplinarmente, ensinando que:

“O raciocínio é mais simples do que se pensa. O art. 5o., inciso LXVIII, da Constituição Federal estabelece que habeas corpus ampara o direito de locomoção. Por sua vez o art. 142, §2o., da mesma constituição, estabelece que o habeas corpus não ampara o direito de locomoção em punições disciplinares militares. Portanto, o direito líquido e certo de locomoção em punições disciplinares militares, não amparado por habeas corpus, é assegurado por mandado de segurança. O habeas corpus não pode amparar o direito de locomoção quando se tratar de punições disciplinares militares, mas nada obsta a utilização do mandado de segurança para este fim. Vemos que mandado de segurança pode ser utilizado como supedâneo de habeas corpus em relação a punições disciplinares militares. A concessão de segurança pode ser, inclusive, liminar, fazendo cessar de imediato o ato ilegal e abusivo que restringiu o direito de liberdade do policial militar arbitrariamente punido.

O segundo aspecto a se analisar, neste humilde trabalho, é o de que não assiste razão aos que defendem que o Poder Judiciário não pode interferir na ceara administrativo-militar. Conforme as palavras de Paulo Tadeu Rodrigues Rosa :

“A hierarquia e a disciplina devem ser preservadas por serem princípios essenciais básicos, das Corporações Militares, mas os direitos e garantias fundamentais previstos no art. 5º, da CF, são normas de aplicação imediata (art. 5º, § 1º, da CF), que devem ser assegurados a todos os cidadãos (civis ou militares, brasileiros ou estrangeiros), sem qualquer distinção, na busca do fortalecimento do Estado de Direito.”

Com precisão Rosa ensina :

“A prisão de uma pessoa não significa que tenha necessariamente praticado um ato ilícito que tenha como conseqüência a imposição de uma penalidade. A privação da liberdade poderá ter sido um ato ilegal praticado por integrantes das forças policiais, ou mesmo por um cidadão, sendo que a lei prevê a possibilidade desta prisão ser relaxada, ou mesmo afastada. O art. 5º, inciso LXV, da CF, prevê que “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”.

A constituição diz que “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. Contudo, no art. 142, § 2º, da CF, temos que “Não caberá habeas corpus em relação a punição disciplinares militares”. Da interpretação sistemática, podemos extrair que se concederá habeas corpos contra violência, coação ilegal ou com abuso de poder, mas, não aos militares porque a estes é proibido. Mas, por que existe tal proibição?

Ora, é uma questão de legitimidade ativa que aqui se coloca. O mandado de segurança só pode ser impetrado pelo prejudicado, por intermédio de advogado. Assim, o militar ativo não pode impetrar o mandado de segurança sem intermédio de advogado. Já o habeas corpus é remédio constitucional amplo, qualquer pessoa pode impetrar em seu favor ou de terceira pessoa, sem necessidade de advogado. Imagine-se a situação em que um superior “odiado” cerceia a liberdade de locomoção de um subordinado muito querido pela tropa. Imagine-se que deste ato venha a ser impetrado uma centena de habeas corpus em relação à prisão do subordinado, tentando desconstituí-la. Não resta dúvida de que tal fato acarretaria em grave violação a hierarquia, pois, enfraqueceria o comando e poderia, até mesmo, tal quantidade de habeas corpus ser tida como protesto contra o superior, o que acarretaria em indisciplina. É nesse sentido que Jorge Cesar de Assis pondera que:

“Quando um subordinado contrapõe-se ao superior, o efeito gerado no seio da tropa é muito forte e pode enfraquecer o Comando (...)”

Portanto, podemos afirmar que não há dúvida de que no momento em que é acionado o Poder Judiciário, de uma forma ou de outra o Comando restará enfraquecido, causando reflexo na hierarquia e disciplina, mas, ao se utilizar do mandado de segurança em vez do habeas corpus, a hierarquia e disciplina restarão menos prejudicadas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

ASSIS, Jorge Cesar. Curso de direito disciplinar militar: da simples transgressão ao processo administrativo. Curitiba: Juruá, 2009.

ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Direito administrativo militar. 3ª ed. 2ª t. Rio de janeiro, Lúmen Júris, 2009.

ARRUDA, João Rodrigues. O uso político das forças armadas e outras questões militares. Rio de Janeiro, 2007.

FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. São Paulo, 2007.

Constituição Federal, Brasília, Gráfica do Senado, 2009.

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Doutorneves
Enviado por Doutorneves em 05/12/2009
Código do texto: T1962018
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