FÉ E RAZÃO

Tarde deliciosa hoje na Academia Sergipana de Letras. Aconteceu importante conferência do Imortal Acadêmico, Dr. Marcos Almeida, médico cardiologista, escritor, latinista e estudioso da Filosofia. Já vi um médico gostar das letras, mas desse jeito é algo apaixonante. O coração de Marcos é pura palavra. Que amor tão grande!

O tema foi desenvolvido pelo conferencista a partir de considerações em torno da Filosofia e da Teologia. Aqui tentarei colocar a minha reflexão e interação com o intelectual que disse: “Tânia, faço das suas as minhas palavras”. Poxa, como fiquei alegre de ter acertado em minha participação. Também prestei atenção a cada palavra, frase, conceito expostos durante cerca de uma hora e meia.

É preciso nunca se cansar de abordar o tema explorado durante a conferência. E também investigar sobre a importância da Filosofia para o estudo da Teologia e perceber as intenções, as nuances, as perspectivas.

Tenho observado ao longe que, apesar do cunho evangelizador que corre em cursos de Teologia, não se pode dizer que esses cursos não tenham a preocupação científica, o debate sobre a Razão.

Algumas perguntas acorrem à mente, por exemplo: Como é possível entender Deus sem a abordagem da Razão? Mesmo que não seja somente pelo ângulo de estudos científicos a rigor, mas pelo olhar puro e questionador, pela observação inteligente do ser humano? Essa observação inteligente do ser humano é o ponto inicial e sobre o qual a ciência fincou suas bases e sistema, mesmo que em dado momento alguém não queira admiti-lo. Se queremos ser e somos Deus, por que, então, é difícil entendê-Lo?

Percebo que, um momento de união entre fé e razão deva ser aquele em que o fervoroso é também um comum questionador ou um cientista na maior expressão da palavra. Li várias obras de cientistas fervorosos que conseguem navegar lindamente nos dois oceanos: o da assim chamada fé e o da Razão. Li de cientistas declaradamente ateus e que só navegam em um mar, este do ateísmo.

Ressalto que o meu ponto de vista é aquele de uma pessoa ligada ao mundo das letras. Penso agora na palavra, não na sua etimologia, mas principalmente na sua acepção moderna, contaminada, modificada pelo uso. Nesse particular diria que a palavra fé está muito relacionada com a palavra aposta, como sugeriu o Desembargador Vladimir de Souza Carvalho, presente ao evento aqui focalizado. Friso, inclusive, que se precisa lembrar a perspectiva de ser o texto bíblico eminentemente literário. Em alguns momentos, ousaria dizer, lírico. Isto que digo não é uma crítica e sim uma constatação, não só minha, mas em primeira mão, de muitos empenhados no estudo da palavra contida no Evangelho.

Entendo que, principalmente hoje, a fé não só pode, mas deve ser estudada à luz das ciências da psique humana.

Este que ocorreu na tarde de 23 de novembro, na ASL, é um debate significativo, mesmo e porque sabendo-se do complicado casamento da fé com a razão. Enlace tão difícil quanto o do sol com a lua e o da teoria com a prática.

Particularmente estou convencida de que, para os escolarizados, a tendência natural é a de buscar entender o mistério filosofando pelas vias das ciências, especialmente as exatas. Fora disto é perda de tempo. Realmente, como o disse Louis Pasteur: “Um pouco de ciência nos afasta de Deus… Muito, nos aproxima.” Deus é a própria Ciência, no mais completo sentido que esta palavra possa ter. A nossa ciência é pequena, a dEle, perfeita, final, causa e efeito em si mesma. A nossa razão tem, sim, limites. Só a nossa.

Feliz daquele que tem Fé, se esta é realmente uma obra de Deus. Feliz de quem, em sua angústia existencial, procura responder eternas questões e encontra Deus no exercício racional. Assim O encontrei e Ele interagiu levando-me à certeza, muito mais que a fé. Esse exercíco resulta nessa plenitude, ou, pelo menos perto dela.

A fé, como muitas vezes se propala, vive ao longe da certeza. O método é a linguagem de Deus e sua essência primeira. Vejam que Ele providenciou não apenas e simplesmente a fé, mas a certeza também naqueles que não têm o privilégio da ilustração, da escolaridade e do conhecimento sistematizado.

Nós, informados, lidos, não devemos e nem podemos, por outro lado, monopolizar Deus tão somente em nossas teorizações e criando-O à nossa imagem e semelhança, ou de acordo com a nossa vaidade. Perdemos para os índios que O entendem observando a Natureza.

Quem estuda profunda e cientificamente a palavra de Deus não tem fé, tem certeza absoluta, clara, objetiva. Ao contrário de Santo Agostinho, eu diria que a Razão é que faz florescer, resplandecer a certeza.

Sem reflexão nos abraçaremos com o fanatismo. Os cientistas falham, sim. A ciência, porém é o acerto em si mesma.

Está de parabéns a ASL, representada na pessoa do seu Presidente, o Dr. José Anderson Nascimento, juiz de Direito, e todos os componentes da casa da intelectualidade sergipana. Especial aperto de mão ao Dr. Marcos Almeida pela fundamentada peça de sua conferência.