Os operários de Deus
Uma amiga da família, companheira de caminhada, alertou-me sobre o fabuloso número de pessoas que trabalham, num legítimo voluntariado, em prol da causa do Reino de Deus. E brincou: “Notaste que Deus é o maior ‘empregador’ do mundo?”. Na mesma conversa, dando-me esse mote, ela sugeriu que eu fizesse uma matéria, para jornal ou revista, enfocando a questão. Este contato com a amiga ocorreu num domingo, naquela hora antes da Missa, em que as pessoas se encontram, confraternizam e trocam novidades da semana que passou. Quando terminou o serviço religioso, fui procurá-la dizendo-lhe: “o artigo já tem nome. Vai se chamar ‘operários de Deus’, pois é assim que enxergo o fato”. Ela exultou.
De fato, é significativo o número de pessoas, em geral leigas, que se dedicam aos trabalhos eclesiais, como catequese, organização e eventos sociais e religiosos, administração paroquial, serviços e movimentos, assessoramento de cursos e encontros, além dos ministérios extraordinários, bem como serviços mais simples, porém relevantes e indispensáveis, como limpeza, atendimento de telefone, anotação de recados e apontamentos de dados para missas de ação-de-graças, sétimo-dia, etc.
Eu nem falo nos ministérios oficiais, os presbíteros e os religiosos, cuja vocação específica inflete para os serviços religiosos, conforme o carisma de cada um. Relaciono mais o trabalho dos leigos, que atuam na Igreja não por vocação, mas por con-vocação, uma vez que sua vocação específica e intransferível é a família, o mundo, as profissões, os direitos humanos e a comunicação. Aí ele deve perseverar e testemunhar de forma consciente e ativa seu ser-cristão. A convocação é posterior à vocação, e deve ser exercida sem prejuízo da primeira. Ou seja, não é lícito você ajudar na Igreja se isso prejudicar sua atividade familiar ou profissional. Mesmo assim, o bom senso determina formas de se assumir eficazmente compromissos em todas as frentes.
Ao referir-se ao “Deus-empregador”, a amiga comparou o peso da carga e as exigências do “patrão”. Enquanto os chefes deste mundo oprimem aqueles que para eles trabalham, pagando – na maioria das vezes – salários injustos, exigindo um número exagerado de horas trabalhadas, o Deus da Vida, mesmo sem pagar nada (pelo menos formalmente) e com tarefas às vezes pesadas, alegra seus operários, pois os faz saber que trabalham para uma causa divina, para o próximo e para a amorização (um neologismo de Teilhard de Chardin) do mundo. Eu disse pelo menos formalmente, pois se constata que, embora a recompensa prometida seja futura, muitos, por trabalharem na empresa de Deus, têm recebido nesta vida, muito amor, paz e prosperidade.
Quando a gente está cansado, nas diversas circunstâncias da nossa vida, Jesus nos acolhe e nos alivia. Sua carga nunca é pesada demais (cf. Mt 11). O nosso “Deus-patrão” conhece nossas limitações e potencialidades, por isto jamais dá tarefas além de nossa capacidade. Do mesmo modo, ele nunca vai fazer alguma coisa que nós poderíamos ter feito e não fizemos. O milagre existe, sim, mas jamais para suplementar nossa preguiça ou omissão. Ao contrário de tantos patrões que há por aí, Deus é justo e bondoso.
Por último, a grande e inquietante questão levantada pela querida amiga: se todos esses “operários de Deus”, pelo mundo afora, cumprissem fielmente suas missões, se unissem e pensassem mais no outro do que em si próprios, não teríamos um mundo melhor, uma sociedade mais justa e famílias mais bem estruturadas?
Escritor e Doutor em Teologia Moral