Esta semana me amolei com qualquer coisa relativa ao modo depreciativo com que alguns destratam pessoas em função desta ou daquela atividade exercida no contexto de suas vidas, o suficiente para, invigilante, me permitir baquear minhas condições íntimas para um mórbido mau humor.
Avisada, todavia, contra a inconveniência desta conjuntura psíquica para a qualidade do que realizo nos trabalhos de ordem mediúnica, mas sobretudo para o bem viver que se pede ao nosso dia-a-dia, apesar de tudo mentalizei, a partir daí, com insistência, a inspiração dos amigos e amparadores das dimensões invisíveis, a fim de conseguir reverter o quadro emocional extemporâneo quanto incômodo. E, como sempre, a presença reconfortadora daquele que me acompanha devotadamente as peripécias do cotidiano não se fez esperar.
Acordei no dia imediato com uma disposição a primeira vista um tanto cretina para rir à toa, reparando, durante o café da manhã desfrutado solitariamente, que recordações várias de coisas hilárias se puseram, ininterruptas e sem causa aparente, a desfilar pela minha mente. Sobretudo uma cena especialmente cômica presenciada no decorrer de um capítulo de novela assistido durante a semana, mas, somente depois de gastar alguns instantes sem poder conter o riso, de dentro de algum aturdimento de quem se surpreende consigo mesma logo após um dia de tantos pensamentos e sentimentos aborrecidos, pude intuir com clareza a presença clara do mentor postado bem junto de mim a me assoprar aquelas lembranças a conta de piadas, de molde a me elevar o nível de humor, e, por conseguinte, pré-dispor meu estado espiritual à instrução construtiva, que não se fez esperar*.
Alguns momentos depois, antes de me dirigir às atividades profissionais diárias, senti-me compelida pelo amável amigo do invisível a reler um excerto no qual não me detive como se devia na noite anterior, ao abrir um livro de Emmanuel ao acaso, já sendo assistida pelo mentor diligente e despercebido, e sem atribuir-lho a devida atenção. Tratava-se de um texto iluminado sobre o valor equitativo do serviço nas atividades humanas - qualquer tipo de serviço! Emmanuel encerra a maravilhosa preleção escrita mencionando o serviço preliminarmente inestimável de Deus, o Grande Anônimo! Equiparando, até arrematar com esta conclusão inspirada do mais Alto, assim, a química da cozinha no preparo do alimento cotidiano à química elaborada da ciência à serviço do ser humano nas grandes pesquisas levadas a efeito por laboratórios de todo o mundo, assim como a caneta que escreve sublimidades ao instrumento tosco da lavoura que semeia a terra para a germinação abençoada!
A partir disso, recordei em sequência espontânea uma das mais belas cenas já presenciadas nas telas do cinema, no magnífico A Vida é Bela, de Roberto Benigni - um único ditame, enunciado por um personagem que, no desenrolar da história, ensina o personagem de Benigni sobre as atribuições aparentemente destituídas de importância e de glamour de um mero garçon:
"- Servir é a mais nobre das artes! Deus serve a todos, mas não é escravo de ninguém!..."
Ah, se esta consciência subitamente brilhasse claramente em todas as mentes envoltas pelo ardor da luta no mais das vezes ríspida do cotidiano! Nas mentes da grande massa humana que, transitando por entre as atividades de garçons ou de funcionários desconhecidos, ou de empregados obscuros, ou de trabalhadores aparentemente inexpressivos diante dos fulgores enganosos das aparências dos rótulos festejados neste mundo transitório, por vezes se curva ante o peso da adversidade, exaurida da batalha; desgostosa de si mesma; vencida sob as vesgastadas impiedosas de um modelo ilusório que faz por onde esmaecer a real importância de cada ser e de cada coisa, únicos, sobre a Terra; que, por ora, não permite à imaturidade de espírito ou à confusão interior de muitos o entendimento de que sob os holofotes dos valores duvidosos dos padrões materialistas ainda regentes da vida na Terra, quanto no silêncio ignorado do labor realizado no redutos humilides espalhados às centenas pelo mundo afora, tudo o que conta é a luz do amor: o sentido que ele, ser humano em jornada de aprendizado a partir de incontáveis condições, empresta ao que sonha, ao que idealiza e que realiza!
É assim, pois, que a mãe dedicada preparando com carinho o alimento para a numerosa família é tão importante quanto o dono de rede de mercados que oferece acesso às populações ao emprego, ao alimento, ao seu sustento; é assim que não existe disparate real em termos de importância entre um chefe de nação e o chefe de família que retorna do labor árduo ao final de mais um dia, para usufruir do convívio dos seus e administrar a miríade de situações que se apresentam cobrando improviso e abnegação para a sua realização a contento.
O médico honesto na dedicação ao seu ofício, tão importante quanto o do mensageiro farmacêutico que leva à residência o remédio de emergência para a idosa aflita, no meio da madrugada. O diretor administrativo que reconhece a sua importância equalitária à dos subordinados, na medida em que sabe a fundo dos meandros das dificuldades e dos desafios a serem enfrentados por cada um deles, no dia-a-dia de um grande departamento. O artista necessário à beleza, à cor e à poesia da vida, quanto a jovem humilde, num estúdio, assegurando o brilho e a limpeza que realça a ordem e o aspecto dos cenários. O professor importante quanto o aluno que, como ele mesmo, necessita o conhecimento a fim de prosseguir oferecendo valiosa contribuição aos múltiplos enredos futuros nos caminhos da humanidade!...
É assim, meus amigos, que, filho de obscuro carpinteiro, veio um dia ao mundo, entre reis, Aquele que nos servirá perenemente como o ícone máximo da autêntica realeza, presente em estado latente em cada um de nós à espera de que, através do exercício incansável da mais nobre das artes: servir! - a materializemos definitivamente nos dias terrenos - espraiando Luz crescente a partir de nós mesmos, em cada recanto desconhecido deste pequeno mundo azul a que o Criador presenteou com Vida neste setor recôndito, dentro da grandiosidade infinita do Universo!
* Caio Fábio Quinto