Não quero crisântemos - Anclar Patric Crippa Mendes*
PENSE BEM - [ 02/11 ]
Redação Cruzeiro do Sul
Notícia publicada na edição de 02/11/2009 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 2 do caderno A.
Não me venha com aquela desculpa esfarrapada que o crisântemo branco, amarelo ou ferrugem dura mais, é mais barato. É impossível perfumar o ambiente. A flor pode até ter uma beleza, diríamos assim, escondida; mas não vejo nada, apenas o compromisso cego de depositá-la ao lado de quem amamos a vida inteira.
Pouco para quem dedicou anos, noites mal dormidas, dupla jornada e dores de cabeça. Bendito capitalismo que nos impõe até mesmo o que comprar nessas horas. Que meus parentes e amigos falecidos me perdoem, mas não gosto de ir ao cemitério. Nem mesmo aqueles com aparência de um lindo jardim... de crisântemos. Sei que estou errado, quem sabe um dia mudo de opinião, ou melhor, de ação.
Nossos mortos precisam ser lembrados naquele instante que só o coração entende a falta. Não é solidão, é ausência. Quando de repente a lágrima rola sem culpa, intenção, ensaio. Sabores que a boca sentiu remetendo a um passado delicioso e cheiros que chegam a doer quando sentidos com olfato apurado. Só quem perdeu alguém entende o mistério da morte. Mas quem disse que é necessário entender?
A saudade foi inventada justamente para isso. Dar explicações. Ela nos abraça e consola sem precisar falar nada. É eficaz na medida exata, nem mais, nem menos. Olha nos nossos olhos e como colírio deixa a visão clara. Coloca-nos no colo como adultos que precisam ser embalados por uma canção de ninar. Há músicas e vozes que sempre farão bem aos nossos ouvidos, cansados de tanta lamúria.
É necessário cultivar a saudade, caso contrário, uma foto sempre será apenas uma foto. Não haverá explicação para guardar cartas, bilhetes, guardanapos escritos, uma peça de roupa. Aquele telefone nunca mais tocará, mesmo que em outras ocasiões, você desejou tanto não atender. É assim, não tem jeito, pelo menos até agora.
Coitados daqueles que sentem arrependimento dos que, infelizmente, foram embora. O que faltou? Dar um abraço apertado e dizer eu te amo? Desculpar pela briga fora de hora? De esquecer pequenas mágoas? De celebrar a presença? De desmarcar um encontro para ir ao teu? De embrulhar um simples pão de mel e deixar com um bilhete especial? De ficar em silêncio ao seu lado? Não sofra, outras oportunidades, com outras pessoas, virão. Uma segunda-feira para chorar a saudade...
“E de uma coisa fique certa, amor
A porta vai estar sempre aberta, amor
O meu olhar vai dar uma festa, amor
Na hora que você chegar...”
(trecho da música Espumas ao Vento, com interpretação de Renata Arruda)
Pense bem.
* Anclar Patric Crippa Mendes (anclar.patric@jcruzeiro.com.br) é jornalista do Cruzeiro do Sul e escreve semanalmente neste espaço.