MALANDRO É MALANDRO, MANÉ É MANÉ
Não sou um apolítico, nem ao menos um mero entusiasta. Apenas um brasileiro desesperado, entre milhões, que não compreende os inúmeros acontecimentos diários dos quais é vítima. Como diria o rei Roberto Carlos: “São tantas emoções, bicho!”. Não bastasse a insinuação quotidiana que me faz um refém deste sistema equivocado que por si seqüestra o meu idealismo, a minha dignidade, o meu compromisso, o meu senso do que seja a justiça dos homens, porque a justiça de Deus, ainda presume-se eficiente, e Nesta deposito tudo ou o que restar desta vã sobriedade.
Vivencio os noticiários da TV, leio jornais e revistas e me deparo com uma insanidade comportamental sem parâmetros, face às injustiças praticadas por jovens bandidos contra cidadãos e cidadãs que nada mais querem do que a vida em sociedade. As aberrações criminais cometidas, as barbáries urbanas, a violência injustificada, são notadamente agravadas por alguns pseudo-intelectuais que as tem como algo normal, do ponto de vista do que represente e, realmente, os direitos humanos para quem ceifa a vida de outrem, mesmo sem a sua autorização.
Ora, se “tudo o que é vivo, um dia morre”, cabe aqui a censura prévia do que represente a vida no contexto conjuntural. A assertiva de que ninguém, nenhum outro, tem o direito de usurpar àquilo que me pertence, que me foi ofertado da forma mais sublime, autêntica e, sobretudo, natural. Seria interessante que me consultassem primeiramente, antes de apertar o gatilho. Até porque não se trata apenas de ser constitucional, é sobrenatural, e porque não dizer, melhor, divino.
E o furto dos meus sapatos, do terno que acabei de comprar, do carro recém adquirido em sessenta suaves prestações, nos míseros reais do meu parco vencimento corroído pelas tantas taxas bancárias, que resolvi sacar do caixa eletrônico para comprar uns pães? Ou quem sabe, a nossa casa financiada, e a perder de vista, a piscina de bolinhas que acabo de comprar para a minha caçulinha, um notebook como principal ferramenta de trabalho, nosso cachorrinho que é alegria da casa, e melhor, minha família, que espera ansiosa e, todos os dias, o meu suposto retorno.
Não que isso apenas me valha como desabafo, até porque nada disso foi adquirido com corrupção, nem ao menos foi oriundo de “caixa dois”. Não existe benefício, nem esquemas, nem obra superfaturada, nem comissões e/ou aquele “jeitinho brasileiro” do quero mais. Como milhões de brasileiros que se prezam, uma legião de muitos honestos que ainda teima em viver e sobreviver neste país, minha cidadania é exercida naquilo que acredito: “não corromper, nem ser corrompido”.
Imagino que aquele troco passado a mais no meu bolso irá pesar por toda a minha vida, ou aquela mercadoria vendida a preço além do permitido, o dinheiro achado e não devolvido, os famosos “gatos” na energia elétrica e no gás, etc. Tudo isto não valerá a pena, pelo simples fato de que meus filhos pagarão esta amarga conta e, o prejuízo será a meu ver incalculável, desumano e, sobretudo antiético.
Esta mesma ética permeia o caminho de milhões e, infelizmente ultrajada pelo cidadão engravatado, que teima em desafiar a tudo e todos para garantir uma “gorda” aposentadoria à custa da miséria alheia, da violência e das atrocidades cometidas por alguns que vivem à margem da sociedade, sem emprego, educação de qualidade, políticas públicas, lazer, moradia, e acometidos de todos os males que se possa imaginar, como o avanço do tráfico e o conseqüente consumo de drogas, tudo pela garantia do ainda existente “voto de cabresto”.
Os tecnocratas deformam a legitimidade, burlam mecanismos constitucionais ao atestarem veementemente grandes esquemas de lavagem de dinheiro, tráfico de influência, vícios licitatórios, formação de quadrilhas, sonegação de impostos, dentre inúmeras mazelas. Na condição de “malandros” sobrepujam os “manés” que não se organizam e esquecem-se da luta, do coletivo, de se armarem perante as injustiças cometidas por estes que se julgam “acima do poder”. É momento de darmos um “basta” ao termos uma postura de que juntos somos mais e podemos mudar o que aí está e, despojando-nos do “egocentrismo” nos coloquemos no lugar do outro, até porque nunca se sabe se amanhã seremos vítimas das artimanhas que a própria vida nos impõe.
Pirapora/MG, 25 de novembro de 2009.