QUERIDA TIA GIOCONDA

A Senhora chegou a este mundo em meados de junho.

Batizaram Gioconda, talvez por causa da ópera, por seu

pai ser tão ligado à música, assim como seu avô. Mas Gio-

conda foi também musa de Da Vinci que talvez tenha lhe

emprestado a beleza e o porte.

Realmente, veio linda a este mundo: a beleza das moças

genuinamente norte-européias: o porte alto, o cabelo claro.

"Bionda".

Muito cedo aprendeu a tocar piano e também acordeão.

Logo passou a dar aulas, tornando-se professora. Foram

vários os seus alunos e alguns seguiram o caminho da música.

Ah! Como era bom ouvir "La Cumparsita" de seus dedos tão

ágeis. Em suas mãos as músicas ganhavam em expressão

e sonoridade.

Todos que a conheceram, concordam em uma afirmação:

a senhora não foi bela apenas exteriormente; sua beleza interior

foi ainda maior que a exterior.

Não tinha apego aos bens materiais, mas amava verdadeira-

mente aqueles que a rodeavam, com aquele amor puro que somen-

te raríssimas pessoas conseguem sentir. E muitos a faziam con-

fidente, porque era amiga fiel, carinhosa e discreta. Discrição

era talvez uma da suas maiores qualidades, seguida depois pela

bondade e caridade.

Nós acompanhamos com carinho grande parte de sua vida e

essa convivência foi sempre muito gratificante.

Difícil mesmo foi aceitar os desígnios de Deus; seus problemas

de saúde desde sempre lhe trouxeram terríveis sofrimentos.

Mesmo sentindo dores diariamente, sabíamos que era feliz ao

nosso lado, de nossos pais, principalmente ao lado de seu espo-

so Roberto que batizamos de Baá.

Passamos muitos dias agradáveis, muitos anos inesquecíveis

juntos, muitos natais adoráveis.

Fomos felizes, muito felizes, todos juntinhos.

Mas há sempre o momento da despedida e este momento che-

gou: tirou primeiro o Baá, assim abruptamente, em uma semana.

Foi terrível. Sabíamos que a idade avançada era um prenúncio

do fim, mas mesmo assim sentimos demais.

A partida dele levou metade de sua alma, querida "Condinha". A

outra metade ficou aqui doente. E uma alma doente adoece

o corpo e a senhora adoeceu ainda mais.

Passaram-se dois anos e Deus resolveu levá-la, talvez por com-

paixão, para que deixasse de sofrer a falta do nosso amado Baá.

Seus últimos dias foram tristes, dolorosos, talvez mais para nós,

pois não tomávamos aqueles remédios fortes que caridosamente

levavam sua dor e consciência.

A Senhora foi embora dormindo, devagarinho, docemente; sua

feição doce estampada no nosso último adeus.

Sabemos que um dia nós a encontraremos novamente. Ficamos

aqui tentando ser um pouquinho parecidas com a Senhora.

De suas seis sobrinhas, com amor.

Publicado no Jornal Comécio da Franca, logo após seu

falecimento.

Gioconda Tristão Melani

20/06/1917 - 17/02/1995

Adria Comparini
Enviado por Adria Comparini em 12/09/2009
Código do texto: T1806470
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