Esperança e fé...

Esperança e fé

Éramos pequenos, membros de uma família de sete pessoas, sendo o pai a mãe e mais cinco irmãos e nas minhas lembranças, foi no ano de 1953, quando morávamos numa fazenda de produção de café no município de Barretos/SP. Éramos responsáveis por 10.000 pés de café e nos espaços livres das ruas de café, plantávamos arroz para o gasto e também para venda. Meu pai costumava guardar a produção de arroz por dois anos, ou seja, vendia a produção do ano anterior junto à produção do ano corrente. Isto para conseguir um preço melhor e receber um valor maior, já que ele era chegado em fazer economia e poupança para melhorar os rendimentos. Costumava guardar a produção de arroz nos quartos de dormir, que ficavam cheios até o telhado. Neste ano os marimbondos resolveram fazer parceria conosco, fazendo moradias em toda a extensão da comunheira da casa, no local onde eram armazenados os sacos de arroz, no vão entre as pilhas e o telhado. Chegou o dia de vender a produção de arroz, visto que era hora mesmo de vender para não fazer parceria também com os ratos que já começavam a atacar e mesmo porque o arroz iria ficar muito velho, mais difícil para vender. Acertado o comprador, no dia seguinte já viria carregar o estoque. E agora o que fazer com os marimbondos? Meu pai resolveu colocar veneno retirando as telhas por cima da casa. Nesta noite foi uma verdadeira guerra de marimbondos, voando para todo lado, picando os irmãos menores e também meu pai e minha mãe. Como fazer? Decidimos então ir dormir no paiol de milho, todos amontoados. Foi colocado mais venenos e querosene nos marimbondos. Na manhã seguinte havia marimbondos mortos para todo lado, do lado de fora e dentro dos cômodos da casa. Meu pai e os peões retiraram os sacos de arroz, pois o caminhão logo chegou para carregar e minha mãe, que era muito decidida, resolveu fazer sozinha o rescaldo, varrendo todo aquele amontoado de marimbondos juntamente com grãos e cascas de arroz que haviam sido comido pelos ratos e jogou fora, longe das galinhas que, se comessem, morreriam também.

Semana depois minha mãe apareceu doente, porque havia sido muito atacada pelos marimbondos, com sintomas de intoxicação. Foi fazer consulta em Barretos e teve que ficar internada já meio morta e meio viva por duas semanas. Motivo provável foi a intoxicação pelo veneno BHC, muito usado naquela época. O médico responsável era o Dr. Prata, renomado médico das famílias barretenses, que cuidou dela com todo o amor possível. Ela ficou meio em coma por todas estas duas semanas. Foi quando uma sua comadre pediu ao meu pai para levar o padre para o atendimento de praxe aos doentes terminais. Foi lembrado pelo meu pai que não haviam se casado no religioso e então já nesta visita resolveram faze-lo mesmo com ela inconsciente. Foram chamados os padrinhos que estavam ali próximos mesmo sem conhecê-los direito e fizeram a cerimônia. Horas depois veio o milagre. Ela começou a abrir os olhos e perguntar pelos filhos. Três dias depois, muito abatida já estava em casa com os filhos.

Nota: Nós, as crianças, sabiam do estado que estava nossa mãe e eu, provavelmente com nove anos, já era cheio de fé conforme ela nos ensinara. Lembro que havia na sala uma imagem de Nossa Senhora Aparecida. Com todo este alvoroço, meu pai se dirigia à cidade todos os dias para assistência a nossa mãe e ficávamos sozinhos e eu, o primogênito, fazia as refeições para todos. Desespero, o que fazer se nossa mãe morrer? Conversávamos. Então sozinho em frente a imagem fiquei por alguns momentos, meditando e pedindo pela saúde e o retorno da nossa mãe. E lembro de ter rezado em voz baixa um Pai Nosso e uma Ave Maria durante todos os dias com reflexão e intenção, pelo restabelecimento dela.

Semana depois, nossa mãe estava de volta, meio cambaleando, porém em condições de assumir suas funções e ditar os rumos da família Pedroso.

Este acontecimento já faz 56 anos, porém nunca falei com ninguém deste acontecido, nem com a própria mãe, talvez por vergonha ou timidez, mas o certo é que a fé valeu a pena.

Ela teve mais sete filhos e faleceu em 17/03/2000, vítima de derrame cerebral, que a deixou acamada por seis anos.

Um abraço a todos.

José Pedroso

Frutal, 30 de outubro de 2009.

Josepedroso
Enviado por Josepedroso em 30/10/2009
Reeditado em 04/11/2009
Código do texto: T1895963
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