A MORTE - o arcano sem nome e suas evocações - (in Clube do Tarô)

O Arcano sem nome e suas evocações

Fragmentos que a filosofia

do arcano sem nome me inspira

Por

Eliane Accioly

Para mim, o Arcano sem Nome é um companheiro, um amigo, um mestre que sempre me lembra que não há, para o ser humano, em sua roupagem humana, o eterno, a eternidade.

Somos mortais.

A única vida que temos, neste momento, é esta nossa vida.

A vida que vivemos.

Se estamos vivos na vida, se não somos mortos vivos e se não morremos em vida, nossa vida é feita de pequenas mortes, de endings, de fins: fins de processos, separações entre amantes, entre pais e filhos, (por exemplo, o casamento de um filho), entre amigos, (mudanças que afastam, embora não haja a perda da amizade), entre terapeutas e pacientes, (o fim de terapia, muitas vezes interrompida), entre eu e eu mesma.

Quantas formas já fui em minha vida?

Quantas ainda serei?

Formas morrem, para que outras nasçam.

O processo formativo não corre seu curso de água viva, se nos agarramos a velhas formas. A tábuas de salvação.

Para Carlos Castaneda, ou melhor, para don Juan, a morte é uma aliada. Nossa morte, nossa maior aliada. Cada um de nós, segundo os toltecas – don Juan era um tolteca – nasce com a própria morte: cada um tem sua morte, desde o nascimento, como cada um de nós, na tradição católica, tem seu anjo da guarda.

Conto-lhes que, segundo minha crença Tolteca – minha morte está ao meu lado esquerdo, a pequena distância de meu braço esquerdo esticado.

Estico meu braço e não toco minha Morte, pois no dia em que tocá-la, ela me levará com ela. Ou, irei com ela, no dia em que minha Morte me tocar.

Posso mudar minha posição de passiva para ativa, não para não morrer. Pelo contrário, para deixar de ser imortal, e me saber mortal.

Quando deixo de ser imortal e posso ser mortal, no entanto, ganho a possibilidade de, um dia, quando minha Morte (intransferível, não no sentido de dia, mas no sentido de que, esta Morte, é a minha) me tocar, posso dançar para ela minha última dança de guerreira.

Se puder fazer isso, a Morte não me leva, sigo com ela, tendo-a como companheira para novas aventuras, em outros planos, em outras dimensões e realidades: esta é a liberdade do guerreiro, da qual fala Don Juan.

(Os Toltecas são uma cultura milenar, mais antiga que a dos Astecas. Mas os Toltecas são uma cultura ainda viva, que permanece viva, transmitida oralmente de geração a geração, no México. Há vários dialetos toltecas que ainda são falados no México, na região de Mixteca, perto de Oaxaca. A língua mixteca, por exemplo, é uma das línguas que estão vivas, e a palavra Mixteca, significa “País das Nuvens”).

Se uma imagem vale mais que mil palavras, os livros feitos de imagens, como é Tarô, são infindáveis, porque, se cada carta tem significados positivos e negativos, tais significados estão sempre sendo ressignificados a cada colocação.

Diria que o Tarô é um livro ideogramático, ou seja, dependendo da relação entre as cartas colocadas em um "jogo", o sentido da carta muda, é diferente. Assim, o arcano XIII como qualquer outra, pode ter um número infinito de significados e leituras: renovação com alegria, renovação com dor, renovação impossibilitada, renovação que emerge, outras.

Falando do arcano XIII, a carta que me toca, vejo-o relacionado com as cartas que revelam dor, medo, aflição como a Torre, o Diabo, a Lua, a Roda da Fortuna, e o Louco. E também com cartas como a Estrela, que para mim, implica em pele nova, em trocar de pele, como as serpentes: a Estrela, no Sacred Rose, mostra uma mulher nua, com pele nova. Se do arcano XIII estiver relacionada com o Sol, revelaria a face alegre da transformação. Só que não chegamos no alegre, sem viver os lutos. E o Arcano sem Nome, implica em luto. Perdas sempre resgatam o luto. Ou não. Mas caso não seja vivido, o luto permanece, transformando-se em melancolia, e impedindo o processo.