Mil e uma noites...
O saudoso e célebre jurista Rui Barbosa, autor de teses, frases e doutrinas jurídicas que influenciaram e influenciam pessoas até hoje já dizia que “há tantos burros mandando em homens de inteligência, que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma ciência”; com plena certeza Rui Barbosa que morreu no início do século passado só estava prenunciando que o mundo seria dominado, infelizmente, por gente de caráter discutível e acúmen lógico ambíguo.
Eu sempre sobrepus que da burrice tenho pavor profundo; imagino dela ser contagiosa e crônica; neste caso, pessoas que nem eu, que nasceram pobres, feias e ficaram carecas, uma vez burras, só lhes restam à salvação divina...! Em suma, a burrice é a desgraça da humanidade e isso de aplica em todos os setores produtivos, mas principalmente no setor turístico.
Os governos de vários países, dentre estes o Brasil, não investiram quase nada em seus potenciais turísticos nos últimos 20 anos; poucos e ruins hotéis foram construídos, da mesma forma que o restante da infra-estrutura básica de receptivo para quem chega de fora. Taxistas não falam nem a língua portuguesa correta; o que dirá de uma língua estrangeira? Neste mesmo embalo estão recepcionistas da rede hoteleira, motoristas de ônibus, policiais, guardas de parques e donos de lojas de souvenir; enfim, chegar ao Brasil e em outros países latinos para fazer turismo é um Deus nos acuda!
A ilha de Bali na Indonésia, pequena e perigosa, devido às catástrofes naturais e aos atentados terroristas, recebe mais gente de outras nações do que o Brasil, do que a Argentina. O Paraguai, completamente corrupto e inseguro vende uma imagem totalmente distorcida da realidade e não me surpreenderá se em um ou dois anos estiver com mais turistas em Assunção do que em Foz do Iguaçu; esta é a triste realidade do nosso e de outros países que se consideram potenciais no turismo de diversão.
Aqui no Brasil as estradas são um caos; não há sinalização e conservação e isso dificulta o ingresso de pessoas com dinheiro a locais distantes, principalmente nos locais onde não há vôos regulares para aeroportos próximos. Eu posso citar com autoridade a Chapada Diamantina na Bahia, a Chapada dos Veadeiros em Mato Grosso, os Lençóis maranhenses, o Pantanal mato-grossense e até a Amazônia.
Todo o investimento está concentrado no eixo Rio – São Paulo; só se fala em investir nas praias cariocas e no litoral paulista, que para mim, com raras exceções não passam de lixos retocados em cartões postais, sem querer desmerecer a incrível força do povo destes locais.
Ninguém se lembra do Morro de São Paulo, um dos lugares mais lindos, exóticos e com história natural do Brasil; se fala de Porto de Galinhas como sendo a Riviera Francesa e se esquecem das belas praias de Natal; se vende de forma incrível o turismo sexual de Fortaleza e colocam meia dúzia de policiais para patrulhar uma costa com mais de 30 km de praias e não se prepara os servidores dos hotéis.
Em Salvador, primeira capital do Brasil, com mais de duas centenas de igrejas seculares, Pelourinho, Elevador Lacerda e Mercado Modelo, encontrar um hotel descente com bom atendimento é uma Via Crucis. Não se pode negar o mega investimento do Pestana Convento do Carmo; para mim, um dos melhores e mais ricos hotéis da América do Sul. Eu o conheço em três fases: na época em que era apenas um convento com visitação turística, durante as obras do hotel eu também estive por lá e depois de inaugurado, o prazer de dormir naquele palácio também me foi facultado. Fora um ou outro hotel, Salvador está abandonada; todos correm para a bela Costa de Sauípe, passando pela esquecida Praia do Forte e deixando de lado as maravilhas da Ilha de Itaparica.
As Terras do Sem Fim ou São Jorge dos Ilhéus, tão querida e versada por Jorge Amado está surpreendentemente abandonada, suja e feia. Aracaju, terra de meu amigo Deputado Fabiano de Oliveira, mudou muito, mas mudou para pior. Maceió é um cartão postal somente na orla marítima; por trás daquela beleza há um vulcão prestes a explodir de tanto descaso. O mesmo se fala de Recife, São Luís e João pessoa. Em resumo, o Nordeste está órfão de pai, mãe e parteira.
Quem vai a Curitiba e não conhece a Estrada da Graciosa comete um grande pecado. Abaixo da Serra do Mar há uma das cidades mais bucólicas do Brasil e ninguém sabe, ninguém vê; trata-se de Morretes com seu casario e culinária especialíssima e se ninguém visita a culpa é de quem Governa o Estado. Santa Catarina o turismo se resume a Comburiu e as praias de Florianópolis; de quando em vez alguém fala algo sobre a October Fest de Blumenau!
O Rio Grande do Sul é um paraíso para argentinos e uruguaios que buscam águas menos geladas do que as deles, mas o Estado riquíssimo em história de outras belezas só divulga mesmo a Serra Gaúcha, especialmente Gramado e Canela.
Voltando no mapa, Brasília, Capital Federal, com seus inúmeros hotéis e monumentos, pouco recebe ou explora o turismo brasileiro. Os taxis são velhos e defeituosos, os ônibus impraticáveis e o metrô é uma obra para inglês ver. Os hotéis são caríssimos e poucos sabem atender alguém que não seja políticos. Eu posso destacar apenas o Brasília Alvorada, antigo Blue Tree, que fica ao lado do Palácio da Alvorada. Eu me hospedo, aconselho, destaco e reitero: é o melhor hotel de Brasília e promove preços baixíssimos nos finais de semana, mas quase ninguém de fora aparece!
Esta apatia generalizada faz com que o Ano Novo e o Carnaval do Rio de Janeiro e de Salvador sejam os únicos expoentes do turismo nacional; isso sufoca outros locais importantes e desvia o foco das atenções, fazendo com que os empresários não invistam nada fora do eixo tradicional e que comunidades inteiras vivam a mercê da própria sorte.
O Brasil turístico é muito mais do que Rio de Janeiro e Salvador no carnaval, mas ninguém quer saber disso! Os empresários do setor hoteleiro só querem saber dos incentivos do Governo para a captação de recursos; depois disso eles enchem os bolsos de dinheiro, constroem favelas hoteleiras, cheias de pessoas desqualificadas e ponto; imaginam estar fazendo muito pelo turismo!
Quem estrutura com planejamento e investe pesado no setor turístico tem o retorno e o reconhecimento público, que o diga os Emirados Árabes Unidos, Turquia, Estados Unidos da América, Israel, muitos países europeus e até o Uruguai; isso mesmo, o nosso vizinho Uruguai bate pesado no turismo de Punta del Este, Maldonado e Punta Negra. Eu posso afirmar que o aeroporto de Carrasco em Montevidéu é mais estruturado e funcional do que o de Brasília.
A pobre e maltratada ilha de Cuba vive do turismo; todos os países do Caribe exploram a atividade turística como sendo a principal; a África do Sul e seus eternos diamantes, também volta os olhos para o turismo; Líbano, Grécia, México, Canadá e Austrália, percentualmente investem mais no setor do turismo do que o Brasil e o resultado, mais uma vez são mais pessoas por lá do que por aqui e quem perde com tudo isso? Nós todos!
Os sheiks árabes e sultões do petróleo do Oriente Médio descobriam um dia que o ouro negro era finito; o petróleo tem dia e hora para acabar e depois dele, como é que eles sobreviveriam naquelas terras áridas e inférteis? Um cenário de deserto atrai os curiosos, mas só pelas fotografias e ninguém se arrisca a permanecer em locais como o Saara, mas basta haver um Oásis que lá estão os afortunados pagando caro e ficando e voltando.
Foi baseado nesta idéia que eles, os árabes donos de 90% do petróleo do mundo passaram a investir fortunas que transformaram mares de areia em mares navegáveis; construíram ilhas, condomínios de luxo, shopping Center, estradas magníficas e hotéis, muitos hotéis de altíssimo luxo a exemplo da Torre das Arábias ou Burj al Arab, o único 7 estrelas do mundo e um dos mais caros da atualidade.
No local havia apenas areia a perder de vista; hoje há um monumento difícil de ser projetado há meio século; isso em Dubai! Todo o redor de Dubai foi transformado num Oásis e os investimentos chegaram a 300 bilhões de dólares. O cenário já recebe as grandes estrelas do mundo, os mais ricos do planeta e promete ser a grande atração do mundo dos próximos 100 anos; até a seleta Fórmula 1 já marcou presença naquelas bandas e promete não sair mais, pelo menos se depender da grana do petróleo!
Todo envolve a Torre das Arábias; sua suntuosidade estrutural, seus apartamentos magníficos, os serviços prestados de altíssimo padrão de qualidade, a atenção exagerada e providencial aos visitantes, a preparação em altíssimo nível de todos os envolvidos na recepção dos visitantes e a simplicidade em aceitar meios de pagamento universais são os quesitos básicos da aposta do Oriente Médio em se tornar a atenção do mundo turístico. Até esquiar em neve fresquinha artificial já se pode fazer em Dubai e se depender da criatividade de seus arquitetos o arrojo não vai parar por aí, virão muitas novidades em breve!
Para quem não sabe o Hotel Burj al Arab possui preço inicial em R$ 4.000,00 por noite; quem faz uma reserva em suíte luxo é apanhado no aeroporto de Rolls-Royce ou helicóptero de luxo; literalmente há um mordomo disponível para cada apartamento 24 horas por dia; as reclamações são checadas e providenciadas às respostas antes do dia acabar; todos os apartamentos possuem TV de plasma de 42 polegadas; quem vai a praia tem uma companhia de mordomo para também borrifar água francesa na areia.
Seguindo o festival de exageros, mas tudo em nome da satisfação de seus clientes, o Burj al Arab utilizou ouro suficiente para cobrir um campo de futebol em seus afrescos e detalhes; a suíte real custa mais de R$ 40.000,00 uma diária. Segundo o francês Luc Delafosse, Gerente-Geral, cada detalhe e cada providência funcional foram baseados nos erros e críticas dos outros hotéis do mundo; as queixas e reclamações de outros hotéis é o que faz da Torre das Arábias ser o melhor do mundo em tudo, inclusive em satisfação.
Quem é que não já se irritou na hora do check-in ou check-out? Pensando nisso e colhendo reclamações de outros hotéis que eles dão as boas vindas e a despedida de seus hóspedes diretamente nos aposentos! A idéia do Burj al Arab é satisfazer a vontade daquele que o escolhe e fazê-lo voltar mais e mais vezes.
O disparate em que me refiro no início deste artigo parte primeiro do Governo que não investe em áreas que poderiam sustentar um turismo equilibrado; depois dos grupos empresariais que só buscam a exploração dos grandes centros, afogando completamente cidades já exploradas por eventos tradicionais. Este tipo de absurdo concentra altas rendas em poucas mãos e nenhuma renda nas mãos de muitas comunidades pelo Brasil a fora.
Recente, uma empresa aérea recém inaugurada prometeu operar em aeroportos alternativos, mas até agora somente Campinas em SP está largamente explorado; é bom não esquecer que outros bons aeroportos brasileiros ainda estão esquecidos, a exemplo de Petrolina em Pernambuco, que atende grande parte dos vôos regionais para quem visita o Vale do São Francisco, grande expoente da produção de uvas e grande pólo turístico que só é freqüentado por moradores locais.
Vários países subsidiam os preços de passagens aéreas para locais turísticos; Estados Unidos, Colômbia, China e tantos outros já fazem isso, enquanto aqui, uma das poucas coisas que são incentivadas pelo Governo, são as despesas de entidades como o MST...!
Enquanto a visão estiver focada apenas nos centros tradicionais de turismo o Brasil ficará míope, quiçá cego, diante de tanto abandono e de nenhum planejamento do que eles próprios chamam de Turismo Sustentável. Enquanto o tempo passa, o dólar baixando, ficamos aqui vendo o Zé das Couves juntar uns trocadinhos para visitar Miami, porque o Rio e Salvador, estas cidades ele está cansado de ver e de pagar bem mais caro.
Parabéns para eles, os gringos!
Carlos Henrique Mascarenhas Pires
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