GLOBALIZAÇÃO: AVALIAÇÃO ÉTICA E PERSPECTIVAS

Introdução

A globalização é um processo histórico e uma característica do nosso tempo. As opiniões divergem quanto ao significado do conceito, mas o fenômeno que ele descreve é considerado irreversível. Pretendo apenas analisar e julgar rapidamente este fenômeno, para depois propor algumas pistas de ação. A globalização pode ser vista tanto a partir de seus aspectos negativos como de seus aspectos positivos. Por exemplo, sob diversos aspectos ela ameaça o emprego de milhares de trabalhadores, mas por outro lado ela também abre novas perspectivas de solidariedade mundial, sensibilizando a humanidade por mais justiça para com a parcela da humanidade menos favorecida. Pela globalização os homens também descobrem que eles são os atores da história e não apenas espectadores.

A característica mais marcante da globalização é a supressão das barreiras para a movimentação das pessoas, dos capitais e dos bens. As fronteiras geográficas diminuem. Os planos nacionais devem tomar em consideração os planos multinacionais. Nascem novas instâncias políticas, crescem as organizações não governamentais, e as empresas multinacionais dominam os mercados.

A globalização ocorre de forma mais destacada principalmente em três domínios: na tecnologia, na economia e na política. Além disto, se assinala que a globalização está provocando uma rápida transformação dos sistemas sociais e culturais. Alguns aspectos da globalização mostram-se com maior evidência, como: a globalização das finanças e do capital; os mercados e as estratégias de mercado; as tecnologias e os conhecimentos; as maneiras de viver, as formas de consumo e a vida cultural; a gestão e a regulação dos rendimentos; as percepções e as consciências; enfim, a globalização é percebida como uma forma de unificação política do mundo. A mundialização das comunicações e a extraordinária difusão de informações dali decorrente são o principal catalizador da globalização. Os mais diversos acontecimentos, as catástrofes, os protestos já não permanecem mais como fatos puramente locais, mas, graças à mídia, são transmitidos em tempo recorde para todas as agências da imprensa mundial.

*) Observação: Este texto se inspirou, em grande parte, na “Analyse des Evêques de Belgique, 9 décembre 2005, sobre “La mondialisation: Evaluation éthique et perspectives évangelique”. Em 16.09.2008 este texto serviu de base para uma Palestra na Faculdade de Teologia Integrada em Igarassú/Pernambuco.

De fato, o fenômeno da globalização, hoje em dia, acelera e enriquece o impacto dos movimentos transcontinentais e dos modelos de interação social. Isto provoca transformações nas organizações que pretendem aproximar povos distantes. Embora haja progresso na aproximação dos povos entre si, contudo não se pode entender a globalização como o anúncio de um mundo harmonioso, ou como um processo universal de integração global que produzirá uma convergência final de culturas e de civilizações. Uma crescente consciência de solidariedade recíproca produz também novas formas de insegurança e de conflitos. Pois uma grande parte da humanidade permanece excluída dos benefícios da globalização, o que leva a protestos. No sentido econômico, a globalização está acompanhada por um aspecto impiedoso, inerente aos organismos financeiros e às empresas industriais, que concentram um enorme poder de decisão e de dominação sobre milhões de pessoas em todo o mundo.

Opor-se à globalização não tem sentido. Pois, todos usamos a internet, que nos insere como indivíduos numa rede mundial de interrelações. O que convém fazer é analisar a situação (ver); depois elaborar um conjunto de princípios morais, à base dos quais é possível emitir um julgamento crítico (julgar); encaminhando uma resposta prática em função das necessidades comunitárias concretas (agir).

Inventariar as características típicas de nossa época exige mais do que uma análise científica neutra e objetiva. Exige também um processo de discernimento que identifique as necessidades de humanização do mundo. Para promover esta humanização nada melhor do que seguir os princípios do Evangelho de Jesus Cristo. Pois, o Evangelho é uma Boa Nova para todos os homens e para o homem todo.

Esta humanização não é uma tarefa fácil, pois nos confronta com as ambiguidades da história humana. A história nos confronta com as tendências positivas e negativas, que, por um lado, tendem a promover a vida e a qualidade de vida, mas, por outro lado, também atentam contra a dignidade humana. Num sentido evangélico cristão, os aspectos positivos representam aquelas realidades que contribuem para a realização dos sinais do Reino de Deus na terra, que são a dignidade humana e o bem-estar de todos; os aspectos negativos se identificam com todas as injustiças que atentam contra a dignidade humana. Para se fazer uma análise adequada destes aspectos exige-se um sério discernimento e uma reflexão ética, que toma em consideração a realidade concreta das diversas sociedades. E, em função dos discernimentos já realizados, constata-se a existência de inúmeras vítimas da globalização, como: os pobres e miseráveis, os desempregados, os trabalhadores sub-pagos, os sem-terra, os sem-teto, os migrantes econômicos, etc. Dali a pergunta fundamental: a globalização pretende partilhar as riquezas do mundo com os mais necessitados? Os pobres não podem ser apenas tratados como objetos de decisões bem intencionadas. É necessário que se conduza a mundialização para o objetivo de transformar os pobres e as vítimas da globalização em parceiros da sociedade mundial, onde participem efetivamente nas decisões que os afetam, através de movimentos sindicais ou sociais. Somente se isto for tomado em consideração a globalização se transformará num sinal de esperança para o futuro, capaz de despertar novas forças no homem, orientando todas as coisas para o bem.

VER

O que se pode assinalar numa análise teórica da globalização? Não muito mais do que tentar identificar as relações que se estabelecem entre os aspectos econômicos, tecnológicos, políticos e culturais. É o que tentaremos fazer a seguir.

Sem dúvida, as mudanças tecnológicas e econômicas são as mais visíveis neste processo de globalização. E os seus efeitos repercutem na vida de milhões de pessoas. No mercado mundial criaram-se possibilidades novas, até hoje desconhecidas, permitindo a troca de bens, de serviço e de capital. Em princípio, este dinamismo deveria gerar investimentos e inovações, ampliando os empregos e assegurando uma melhor satisfação das necessidades fundamentais da humanidade. Este otimismo, no entanto, não se verifica. Pelo contrário, até se fala numa “tragédia da exclusão”, provocada pelo processo da globalização. Pois, em numerosos países, os 10% de pobres dispõem de menos de 1% dos rendimentos nacionais, enquanto os 20% de ricos dispõem de mais da metade destes recursos. E as pesquisas demonstram que uma melhoria da situação de pobreza não é possível sem um programa político efetivo que estimule a redistribuição das riquezas nacionais e mundiais. E donde resultam os efeitos negativos da globalização? Os analistas apontam uma conjugação de causas, entre as quais destacam três: a política do Fundo Monetário Internacional (FMI), orientado para a liberalização dos mercados financeiros; a agenda comercial injusta da Organização Mundial do Comércio(OMC); e a bio-pirataria, i.e., a injusta apropriação dos direitos sobre as medicinas naturais e os alimentos utilizados, durante séculos, pelos indivíduos. Com isto aumenta o fosso entre ricos e pobres: “os ricos ficam cada vez mais ricos, e os pobres cada vez mais pobres”.

Outro efeito da globalização é a assim chamada “destruição criativa”: se, por um lado, novos empregos são criados, por outro, numerosas ocupações são eliminadas. Em busca de lucro as empresas se reestruturam ou se fundem, reduzindo mão de obra. Em conseqüência, muitos trabalhadores perdem seu emprego, ou não encontram mais emprego depois dos 40 anos. Muito contribui para isto o mercado financeiro, que é frio, pois apenas visa o lucro de seus acionistas e investidores. Em alguns países também há diminuição de emprego por causa da transferência de empresas para países com mão- de-obra barata. De certa forma, os trabalhadores do mundo entram em concorrência. Empresas multinacionais se transferem para o 3º. Mundo, substituindo os operários europeus caros, por trabalhadores baratos nos países subdesenvolvidos. E a estes pagam salários que, muitas vezes, chegam a ser insultantes. Assim, a globalização também traz consequências negativas para os pobres do Terceiro Mundo. A vida dos operários, dos agricultores e dos pescadores se torna mais difícil, em função dos salários inumanamente baixos, e das condições de trabalho malsãs que eles são obrigados a aceitar para conseguirem sobreviver. Os cereais produzidos, muitas vezes geneticamente modificados, encarecem e se tornam inacessíveis aos trabalhadores, ou são transformados em forragens para a alimentação animal; os pequenos pescadores já não conseguem sobreviver, devido à pesca industrial com navios pesqueiros.

Em todo o mundo, por efeito da globalização, as características do trabalho são modificadas. E a pressão sobre os indivíduos cresce. Os que não conseguem se adaptar, os que não conseguem acompanhar o ritmo, correspondendo ao nível de conhecimentos exigidos pelo mercado, são excluídos.

O problema não se restringe somente à pobreza, mas também à exclusão e marginalização das pessoas. Os jovens já não têm acesso a boas escolas, mas a escolas onde cresce a violência. A vizinhança se torna insegura, e o trabalho é raro. No quarto-mundo os párias da sociedade pós-industrial aumentam, morando em bairros onde a violência e o racismo acontecem todo dia. A exclusão acontece principalmente nos grandes centros urbanos, onde mora a maioria da população mundial, contrariamente a séculos passados, quando apenas 10% da população morava em cidades.

As consequências da globalização não atingem somente as pessoas com formação insuficiente, mas também os executivos. Exige-se deles disponibilidade, flexibilidade, horas de trabalho prolongadas, frequentes viagens: um ritmo de vida com consequências em sua vida familiar e privada. Por isto, não é por acaso que, neste ambiente, aumentam as depressões, e o consumo de antidepressivos cresça astronomicamente. Prozac é o remédio da vida agitada do mundo desenvolvido.

Mas a pressão criada pela concorrência e pela obrigação de resultados também tem seus efeitos positivos: aumento das inovações, desenvolvimento de novos métodos de produção, novas tecnologias. Mas, a que preço para os indivíduos? O valor da pessoa se reduz à sua utilidade econômica. As pessoas somente valem em função do mercado de trabalho. Isto, de certa forma, destrói o direito do ser humano à existência. Este direito está condicionado ao rendimento na empresa. Se este rendimento diminui, a pessoa é substituída por outro tipo de recurso humano.

Paralelamente a esta redução da pessoa a uma função instrumental, o mundo caminha para uma mercantilização. Para cada produto se cria um mercado mundial, inclusive para as “estrelas” do futebol, que o Brasil exporta, como se exporta o café, a soja e as matérias primas. Este mercado mundial não gera apenas bens e serviços, mas cria cultura; e o que esta cultura apresenta como bom ou precioso se torna lei.

Em certos casos se pode falar até em tirania do mercado, ou até em colonização pela economia. Os bens econômicos sob muitos aspectos determinam as normas da vida, considerando negativamente a proteção social dos indivíduos. A relação entre ricos e pobres simplesmente é regida pela lei do mais forte, sem tomar em consideração a vulnerabilidade estrutural de muitas pessoas. Na prática, pessoas idosas, doentes, agricultores, pessoas com necessidades especiais não se sustentam sem uma proteção social legal. Nesta ditadura dos mercados mundiais os indivíduos não passam de consumidores. Os bens se transformam em ídolos e em símbolos de status e de prestígio. A publicidade suscita constantemente novos desejos, sugerindo que o mercado será a resposta para todos os problemas. Com o tempo o consumidor se torna dependente desta roda viva do mercado. Acontece, assim, uma inversão de valores: o valor humano se mede em função dos valores materiais, o homem é reduzido a objeto, e as autênticas necessidades humanas são suplantadas pelo estímulo por bens artificiais. Quem não trabalha e não pode fazer compras não possui lugar neste universo determinado pelos objetos. Ele é descartado. E esta é uma nova forma de exclusão.

Outra consequência da globalização em diversas partes da terra, como Europa e Estados Unidos, são as ondas migratórias. Estes migrantes não são apenas pobres e refugiados. Entre eles há também pessoas instruídas, que fogem de catástrofes naturais ou buscam condições melhores para seus filhos. E nem sempre a imagem idealizada dos países que atraem migrantes corresponde à realidade. Mas, estas ondas migratórias, produzem cada vez mais sociedades multiculturais.

A globalização política e a busca por uma nova ordem mundial

Os Estados nacionais já não conseguem se contrapor ao poder econômico das empresas multinacionais. Entre estas multinacionais surgem algumas que se propõem dar uma contribuição positiva ao país onde se instalam: criam empregos, desenvolvem produtos novos úteis à sociedade, como medicamentos, etc. São as empresas socialmente responsáveis. Pode-se dizer, ainda pouco presentes e visíveis na realidade brasileira. É claro, o que mais se mostra é as multinacionais conquistando vantagens nos países subdesenvolvidos em que se instalam. Os poderes locais se tornam seus dependentes, por causa de seu poder econômico. Consequentemente as sociedades criam os organismos não governamentais (ONG). Certos fatos, que não chegariam ao público, são divulgados pelas ONG’s; elas favorecem a transparência e denunciam a corrupção. Algumas multinacionais apóiam ONG’s, pois podem ser boas interlocutoras entre a população, as empresas e o Governo. E há algumas ONG’s que se destacam. Por exemplo, o Greenpeace, os Médicos sem fronteira, e muitas outras. Certas tendências prejudiciais provocadas pela globalização sofrem, muitas vezes, vigorosa oposição por parte das ONG’s, que são organizações da sociedade civil.

Em certos ambientes há um forte desejo por uma nova autoridade mundial, detentora de um poder mais forte do que a ONU. Sob certos aspectos isto poderia ser positivo, mas de outra parte poderia ser fonte de potenciais males. Deve-se, por isto, evitar dois extremos. Pois, um governo ou força política mundial poderia se transformar num poder centralizador perigoso. Uma espécie de “super Leviathan”. E, para um tal poder poderia valer o adágio de que “o poder corrompe” e o “poder absoluto se corrompe absolutamente”. Um poder demasiadamente centralizador poderia se transformar num destruidor da diversidade política e cultural, em nome de um cosmopolitismo universal. Mas, por outra parte, diminuiriam as concorrências nacionalistas e étnicas. Já por ocasião da Revolução Francesa, Rousseau ensinava que a multiplicidade de Estados independentes era fonte permanente de conflitos, embora um mosaico de Estados seja a garantia do respeito e da proteção à diversidade cultural. Certamente, a globalização já aproximou povos, promovendo uma integração complexa, o que, sem dúvida, produziu efeitos positivos. Mas, os Estados nacionais ainda continuam importantes para preservar as diferenças culturais. Contudo, os organismos internacionais devem ser fortificados, pois contribuem para a paz no mundo e a solução de certos problemas mundiais. O nosso tempo é muito criativo em organizações; algumas se firmam, outras sucumbem. Ninguém ignora hoje a ONU, a Comunidade Européia, as redes comerciais e culturais, o MERCOSUL, o Fórum Social Mundial, etc. E aqui entram também as religiões com suas organizações e intercâmbios mundiais. Sem dúvida, elas são muito importantes no cenário mundial para que se consiga uma paz mais sólida.

A este processo de globalização também se opõem forças potentes, como o fundamentalismo árabe, os conflitos étnicos e os nacionalismos ideológicos, que se recusam a participar de um diálogo mundial. Estes movimentos temem por sua cultura, por sua identidade e geram um certo paradoxo no mundo a caminho da globalização, pois provocam nele uma nova fragmentação.

Globalização da cultura

Ninguém pode ignorar a influência profunda da globalização na estrutura da vida em comum e no desenvolvimento dos mercados mundiais. Uma das consequências é a mistura cultural, principalmente nos grandes centros urbanos. Em certos ambientes, esta realidade provoca reações por parte da extrema direita, que gostaria de preservar a pureza dos costumes nacionais, apelando, inclusive, para métodos desumanos.

Com certeza, as mudanças rápidas provocadas pela globalização significam para muitos um verdadeiro choque cultural. A cultura material muda rapidamente, enquanto a cultura imaterial muda mais lentamente. Dali um certo fosso cultural entre estes dois níveis. A tecnologia da mídia nos insere no vasto mundo, mas nossos valores permanecem os valores de nossa aldeia. Por outro lado, num cybercafé o homem pode se esquecer que o homo sapiens não nasceu ali, neste mundo virtual de palavras escritas num écran, mas no contato com seres concretos de carne e osso. Neste ambiente de mundo virtual se desenvolve uma espécie de “anomia”, onde os pontos de referência desaparecem e não existe um sentido de vida consistente. Acontece aqui mais um paradoxo. Enquanto se articulam referências mundiais, o indivíduo se isola em sua casa ou escritório atrás de um computador, ou aparelho de TV. E este homem, aos poucos, se percebe isolado socialmente, sentindo sua identidade abstratamente solta.

Hoje, muitas vezes nos sentimos como que assoberbados por um excesso de informação. O que, em si, é um fator positivo. Pois, como habitantes deste mundo, somos imediatamente informados sobre os acontecimentos nos quatro cantos da terra, uma terra muito homogênea. Mas isto produz uma sensação de nivelamento de toda a humanidade, como se uma única civilização se espalhasse por toda a terra. E nos dá a impressão de que já nada se produz de novo, pois sabemos tudo o que os outros produzem. Num único prato de comida podemos estar consumindo salmão do Chile, guloseimas do México e molhos da Malásia.

Esta superabundante informação exige que se saiba interpretar criticamente o que nos é comunicado. Para isto exige-se que reflitamos global e transversalmente. A globalização não pode ser somente econômica, mas deve acontecer também uma globalização das consciências. Para que se adquira esta consciência aberta ao universal é importante o conhecimento da literatura mundial. E aqui ainda existe, em nosso meio, um imenso campo a ser desenvolvido. Pois, o que nós conhecemos da literatura e da vida de um bilhão de muçulmanos, de hindus, de chineses? Praticamente nada!

Se a globalização deseja ser um movimento verdadeiramente humano, é necessário que o indivíduo não seja simplesmente um objeto, mas um sujeito participante na transformação. Isto vamos considerar no momento em que se tenta julgar este processo.

JULGAR

A globalização, em princípio, não é boa nem má. Ela será o que os homens fizerem dela. A globalização possui uma lógica própria, mas não pode dispensar a ética. De uma parte necessita de uma ética global; de outra, de uma ética específica.

A necessidade de uma ética global

De acordo com a Carta da Terra, acontece no mundo, de uma certa forma determinística, um constante processo de interdependência, de socialização. O futuro da terra está mais provido de promessas do que de perigos. Assim, seria possível antever que a humanidade caminha para formar uma única grande família, uma única comunidade mundial, embora preservando uma formidável diversidade de culturas e formas de vida. Isto soa que, em escala planetária, muitos dos nossos problemas somente poderão ser resolvidos em nível mundial, com normas que transcendem os homens e as culturas, como, por exemplo, a falta de água potável, o efeito estufa, o fosso entre ricos e pobres, as migrações. A partir disto, uma ética global deve estar fundamentada para além das contingências de lugar e tempo. Ela deve evitar que as decisões econômicas ou políticas favoreçam os interesses particulares ou estejam contaminadas pela arbitrariedade do poder. Dali a necessidade de normas racionais universais: o reconhecimento de cada homem como ser humano, não somente como detentor de direitos, mas reconhecido como pessoa com dignidade inalienável. Todas as realizações sociais, políticas e econômicas devem ser apreciadas à luz de sua contribuição no crescimento da dignidade humana, não em sentido abstrato, , mas como dignidade da pessoa concreta, o que significa um respeito para com a diversidade de culturas e religiões. Uma âncora importante para a dignidade humana é a Declaração Universal dos Direitos humanos. Já seu primeiro artigo diz que: todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Claro, esta dignidade pode repousar em diversos fundamentos. No cristianismo, por exemplo, se crê que todos os homens foram criados à imagem e semelhança de Deus, e que Cristo veio salvar a todos. Estas afirmações da fé inspiram uma solidariedade a ser partilhada entre todos os homens.

A teologia cristã defende a dignidade da pessoa toda e de todas as pessoas, contrariamente à redução do ser humano à sua dimensão econômica. E isto implica a busca do bem-estar para todos. Dali a obrigação dos cristãos de apoiarem a todos os que se empenham em trabalhos humanitários.

É verdade, a globalização não é uma idéia ou valor novo. Já quatro séculos a.C. Alexandre Magno pensou num império mundial; os estóicos difundiram a ideia da unidade da humanidade, bondosa e para além da própria cultura: o homem sábio não conhece fronteiras para a sua bondade; é solidário para com todos, ele é cidadão do mundo.

Em nossa época a construção de uma ética global, universal, recebe o apoio do diálogo interreligioso. O Conselho Mundial das Igrejas deseja uma organização global, que se fundamente numa ética global. Esta deve-se fundamentar em dois grandes princípios: de uma parte, tratar cada pessoa com humanidade; de outra parte, aplicar a regra de ouro: tratar aos outros, como nós mesmos desejamos ser tratados. Quatro regras básicas explicitam estes princípios: engajamento por uma cultura da não-violência, fundamentado no mandamento “não matarás”; engajamento por uma cultura da solidariedade, dentro de uma ordem econômica justa; engajamento por uma cultura de tolerância e uma vida autêntica; engajamento por uma cultura de igualdade e parceria entre homens e mulheres.

Se estes princípios e regras forem assimilados, certamente a pessoa se chocará vendo uma criança morrendo de fome, pois o ver uma mãe incapaz de alimentar seu filho é uma experiência negativa universal, e confirma o direito a uma vida digna. A experiência de qualquer genocídio confirma a maneira pré-reflexiva de interdição de praticar genocídios, o que também significa a necessidade de respeitar as minorias.

Em busca de uma ética da globalização

Não basta apenas propor uma ética universal. É necessário também indicar os princípios e as normas pelos quais se seleciona as questões significativas para a globalização. Os dois princípios básicos são: a dignidade humana e o bem-estar geral. Num sentido cristão, estes dois princípios se concretizam especialmente na opção preferencial pelos pobres e pelas vítimas da história.

O bem-estar geral e mundial

O bem-estar geral e mundial supõe, em primeiro lugar, uma avaliação das decisões a partir da questão: quais serão as conseqüências para os pobres. Todo mundo sabe que a humanidade necessitaria de uma nova ordem financeira, de uma nova lei econômica internacional, pois três bilhões de seres humanos vivem com menos de dois dólares por dia. Isto deveria sensibilizar a muito mais gente. Pois alguma coisa deveria ser feita. Para isto bastaria aplicar um princípio de justiça muito antigo: o uso comum dos bens, ou a destinação universal dos bens da terra, pois cada qual tem direito a uma parte. Esta é a condição sem a qual não haverá humanização do direito à propriedade.

Se o direito à propriedade particular estimula os empreendimentos isto implica uma responsabilidade, ele jamais poderá ser usado como meio de exclusão. Tanto a indústria como a agricultura deveriam contribuir para um trabalho útil. Só neste sentido estes empreendimentos são legítimos. O ambiente de trabalho também deve ser ético, e não permitir a exploração e a humilhação do trabalhador. O amor ao próximo e a justiça exigem que o direito à sobrevivência se sobreponha ao direito à propriedade particular. A propriedade particular, embora particular, sempre inclui uma função social. Portanto, qualquer apropriação de bens deve respeitar a satisfação das necessidades humanas reais. No caso de remédios, por exemplo, é permitido eticamente a quebra de patente, quando uma indústria farmacêutica pratica preços abusivos, impedindo à população carente o acesso a estes medicamentos. Isto, inclusive, é permitido pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Embora, naturalmente, seja complicado quebrar patentes, pois 97% das patentes estão nas mãos de indivíduos, ou empresas de países ricos do Ocidente.

O direito à propriedade não pode ser invocado em favor da bio-pirataria. Por isto, os conhecimentos sobre o genoma humano, dos animais e das plantas não podem ser propriedade exclusiva de grandes empresas, especialmente quando podem causar prejuízos econômicos e pessoais às populações envolvidas. Neste sentido, certamente não é justo que empresas estrangeiras se apropriem das propriedades de plantas da Amazônia, e as patenteiem no exterior, impedindo a exploração no país de origem; ou que o Japão patenteie a rapadura, ou a Alemanha, a cachaça da cana-de-açúcar. Neste sentido, também se pergunta se a água pode ser privatizada, ou se é um bem público. Será que o Brasil não poderia cobrar uma taxa aos navios estrangeiros que enchem seus porões com água da Amazônia, sob a alegação de lastro, e depois vão tratar esta água e vendê-la aos países árabes?

Solidariedade, amor radical e subsidiariedade

A humanidade necessita de uma globalização da solidariedade. O conceito de solidariedade nos lembra os laços que unem a humanidade, e rejeita a idéia de que a sociedade é formada pela soma de individualidades. Embora o conceito de solidariedade tenha sido criado no séc. XVIII no contexto dos problemas surgidos com a industrialização, a sua idéia é antiga. A idéia bíblica da solidariedade entre os homens se fundamenta na solidariedade de Deus para com os homens. A Bíblia não fala dos interesses de indivíduos, mas da comunidade e da fidelidade desta comunidade. E, segundo a teologia cristã, nós somos todos um em Cristo. Somos todos filhos do mesmo Pai, criados à imagem de Deus.

O cuidado que deveríamos ter pelas coisas sociais nos apontam três acepções do conceito de solidariedade: a sociológica, a ética e a especificamente cristã.

Em primeiro lugar, a solidariedade é um fato sociológico. Neste sentido, ela é sinônimo da socialização, que consiste na interdependência entre pessoas, países e continentes; uma interdependência reforçada pelo processo de globalização. Esta socialização vem acompanhada por um crescente intervencionismo do Estado, contrariamente à ideologia do Estado mínimo do neoliberalismo.

Numa segunda acepção, o conceito de solidariedade evoca a resposta ética à afirmação de que “todos nós somos verdadeiramente responsáveis por tudo”. A solidariedade, portanto, não se resume a um sentimento de compaixão vaga em relação à miséria de tantas pessoas próximas ou distantes. Pelo contrário, a verdadeira solidariedade produz uma determinação firme e perseverante de trabalhar pelo bem comum, i.e., pelo bem de todos e de cada um, com a consciência de que todos somos responsáveis por todos. A solidariedade que se exige, neste nível, não é apenas um dever dos indivíduos, mas também das sociedades e dos Estados. Esta responsabilidade universal implica uma redistribuição das riquezas, inclusive do trabalho e da propriedade. Esta interdependência deve transformar-se numa solidariedade, fundamentada sobre o principio de que as riquezas existentes são destinadas a todos. O que implica no direito a uma existência digna para todos os homens. Este direito compreende, entre outros: o direito aos bens da saúde; o direito a uma escolaridade geral; o direito a uma formação mais adequada ao emprego; o direito a uma vida longa, ao trabalho, ao tempo livre e ao lazer.

A terceira acepção do conceito de solidariedade, especificamente cristã, se fundamenta nas anteriores, e confere uma fundamentação teológica à dimensão ética. A solidariedade como “virtude cristã” lembra a gratuidade da vida, do perdão e da reconciliação. A solidariedade cristã não se restringe a uma responsabilidade recíproca entre os homens, que respeita o direito de cada um. Nesta solidariedade cristã o próximo não é apenas um sujeito com direitos iguais, mas uma pessoa, imagem e semelhança de Deus, em relação à qual é necessária uma atitude de respeito, que se disponibiliza para o sacrifício. Diante do necessitado, isto significa que não apenas lhe ofereçamos o supérfluo, mas inclusive o necessário. Desta forma, a solidariedade cristã transforma a ética universal, fundamentada na razão, em uma moral radical de testemunho. Nesta moral a preocupação com o bem comum tem a mesma intensidade das preocupações conosco mesmos: “amar ao próximo como a si mesmo”.

A solidariedade humana e a solidariedade cristã são complementares. Os cristãos apenas fortificam a solidariedade humana com uma dimensão teologal, pela qual acreditam que a transformação da história somente acontecerá se forem vencidas as estruturas de pecado.

Esta proposta de uma solidariedade universal também tem os seus limites. Poucos povos permitem que outros povos se intrometam em seus problemas internos. Alguns pensadores, como por exemplo J. Rawls, pensam que a prática da solidariedade universal é impossível por causa das legislações e culturas específicas de cada povo. Mas, nada impede que haja uma preocupação internacional para melhorar o nível de vida de todos os homens, e que o direito público internacional seja aperfeiçoado. Assim, a preocupação internacional não deve ser, em primeiro lugar, em prover as pessoas com bens materiais, mas em contribuir para que cada povo tenha suficiente liberdade. que permita o seu desenvolvimento próprio com dignidade. Assim, deve haver uma preocupação internacional com um comércio justo, sem fraudes; com empresas que paguem um salário digno aos trabalhadores nos países em condições desfavoráveis, evitando bio-piratarias e exploração de pessoas.

Mas estas preocupações com a solidariedade não legitimam um Estado totalitário que se intromete em todas as dimensões da vida. A sociedade civil é complexa, e os indivíduos se associam de múltiplas formas. O Estado não deve querer dirigir tudo: famílias, grupos beneficientes, sindicatos, partidos políticos, organizações educacionais, ONG’s etc... Importante que o princípio de subsidiariedade seja respeitado. Onde o Estado não respeita o princípio de subsidiariedade a política corre o risco de se tornar totalitária. Um Estado não pode subjugar as iniciativas dos cidadãos. Por isto é importante que existam as organizações intermediárias entre o cidadão e o Estado, como as igrejas, as ONG’s.

Por um mundo mais equitativo

A justiça é um dos conceitos bíblicos mais importantes. Os profetas ensinam que a justiça está indissoluvelmente associada ao conhecimento de Deus, especialmente a justiça para com os mais necessitados, como os pobres, as viúvas, os órfãos. E esta justiça não consiste em boas intenções, mas na realização do direito de cada um para que tenha uma vida humana digna. E o Evangelho não separa a justiça da misericórdia, pois o espírito de justiça pode até se demonstrar impiedoso. Tradicionalmente se distingue na justiça três níveis:

- A justiça comutativa: que se refere às relações justas no comércio e nos contratos. Aqui se trata das relações de trabalho, salários justos, das relações entre países ricos e pobres, dos preços das matérias primas e dos produtos.

- A justiça geral: exige do cidadão que contribua para o bem geral. Poderia chamar-se esta justiça de justiça contributiva. Esta contribuição não é apenas econômica, mas é também de natureza social, artística, intelectual ou contemplativa. Esta é a justiça da partilha de bens e de dons, necessária para o bem-estar de todos. E aqui a pergunta: como a globalização contribui para que os bens de nossa civilização se tornem acessíveis a cada vez mais pessoas: os alimentos, a segurança, a saúde, a educação, o direito à liberdade com participação na política? Já que a globalização aumenta o fosso entre ricos e pobres, como tomar medidas urgentes para corrigir isto? E quando os indivíduos não têm condições de ter acesso a estes bens, a sociedade deve contribuir para que isto aconteça. É importante que os cidadãos possam participar das decisões que afetam seu futuro e o futuro de seus descendentes.

- A justiça social: não se refere apenas à distribuição dos bens públicos, mas é também uma maneira de contribuir para que a liberdade real de uma pessoa lhe permita o acesso a uma formação, que lhe confira as competências de base necessárias para participar da vida sócio-econômica.

AGIR

Não é suficiente formular os princípios básicos de uma ética da globalização, ou ser capaz de julgar a globalização. Mas deve-se também ter em mente gestos concretos que contribuam para a humanização do ambiente da vida humana.

A necessidade de um reencantamento do mundo

Para humanizar a globalização é necessário compreender o seu sentido e descobrir os seus riscos . Qual a filosofia subjacente à globalização? O que permite hoje uma aproximação global entre os homens? Já os filósofos estóicos falavam de uma única humanidade. Será que hoje a globalização não é vista demasiadamente como fenômeno econômico e técnico, a ponto de a ética e a religião serem marginalizadas neste processo? Os que privilegiam a compreensão econômico-tecnológica da globalização parece se conduzirem simplesmente por uma interpretação materialista da história. De acordo com esta interpretação, a ética e a religião nada mais são do que super-estruturas culturais, que brotam das situações econômicas e técnicas. Mas esta interpretação é suficiente para compreender a globalização?

A partir da metáfora da Torre de Babel, a globalização pode ser entendida como um fator de divisão entre os homens. A esta figura se pode opor a metáfora de Pentecostes. Em Babel os homens se confundem e se separam; em Pentecostes todos se entendem e se aproximam. Parece que as identidades étnicas, as religiões, as diversidades culturais e políticas lembram mais Babel, e são um obstáculo à globalização. Mas Pentecostes nos lembra que toda a humanidade se pode entender, mesmo na diversidade de línguas e culturas. Dali existir a convicção que a globalização pode ser vivida a partir de um espírito novo. Um novo universalismo não apenas fundamentado numa nova moeda comum ou em bens materiais, alimentados por um neoliberalismo destruidor, onde os pobres são as vítimas. O neoliberalismo, como hoje age em diversos níveis, pode levar a humanidade a uma nova Babel, pois carrega em si as potencialidades da violência. Por isto é preciso valorizar outros aspectos da globalização, fomentando um novo humanismo, fundamentado sobre a participação e o intercâmbio de todos os povos, de todas as culturas, respeitando as diversidades políticas e religiosas, confiantes no Espírito de Pentecostes, que fará novas todas as coisas.

A mão invisível

Depois de Adam Smith (1776) o pensamento econômico ocidental está dominado pela metáfora da mão invisível. Segundo esta metáfora, os indivíduos, buscando seus interesses individuais, contribuem, de forma misteriosa, para o bem de todos. Esta ideologia entende o mundo mecanicisticamente, onde Deus não interfere. A visão bíblico-cristã é diferente. Nela, o homem é um ser social, cuja existência se desenvolve segundo uma aliança originária. Nesta aliança Deus se manifesta como o Deus do amor, que aproxima os homens entre si. Num mundo, de fato cristão, se multiplicam as relações dos homens entre si, com a tendência da unificação do gênero humano.

A metáfora da terra: um mundo transformado numa comunidade de amor

Mais do que simples matéria, a terra foi criada por Deus; ela é fonte de vida, dentro de um sistema ecológico vulnerável, no qual o homem e a natureza estão situados, e do qual o homem é gerente. Neste mundo complexo, Deus renova constantemente sua criação. Disto é preciso tomar consciência, pois, segundo Teilhard de Chardin, neste mundo, nada é puramente profano. Em toda a parte vemos a obra de Deus. Inácio de Loyola, ao final de seu livrinho sobre os Exercícios Espirituais, diz: “Considere como Deus está agindo em suas criaturas: aos elementos deu a existência, às plantas deu a força do crescimento, aos animais deu a percepção, aos homens deu a inteligência, e a mim deu a existência, a vida, a percepção e o pensamento... Considere atentamente como Deus age em todas as coisas criadas sobre a face da terra, dando lhes a existência e as conservando, em lhes oferecendo vida e percepção... Tudo vem de Deus fonte do amor, como os diversos raios vêm do sol e as águas da fonte.”

De acordo com esta visão mística de um mundo dinâmico unido a Deus, tudo sugere que a globalização não se pode reduzir a um acontecimento material ou a um processo econômico e tecnológico. Mas, ao contrário, é um processo humano no qual o homem participa ativamente com a presença divina, permitindo uma visão otimista, confiante de que neste processo atua o Espírito de Deus, conduzindo tudo para uma comunidade de amor entre os homens. Otimisticamente, Teilhard de Chardin fala num processo de amorização do mundo, i.e., justamente a trasformação do mundo numa comunidade de amor. Os sinais desta amorização seriam justamente a crescente interdependência dos homens entre si, e dos homens com a natureza.

De acordo com esta visão, a globalização não é simplesmente um acontecimento fortuito e puramente material; ela é a evolução e o desenvolvimento da solidariedade entre os homens e de sua relação com a natureza. Por isto, o homem não deve ser visto nem como um objeto de um processo econômico anônimo, nem envolvido deterministicamente de forma implacável por uma cadeia de relações causais. Em união com Deus e com a terra, ele é co-criador, participa de uma obra grandiosa em que todos os elementos da terra são penetrados e animados pelo Espírito de Deus. Este processo não acontece sem resistência e sem sofrimento. Dali os laços necessários entre a terra e a amorização (o surgimento de uma comunidade de amor).

Como contribuir para este futuro novo do mundo? Aqui há lugar para muita criatividade. Pois, em qualquer lugar onde vivamos há mais coisas a fazer do que somos capazes. A nível mundial, talvez, pouca coisa consigamos fazer. Pois tudo se decide longe de nós, nas altas esferas políticas e econômicas. Mas, ao menos podemos estar atentos ao que ocorre nestes níveis mundiais, e formar uma opinião crítica. Não podemos ficar indiferentes diante da exploração de organismos financeiros internacionais, diante das injustiças comerciais e dos atentados contra a dignidade humana. Os problemas do meio ambiente nos afetam, salários injustos, trabalho semi-escravo, falta de saúde, de educação, falta de emprego, tudo isto, muitas vezes, tem raízes para além de nossas fronteiras.

Se cuidarmos de nosso meio ambiente, de uma agricultura com menos agrotóxicos, de um comércio justo, da melhoria da justiça... já estamos realizando a nossa tarefa.

Se nada disto nos é possível, ao menos podemos nos dispor a colaborar com todas as pessoas de boa vontade. Podemos nos engajar em ONG’s, em sindicatos, em associações, em partidos políticos, em grupos de contestação perante injustiças para que surjam estruturas mais justas. Lutar por condições melhores de trabalho, por salários mais equitativos. De certa forma, é necessário se engajar associativamente, pois as associações são um lugar privilegiado da formação de cidadãos.

O motor de toda esta participação não deveria ser o lucro, mas o serviço mútuo. Neste sentido se fala em terceiro setor, em economia solidária. Em nível pessoal podemos também contribuir na verdadeira globalização: a humanização do mundo exige também um combate interior e um engajamento consciente. Gandhi dizia que devemos instaurar em nós mesmos as mudanças que desejamos para o mundo. Isto exige que aprendamos a por à disposição, com qualidade, as competências que podemos demonstrar. Sem competência nossas ações são ineficientes e sem calor humano. Podemos nos perguntar quais são os nossos modelos de consumo, de vida espiritual... O nosso estilo de vida também tem consequências sociais.

Conclusão

O processo da globalização, por si mesmo, não é bom, nem mau. Tudo depende do que fizermos com a globalização. Não podemos dispensar uma abertura crítica em relação a este fenômeno.

De uma parte, a globalização é a abertura para uma realidade dinâmica que intensifica as solidariedades humanas. Tudo o que é bom, tudo o que estimula a dignidade e a solidariedade humana deve ser valorizado.

De outra parte, é também necessário observar a globalização a partir de um ponto de vista crítico. Pois, há momentos em que ela atenta contra a dignidade humana, a diversidade cultural, e transforma os pobres em vítimas. E isto é motivo de protestos altos e fortes.

O verdadeiro objetivo da globalização deve ser a melhoria na dignidade humana. A busca de um mundo mais solidário e mais justo.