Darwin, no cinema e na poesia de Marcelo Roque, incertezas e belezas da ciência no século XXI
Glória Kreinz
A linguagem é um dos objetos que usamos em nosso cotidiano de escritores, e está sempre em discussão.Refletindo sobre a declaração de Marcelo Gleiser, que diz “criamos uma linguagem para descrever o mundo, que não podemos deixar de achar bela”, pensamos então que a circulação de sentidos diz respeito aos fenômenos de comunicação/divulgação científica, e ao ato de escrever na sociedade atual.Diz respeito também à beleza.
Divulgação científica diz respeito sobretudo a qualidade de vida e o que acontece ao nosso redor. Li no Blog Laboratório da Folha de S. Paulo, o seguinte texto escrito por Reinaldo Luiz Lopes:
“Até que não demorou muito para se resolver a novela da exibição do filme "Creation", a (aparentemente) bela cinebiografia de Charles Darwin, nos cinemas dos Estados Unidos. Este blogueiro havia noticiado a choradeira da produção do filme, segundo a qual a influência do movimento criacionista sobre o público americano ficou tão grande que a obra não estava conseguindo distribuidores no país.
"Por sorte, a situação mudou. O filme foi encampado pela Newmarket Films e vai ser exibido em dezembro. Ainda não temos data de lançamento por aqui.
"Cá entre nós, a vida de Darwin interessa a todos, cientistas ou criacionistas. Aos que temem a "poluição" por ideias supostamente nocivas à sua fé, vale o conselho de São Paulo na Primeira Carta aos Tessalonicenses: 'Examinai tudo e guardai o que for bom'.
"Agradecimentos ao Luiz Bento, do Discutindo Ecologia, por nos avisar sobre o fim da saga."O texto foi escrito por Reinaldo José Lopes, do blog Laboratório da Folha de S. Paulo.
Acreditamos na liberdade de expressão, estamos aqui nos expressando neste espaço.Diante disso, como conceituar o ato de divulgar ciência e tecnologia, mesmo diante de todo o otimismo dos avanços de hoje? Restrições a um filme sobre Darwin? Como ficamos nós escritores diante disso?
Vimos em vários artigos a respeito de células-tronco que não se pode dizer que as células formaram músculo cardíaco, pois ainda é preciso elucidar o mecanismo que garante os efeitos relatados”. Mas o relato da experiência chega às escolas e a um grande público, mesmo que a pesquisa não seja definitiva.
José Reis afirma que “a divulgação científica realiza duas funções que se completam: em primeiro lugar, a função de ensinar, suprindo ou ampliando a função da própria escola; em segundo lugar, a função de fomentar o ensino”.
Na proposta de J. Reis a divulgação científica não se cristaliza em uma definição, mas é focalizada como acontecimento e ato, exercendo funções, portanto com características ligadas aos aspectos sociais e críticos da cultura. Nesse sentido o blog que citamos atua como exemplo. Faz uma crítica cultural, assim como nós escritores tentamos fazer em nossos artigos.
Não há muitos trabalhos que discutem a divulgação científica pela sua função ou em relação a outros sistemas de linguagens, assim como não há um conceito de ciência que permita ao divulgador sentir-se confortável para exercer sua atividade em face de uma sociedade em contínua transformação.
Mas mesmo assim o divulgador mostra que “é preciso elucidar” aspectos da pesquisa, e divulgar ao que se chegou. Nem que seja para discutir, mas discutir em uma linguagem em que todos entendam.
Para alguns pensadores da divulgação científica o ato de elucidar sempre é postura obrigatória. Mas Ilya Prigogine, por exemplo, prêmio Nobel de Química e um dos pensadores que questiona o conceito de uma ciência portadora de certezas definitivas. Mais uma vez a atitude de que “é preciso elucidar” entra em jogo.
Prigogine afirma ainda: “Assistimos à emergência de uma ciência que não está mais limitada a situações simplificadoras, idealizadas, mas que nos coloca diante da complexidade do mundo real, de uma ciência que permite à criatividade humana viver como expressão singular de um laço fundamental de todos os níveis da natureza” (Prigogine, 1996).
Marcelo Gleiser, um dos colunistas da Folha de S. Paulo, afirma no dia 28 de junho, na coluna Micro/Macro no artigo A certeza da incerteza, que “no mundo atômico, são probabilidades que contam, não medidas precisas”, confirmando a teoria de Prigogine.
Portanto trabalhamos com probabilidades, enquanto escritores e divulgadores dos fatos do nosso tempo...Não com certezas...Provavelmente veremos o filme sobre Darwin. Enquanto ele não chega, Marcelo Roque, que atua conosco no ato de divulgar fatos culturais, publica poesia em homenagem a Darwin.
"DARWIN"
No fundo do Mar
entre os corais do Éden
ainda ecoam
ondulando as águas
os cânticos de Eva
Marcelo Roque
(Em comemoração aos 200 anos de Charles Darwin-12 fevereiro de 1809-2009)- Poesia publicada na página 218 do livro OLHARES,do NJR/ECA/USP-v12